sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Adeus ano velho, feliz ano novo!


Estamos concluindo mais um ano e prestes a iniciarmos mais um outro. Isto tem se repetido há milhares de anos. O tempo passa e não espera por ninguém. Para uns, a vida cresce, progride, torna-se mais feliz. Para outros, o que existe é regressão e infelicidade. Uns passam com saúde, outros se encontram na enfermidade. O fato é que estamos vivos. Para os otimistas, isto já é um bom sinal.

Eis um convite: O que fiz de bom no ano que passou? O que de bom deixei de fazer? Fui melhor do que no ano anterior? Estou, de fato, tornando-me uma pessoa melhor? Tenho sido mais um problema ou uma solução na vida do mundo e das pessoas com quem convivo? Ajudei a melhorar ou a piorar o mundo? O convite é para PENSAR. Fim de ano é tempo para pensar na vida, pois quem procura pensar na própria vida costuma ser uma pessoa cada vez melhor.

Ser cada vez melhor. Esta deveria ser a regra de vida de todos os seres humanos. O que significa ser cada vez melhor? Melhor do que os outros? Não. Todas as ciências afirmam que o ser humano é um ser em constante evolução, e alguns afirmam que somos chamados à felicidade, o nosso destino é a felicidade. Todos querem ser felizes. Em sua sã consciência e no uso do bom senso, toda pessoa quer ser feliz.

Assim, busco ser cada vez melhor para ser feliz. E esta felicidade é universal. Por que é universal? Porque quando busco ser cada vez melhor não o serei em função do meu eu, pois se assim o fosse, já deixaria de ser melhor, mas pior. As pessoas que buscam ser cada vez melhor em função de si mesmas são chamadas de egoístas. Não podem ser chamadas de outra forma. Não há outro adjetivo para elas. Estas pessoas pensam que são uma ilha, pensam que não precisam de ninguém, mas a realidade as desmente, cotidiana e eternamente.

Dizem que o ser humano está cada vez pior. Será mesmo? Olhemos a realidade: multiplicam-se as formas de violência e opressão, estão cada vez mais sofisticadas. Até as pobres e inocentes crianças de colo estão sendo vítimas do desamor, estão sendo jogadas e brutalmente assassinadas. Algumas delas, pela misericórdia do bom Deus, escapam da morte. O bom Deus as salva para chamar a atenção do seres que são chamados a serem humanos. De fato, parece mesmo que o gênero humano está se tornando cada vez mais desumano.

O que fazer? Qual é a solução para o problema? Como deter o desamor que tem desumanizado o ser humano? Será que as pessoas precisam rezar mais? Será que o número das denominações religiosas não está sendo suficiente? Será que a causa está no fato de as pessoas não estarem escutando as orientações do Papa de Roma? Será que o mundo está encolhendo devido ao crescimento desordenado dos seres da espécie humana? Será culpa da fome e do desemprego que a gera? Será que estamos próximos do fim do mundo e Deus está castigando a terra? O que está acontecendo e onde está a solução para este gravíssimo problema?...

São tantos os fatores, são inúmeros os autores, a história é tão cruel, que não ouso afirmar, especificamente, as reais causas de tamanha confusão e desamor. Mas, uma vez que professo a fé cristã, não quero concluir esta mensagem de fim de ano somente com estas constatações e/ou provocações. A fé cristã implica recordar a mensagem contida no Evangelho de Jesus de Nazaré. Tenho a impressão, aliás, a certeza de que a resposta para o problema refletido se encontra na centralidade da mensagem evangélica de Jesus de Nazaré.

O AMOR é a Boa Notícia anunciada por Jesus de Nazaré. Ele a anunciou com a palavra e com a vida. O Evangelho ensina que fora do amor só existe o vazio. Em outras palavras, o homem só consegue ser feliz no amor. Independentemente de cor, sexo, religião, cultura, condição social, todos são chamados a viver no amor e para o amor. Eis a solução para o problema do desamor: o amor. Vejamos o poder que há no amor.

O amor tem o poder de bloquear, definitivamente, as forças do mal e da morte que operam na pessoa e, conseqüentemente, no mundo. Quem se entrega de verdade ao amor não tem forças para fazer o mal. A experiência de Jesus de Nazaré é a maior prova disso. Ele demonstrou que isto é possível. Mas veja: Não estou me referindo ao amor de palavras, puramente discursivo, portando, falso; refiro-me ao amor de atos, amor em ação. Aliás, não existe amor de palavras, o amor só existe na ação. Amar é agir.

