domingo, 16 de agosto de 2009

Por uma Igreja servidora e pobre


A liturgia da Igreja neste Domingo celebra a Assunção de Nossa Senhora. O texto evangélico é o de Lucas 1, 39 – 56. Trata-se da visita da Virgem Maria à sua prima Isabel, seguida do cântico Magnificat. A leitura deste Evangelho me fez recordar da espiritualidade missionária da Igreja. Assim como a Virgem Maria foi ao encontro de sua prima Isabel, a Igreja é convidada a ir ao encontro do mundo. A Virgem Maria foi ao encontro de sua prima para servir, pois esta estava grávida. O cântico mostra claramente que Maria era de fato uma mulher disponível para o serviço fraterno quando diz: “... porque olhou para a humildade de sua serva”. Antes de ir ao encontro de Isabel, Maria tinha dado seu sim a Deus, tornando-se sacrário da Palavra de Deus.

Assim como Maria, a Igreja precisa cada vez mais servir à humanidade. Como se dá este serviço? Antes de respondermos a tal indagação, precisamos responder a outra que surge: Qual a missão da Igreja. O n. 386 do Documento de Aparecida responde claramente: “A Igreja tem como missão própria e específica comunicar a vida de Jesus Cristo a todas as pessoas, anunciando a Palavra, administrando os sacramentos e praticando a caridade. É oportuno recordar que o amor se mostra mais nas obras do que nas palavras, e isso vale também para nossas palavras nesta V Conferência. ‘Nem todo aquele que diz Senhor, Senhor...’ (cf. Mt 7, 21). Os discípulos missionários de Jesus Cristo temos a tarefa prioritária de dar testemunho do amor a Deus e ao próximo com obras concretas. Dizia Santo Alberto Hurtado: ‘Em nossas obras, nosso povo sabe que compreendemos sua dor’”.

Estas palavras da V CELAM mostram claramente que a Igreja tem plena consciência de sua missão. Ela sabe que precisa estar voltada para o mundo e não para si mesma, pois sua existência é essencialmente missionária. A Igreja nasceu para corresponder ao mandato missionário de Jesus: “Ide e evangelizai”. O n. 386 do DA aponta três maneiras de a Igreja exercer sua missão: pelo anúncio da Palavra, pela administração dos sacramentos e pela caridade. Certamente teríamos muito a falar sobre estes três requisitos, mas uma palavra sobre cada um é necessária.

O anúncio da Palavra se dá na liturgia. Esta precisa ser revista, porque atualmente está tendendo para o esvaziamento. Liturgias que não têm ligação com a realidade vivida pelo povo são liturgias vazias, sem sentido e que causam tédio nas pessoas. É aqui que a Igreja deve analisar até que ponto o neopentecoslismo faz bem às liturgias de nossas comunidades. O canto litúrgico precisa louvar a Deus e não os sentimentos humanos (sentimentalismo alienante e doentio). A administração dos sacramentos é muito importante para a vida da Igreja, pois os sacramentos são sinais que devem exprimir e manifestar a graça e a presença de Deus no mundo. Levar as pessoas a redescobrirem o sentido de cada sacramento celebrado nas comunidades é urgentemente necessário. Precisamos de uma catequese mais dinâmica e vivencial. Enquanto sacramento, a Missa precisa ser valorizada e dinamizada, para que nela, as pessoas se encontrem verdadeiramente com o Cristo Pão da Palavra e da Eucaristia. A prática da caridade reúne em si os valores anteriores, visto que se resume no próprio Deus que é a Caridade por excelência. O Documento de Aparecida faz questão de explicar a prática da caridade quando diz: “É oportuno recordar que o amor se mostra mais nas obras do que nas palavras”. Isto precisa seriamente ser levado em conta para não cairmos no assistencialismo que vicia as pessoas e as torna dependente de nossa falsa caridade.

Efetivar estas três exigências é um desafio imenso nos dias de hoje, pois a sociedade, escrava do capitalismo e do neoliberalismo, induz as pessoas a não acreditarem na eficácia de tais práticas. É preciso renunciar aos excessos de planejamentos e deixar-nos conduzir pelo Espírito que age de forma poderosa e dinâmica na Igreja a serviço do mundo. Há um hino de louvor que diz: “Glória ao Espírito Santo, que nos consola no pranto, que orienta a Igreja, para que do pobre ela seja”. Enquanto o espírito capitalista estiver enraizado nas pessoas e em nossas comunidades, destruindo as verdadeiras relações cristãs, não teremos uma Igreja servidora e pobre. A ideologia capitalista destrói o sentido de comunidade e é contrária ao serviço e aos pobres. No capitalismo, os pobres são o “lixo do mundo”, e só servem para consumir o lixo que o mesmo produz.

Por isso, a Igreja precisa tomar posições claras em favor dos pobres, não somente na caridade que produz o alimento e no mutirão que constrói uma casa para o pobre, mas na tomada de posições políticas. A Igreja não é chamada somente a amenizar o sofrimento dos pobres, mas ajudá-los a serem agentes de transformação e sujeitos da própria história. A Igreja precisa ficar ciente de que, uma vez ficando ao lado dos pobres, será perseguida pelo capitalismo e seus representantes legais. Quando Dom Hélder Câmara, que foi Arcebispo de Recife e Olinda – PE, resolveu ficar do lado dos pobres, foi perseguido e quase que assassinado pela causa do Reino de Deus. Os teólogos comprometidos com os pobres ensinam que os pobres são a manifestação do rosto sofrido de Deus.

As denúncias recentes contra o mercenário Edir Macedo devem nos motivar a fazermos uma reflexão séria sobre o processo de evangelização, a fim de que tais denúncias não se voltem contra nós. Precisamos anunciar o Evangelho de Jesus às pessoas sem consumismo, sem assistencialismo, sem relações comerciais. Precisamos abolir de nossas igrejas alguns resquícios da chamada teologia da prosperidade. Que o Espírito de Deus não permita que regridamos ao passado nem caiamos na tentação de que precisamos transformar o Dízimo em troca de favores com Deus. Roguemos a Deus que ele nos liberte e nos oriente no caminho de Jesus e que a Virgem Maria ensine-nos e ajude-nos a servir com amor gratuito.

Tiago de França

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