sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Mensagem Quaresmal


“Buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça”

“O Senhor assumiu toda a fraqueza de nossa pobre condição e, se permanecermos no seu amor e na proclamação de seu nome, venceremos o que ele venceu e receberemos o que prometeu”. Com estas palavras de São Leão Magno, papa do século V, inicio esta breve exortação ao tempo da Quaresma. Qual o sentido destas palavras? Jesus assumiu toda a fraqueza de nossa condição pecaminosa. Com seu sangue, Jesus nos libertou do poder da morte e das trevas de nossos pecados. Sabendo desta verdade, somos convidados a permanecer no amor deste Cristo morto e ressuscitado. Permanecer no amor de Jesus é buscar o Reino de Deus e sua justiça. O sentido de nosso ser cristão está nesta busca. Quem ama o próximo como a si mesmo, ama a Deus, e é no amor fraterno que se manifesta o amor de Jesus.

Jesus viveu, fez a vontade do Pai e venceu a morte. O Tempo da Quaresma é uma oportunidade de pensarmos na vida de Jesus. Como Jesus viveu? Jesus viveu com fidelidade a vontade de seu Pai. Qual foi a vontade de Deus para Jesus? Todo o Evangelho traduz esta vontade em uma palavra: amor. Jesus amou profundamente o ser humano corrompido pelo pecado. O poder de Jesus foi manifestado no seu amor para com o ser humano. Todas as palavras e gestos de Jesus foram para nos ensinar que o amor é o poder de Deus, porque este é o amor por excelência. A mensagem de Jesus resume-se na prática do amor. Não é um amor de palavras, de discursos, mas um amor de atos. O amor com que Jesus amou os pecadores de seu tempo, o levou à morte de cruz. Quem ama como Jesus amou não escapa de sua cruz. Jesus crucificado é a maior prova de amor. Jesus amou até as últimas conseqüências. Ele não teve medo de amar.

A Campanha da Fraternidade deste ano tem como tema Fraternidade e segurança pública, e lema A paz é fruto da justiça. A sociedade dos humanos em todo o mundo está tomada pela violência, que se tornou até uma cultura. O mundo, dominado pelo espírito do capitalismo e neoliberalismo está “fabricando” pessoas violentas. Os homens não conseguem viver em sociedade, mas suportam-se mutuamente. A competição e a ambição de riquezas e poder levam o ser humano a eliminarem-se uns aos outros. Perdeu-se o caráter de filiação divina, que nos torna imagem e semelhança de Deus. A pessoa tornou-se um ser descartável, pois aquela que não produzir nem consumir o que o sistema oferece, tem que ser eliminada da convivência social, porque se tornou descartável. Esta é a maior injustiça social de nossa atual sociedade. Esta realidade gera violência e desespero. Onde está a paz?

Se os homens e mulheres deste mundo se amassem conforme pediu Jesus, não haveria necessidade de campanhas para recordar o ser humano sua verdadeira vocação. Se pelo menos os cristãos mostrassem ao mundo que o caminho do amor é o que verdadeiramente humaniza a pessoa, a realidade seria diferente. Mas o Cristianismo perdeu o caminho de Jesus. Os cristãos esqueceram-se de que o que Jesus pediu não foi a fundação de sistemas religiosos e crenças, mas que todas as nações o seguissem pela via do amor gratuito. Os sistemas religiosos e as crenças possuem estruturas de poder e prestígio social e leva os que pretendem seguir Jesus a disputarem este poder e esta influência. E nesta disputa, o caminho de Jesus fica esquecido.
A violência na sociedade brasileira é uma realidade. Antes de partirmos para a procura de culpados, precisamos saber que ela existe e como ela se manifesta. A violência está presente no cotidiano de todos os brasileiros e de todas as realidades. Ela está na família, na escola, no trabalho, na rua e até nas relações entre as Igrejas. É uma realidade desumana e insuportável. As grandes cidades estão tomadas pela violência, que é fruto das gritantes desigualdades existentes. A violência é causada pelos seguintes fatores sociais: desemprego, fome, falta de saúde e educação de boa qualidade, falta de segurança pública, intolerância religiosa, preconceito, drogas etc. O Estado nas esferas dos governos municipal, estadual e federal não consegue resolver a situação. Alguns representantes públicos até se esforçam, mas a situação piora cada vez mais.

Somente a oração das Igrejas não resolve o problema da violência, pois este é um problema estrutural. É preciso que a sociedade e as Igrejas entrem em diálogo com os governos, para que estes atuem de forma efetiva, com políticas públicas que atendam as necessidades da população. Políticas e soluções paliativas não servem. Gastam-se muitos milhões de reais em soluções que amenizam, mas que não resolvem os problemas sociais, porque não se consegue atingir o mal pela raiz. Enquanto as injustiças sociais forem gritantes, teremos uma sociedade altamente violenta e insuportável para viver. É preciso que a Campanha da Fraternidade se torne um debate permanente do problema da violência entre governo e sociedade. Faz-se necessário que a Igreja alimente o debate sobre o tema da Campanha durante todo o ano, pois o que costuma acontecer é que, depois da celebração da Páscoa do Senhor, não se fala mais do tema da Campanha da Fraternidade.

Esta Campanha motiva-nos também a rever nossas atitudes e nos perguntar: Eu sou uma pessoa violenta? Toda pessoa que segue Jesus é chamada a ser promotora da justiça e da paz. Quem tem fé em Jesus promove a justiça e a paz. É contraditório ver pessoas que se afirmam cristãs, mas que praticam injustiças alarmantes, contrapondo-se ao ensinamento do amor. Ensina-nos Jesus: “Se a vossa justiça não for maior do que a dos doutores da lei e dos fariseus, vocês não entrarão no Reino do Céu” (Mt 5,20). Jesus pede-nos para sermos justos diante de Deus e dos homens. A prática da justiça é condição essencial para se fazer parte do Reino de Deus. Quando o cristão pratica a justiça está contribuindo para a edificação do Reino inaugurado por Jesus. A justiça é uma das características dos seguidores de Jesus. O seguimento de Jesus exige a prática da justiça e a denúncia das injustiças.

O amor e a justiça foram o centro desta breve reflexão. São realidades ligadas. Quando uma pessoa ama, naturalmente já está praticando a justiça. “Ama e faze o que quiseres”, disse Santo Agostinho, Bispo de Hipona. O amor nos assegura a vivermos sem medo de sermos felizes. Quem ama não tem medo da vida e é cheio de paz. Só a pessoa que ama é capaz de viver a justiça do Reino de Deus. Roguemos ao Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que morreu na cruz por amor aos homens e mulheres, que neste Tempo de Quaresma, tempo de graça e salvação, possamos fazer uma releitura de nosso jeito de ser Igreja. Que o Espírito que conhece as profundezas de Deus, nos liberte de toda cegueira, para que possamos enxergar o verdadeiro caminho e perseverarmos nele. Assim seja!

Tiago de França da Silva, missionário.
Fortaleza - CE, 20/ 02/ 2009

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