Agora, sim, posso concluir esta mensagem. Mas antes, lanço a você que a leu ou escutou, um convite: Neste ano que se inicia procure ser cada vez melhor. O mundo está precisando de pessoas que tomem a iniciativa de buscarem ser cada vez melhores. Como isto é possível? Entregando-se ao amor, sem medo de ser feliz! A vocação humana se encontra na prática do amor a Deus, ao próximo e ao mundo. O inimigo do amor é o medo que gera a indiferença. Esta é um dos piores frutos do desamor. Não nos deixemos tomar pelo medo, confiemo-nos ao amor. O amor é a nossa vida, o amor é Deus na sua essência, e Deus-amor é a nossa salvação.

Que o Amor seja tudo em todos!

FELIZ ANO NOVO!


Tiago de França da Silva
Colônia Leopoldina – AL, 31 de dezembro de 2010.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

A despedida do Presidente Lula


Nesta reflexão quero opinar, de modo geral, sobre os oito anos do Governo Lula. Não se trata de prestação de contas nem de análise daquilo que foi negativo ou positivo. Isto, resumidamente, foi feito pelo próprio Presidente em sua despedida transmitida em cadeia nacional pelos meios de comunicação. Quero, apenas, na condição de cidadão brasileiro expressar meus sentimentos em relação ao fato histórico da passagem de Luís Inácio LULA da Silva na Presidência da República Federativa do Brasil.

Eis o fato inédito da história política do país: Um operário ter chegado à Presidência da República. A mídia sempre repete esta notícia. Este fato provocou algumas transformações na difícil e, às vezes, escandalosa arte de fazer política no Brasil. Vejamos.

1) O fato de LULA não ter feito todo o Ensino Fundamental, Médio e Universitário e ter sido eleito Presidente faz com que o mesmo entre para a história. Se olharmos os perfis dos predecessores dele veremos que, de fato, a vitória de LULA foi algo inédito. Com isto, caiu por terra a idéia de que para ser Presidente é preciso ser doutor ou ter certo nível intelectual elevado. Tal exigência se tornou relativa.

2) Outro aspecto que precisa ser destacado é a origem humilde de LULA. Este nasceu na pobreza do interior de Pernambuco, foi um pobre nordestino, conhecedor da pobreza da maioria do povo nordestino. LULA foi um nordestino de “pouca leitura” que chegou ao maior cargo político da República. Os predecessores dele eram homens letrados e ricos, que sempre viveram longe das terríveis condições da miséria brasileira. Por isso que, muitas vezes, se viu o Presidente LULA chorando no meio do povo e em entrevistas dadas a jornalistas. LULA é um homem sensível às causas dos pobres não porque as conheceu nos bancos da universidade, mas porque as viveu.

3) Um terceiro e importante aspecto que destaco é o jeito de ser de LULA, que é o jeito de ser do povo nordestino: espontâneo, extrovertido, alegre e esperançoso. Estas qualidades levaram o Presidente dos EUA a chamá-lo de “o cara”! Sem nenhuma formação para a diplomacia, LULA foi o Presidente que mais soube dialogar com os demais Chefes de Estado do mundo, dialogou e foi respeitado por todos. A história de vida de LULA e sua desenvoltura chamaram a atenção de todos os Chefes de Estado. Além do interesse pelos produtos brasileiros e pelo Brasil em si mesmo, a personalidade do Presidente o ajudou a fazer com que o Brasil se tornasse um país respeitado em todo o mundo.

4) A abertura e o diálogo com os segmentos sociais foram outras duas marcas do Governo do Presidente LULA. O Palácio do Governo se tornou, de fato, a casa dos brasileiros. Antes de LULA, o povo não tinha contato com o Presidente e a repressão impedia toda e qualquer manifestação popular. Nunca devemos nos esquecer de que a Lei Ficha Limpa, projeto de iniciativa popular, foi aprovada no Governo LULA. A escuta aos anseios do povo levaram o Presidente a nomear mulheres para serem Ministras de Governo, sendo a Presidenta eleita, Dilma Rousseff, a mais influente delas. O povo está mais consciente e tem liberdade para denunciar as injustiças.

