quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Tiririca, pior do que está não fica?


Muita gente ficou estarrecida com a notícia veiculada após as eleições do dia 3 passado: Tiririca, candidato a deputado federal pelo PR – SP, foi eleito com 1.352.820 votos! Eleito o deputado mais votado em todo o país. O que isso significa para a política brasileira? Qual a reflexão que podemos fazer em torno deste mais novo caso engraçado e/ou irônico da política brasileira? Descrevamos o candidato a partir de sua própria apresentação durante toda a campanha eleitoral.

Oriundo de Itapipoca, CE, humorista de profissão, semi-analfabeto ou analfabeto (quesito em discussão), desprovido de propostas e promessas eleitorais, casado e pai de família, pautou sua campanha no estilo próprio de vida (o mesmo se identifica como palhaço). Este é o Tiririca. Não há nada além disso! O que tanta gente (mais de um milhão e trezentas) encontrou neste cidadão para elegê-lo com tamanho número de votos? Esta indagação não pretende desmerecer a história de vida do candidato nem seu grau de instrução, mas refletir a candidatura em si.

Insistentemente, expressões como “Você sabe o que faz um deputado? Não? Nem eu! Me eleja e depois eu te digo”, “Vote em Tiririca, pior do que tá não fica!” e “Vote em mim, porque eu vou ajudar a quem precisa, começando pela minha família!” foram repetidas pelo candidato durante toda a sua campanha. É difícil acreditar, mas foram estas e outras expressões que convenceram mais de um milhão e trezentas mil pessoas, que somaram votos suficientes para assegurar mais três cadeiras na Câmara Federal.

Pelos cálculos do coeficiente eleitoral, Tiririca leva consigo mais três conhecidos ou desconhecidos para Brasília. Certamente, quando a maioria das pessoas que nele votaram não pensou nem conheceu o chamado coeficiente eleitoral. Este, jurídica e legalmente assegura e nos informa que para deputado estadual e federal o eleitor não vota no candidato, mas no partido ao qual o mesmo está representado. Em outras palavras, geralmente, políticos que não tinham a mínima condição de serem eleitos, recebem, sem esforço nem merecimento algum, um mandato político que lhes garante foro privilegiado e várias regalias asseguradas na lei.

Para aliviar a situação de um candidato quase que analfabeto (situação ainda não julgada), a mídia começou a dizer que a vitória de Tiririca se tratou de um protesto da sociedade em relação à situação atual da política brasileira. Podemos até confirmar tal idéia, mas é preciso questioná-la: este tipo de protesto vai resolver alguma coisa? Penso ser muito arriscado protestar nas urnas elegendo quatro deputados destituídos das condições mínimas para o exercício da função legislativa. A função do deputado é apresentar projetos, criar leis e fiscalizar o executivo. Penso que o Tiririca não tem condições de fazer isso.

Alguém me disse: “Mas Tiago, ele é um homem tão bom, tão alegre, tão verdadeiro!” Apesar de não conhecê-lo, a não ser pela TV, através da qual não se conhece bem as pessoas, não discordo do fato de que ele tenha procurado ser verdadeiro na campanha eleitoral. Tal situação nos leva a pensar no tipo e/ou modelo de político e de política que estamos realmente necessitando no país. O melhor protesto que o eleitor pode fazer nas urnas é escolher candidatos que não estejam envolvidos com corrupção e que tenham condições de exercer o cargo que desejam ocupar. Conduta ilibada e competência deveriam ser critérios exigidos pela legislação eleitoral.

Dependendo do resultado da investigação que a justiça eleitoral fará sobre o grau de instrução do deputado eleito (se sabe ler e escrever ou não), Tiririca pode até ter ficha limpa, mas, certamente, é desprovido de condições para legislar em Brasília. Não basta ter boa vontade política, é preciso ter condições, demonstrar vocação para a arte de fazer e viver a política. Candidatos com atitudes que demonstram a procura de satisfação dos próprios interesses no exercício do mandato não merecem a confiança do eleitor, e esta procura não é difícil de ser identificada, mesmo durante a campanha eleitoral.

Está claro e evidente que modelos, jogadores de futebol, lutadores de boxe, humoristas e outros profissionais que, muitas vezes endividados ou com problemas financeiros procuram solucioná-los ingressando na política partidária. Quem não se recorda do deputado Clodovil Hernandes (falecido)? Não há um projeto de lei que tenha sido apresentado por ele e aprovado pelo parlamento. Com isto não quero desclassificar ou inferiorizar as profissões acima mencionadas nem o falecido deputado Clodovil, quero, simplesmente, questionar a veracidade de certas candidaturas e suas respectivas intenções para com a política.

Não podemos aceitar que os cargos políticos se tornem meios de enriquecimento, ilícito ou não. É preciso insistir na idéia de que os políticos são eleitos para a defesa e a promoção do bem comum, apesar do estado de corrupção em que se encontra a política do país. Se a justiça tem dificuldade ou se recusa a julgar os chamados crimes de colarinho branco que ocorrem no submundo da política, o eleitor tem a missão e por que não o dever moral de julgar nas urnas o destino do país. Não basta que a pessoa seja simpática, é preciso que demonstre boa vontade e, sobretudo, história ilibada que comprove competência para a política. Como pode ser eleito um candidato que afirma, descarada e claramente: “Eu não sei o que vou fazer lá”?

A vitória de Tiririca é um sinal evidente de uma agravante crise de consciência política. Muita gente vota sem pensar no que está fazendo, sem analisar o/a candidato/a em quem está votando. Trata-se de um voto sem perspectiva alguma, dado à toa, sem consciência crítica da realidade. Quem assim procede não deveria votar, porque em nada contribui com a consolidação democrática do país. O resultado do voto sem consciência (irrefletido) é a perpetuação de sujeitos mal intencionados e, conseqüentemente, corruptos nos poderes legislativo e executivo. Políticos corruptos gostam de eleitores ingênuos e passivos, eleitores que não se preocupam com o bem comum e que elegem pessoas com os mesmos sintomas.

Outra pessoa me disse: “Tiago, elegeram Lula, com baixo nível de escolaridade, por que não eleger Tiririca?” O autor desta indagação não tem noção alguma do histórico do atual Presidente, pois como posso comparar um ex-operário formado politicamente na luta sindical e fundador de um partido com alguém que vive a contar piadas e alegrar a criançada?! Penso que não preciso responder a esta indagação. Não estou exigindo mestres e doutores para ocupar os cargos políticos, até porque a maioria destes tem demonstrado pleno desinteresse pelo bem comum, entregando-se à corrupção; é preciso exigir história, conduta condizente com o que se almeja e projeto político que contemple as aspirações da maioria marginalizada do país. Enfim, votar em candidatos como Tiririca, pior do que está FICA!


Tiago de França

Um comentário:

Humberto Dib disse...

Oi!
Entrei no seu blog por acaso, achei muito legal mesmo, interessante e didático, não queria sair sem dizê-lo.
Aproveito para te convidar a visitar o meu que é de literatura.
Humberto desde Argentina.

www.humbertodib.blogspot.com