5) O sonho de LULA era de fazer com que os pobres vivessem mais e melhor. Se compararmos a situação dos pobres em 2003 com a de agora, certa e humildemente, precisamos admitir que, de fato, a vida dos pobres melhorou. O povo come mais e melhor. A fome é o grande dilema da humanidade. Pobre corajoso e trabalhador não morre de fome no Brasil, e este é um fator muito positivo. Abriram-se e estão abrindo-se cada vez mais oportunidades para os mais pobres do povo brasileiro. Aos poucos, os pobres estão chegando à universidade e profissionalizando-se. Isto tem levado o país ao crescimento, pois na medida em que a Educação está se tornando cada vez mais acessível, as oportunidades de emprego e renda também estão aumentando. Temos o menor índice de desemprego da história. Com educação e trabalho o Brasil crescerá e se tornará uma das potências mundiais. Tudo é processual, nada acontece do dia para a noite.

Os aspectos negativos são inegáveis no Governo LULA. Dentre eles, o que mais se destaca é a corrupção política de deputados, senadores e ministros. A corrupção política não nasceu no Governo LULA, mas faz parte da história do Brasil desde o seu descobrimento. Quem pensou que LULA ia pôr um fim na corrupção política enganou-se, completamente. Pensar assim é não ter perspectiva histórica nem entender de política. A mesma coisa podemos afirmar em relação à Presidenta eleita Dilma: Ela não porá um fim na corrupção política deste país. O fim da corrupção política vai acontecer quando os cidadãos eleitores usarem da consciência crítica no ato do voto. Para que isto aconteça é necessária a formação política e cidadã do nosso povo.

Apesar dos escândalos ocorridos, a perda de mandato e a punição de alguns dos envolvidos foram significativas. É verdade que muitos casos caíram na impunidade, mas é verdade, também, que muita gente considerada importante foi presa e, devidamente, punida. Alguns oligarcas da política tradicional caíram nas urnas, o povo os recusou: Fernando Collor perdeu para Governador por Alagoas; para o cargo de Senador, Heráclito Fortes e Mão Santa perderam pelo Piauí; Arthur Virgílio por Amazonas; Tasso Jereissati pelo Ceará; Marco Maciel por Pernambuco, entre outros. Quando a Justiça não resolve, o povo tem o poder de resolver nas urnas. Nestas, o povo é lento para fazer mudanças.

Nestes dias, no fim do Governo LULA, os parlamentares aprontaram mais uma: resolveram aumentar o valor dos próprios salários para quase 27 mil reais. Um terrível absurdo! Um aumento que envergonha a todos, um crime contra a democracia. Esta vergonhosa iniciativa reforça a verdade de que os políticos brasileiros são os mais bem remunerados do mundo. O pior é que além desse salário absurdo, deputados e senadores, assim como os ministros e o Presidente da República possuem regalias: auxílio-moradia, verba de gabinete, transporte, funcionários etc. Além disso, no caso de muitos deputados e senadores, há os desvios do dinheiro público. No Congresso Nacional temos políticos ladrões que possuem fortunas maiores do que as dos maiores traficantes de drogas do Rio de Janeiro.

Concluo esta breve reflexão fazendo menção ao gesto profético de Dom Edmilson da Cruz, Bispo Emérito de Limoeiro do Norte – CE, que foi condecorado pelo Congresso Nacional com a Comenda “Dom Hélder Câmara” pelos trabalhos desenvolvidos em favor dos direitos humanos no Ceará. No ato solene ocorrido no Congresso, em Brasília – DF, Dom Edmilson se recusou a receber a Comenda afirmando que seria um erro de sua parte recebê-la, devido ao aumento absurdo do salário dos parlamentares. Fica para a história este gesto profético de protesto de Dom Edmilson da Cruz, exemplo de Bispo dedicado à luta pelos direitos humanos dos mais empobrecidos.


Tiago de França

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Natal: celebração da encarnação do Verbo de Deus


“E a Palavra se fez homem e habitou entre nós” (Jo 1, 14).

Desde a criação do mundo, Deus preparou a encarnação de seu Filho na humanidade dos homens. A humanidade corrompida pelo pecado foi re-orientada pelo próprio Deus por meio dos patriarcas e matriarcas, profetas e profetisas. Estas mulheres e homens nasceram do povo e com a força de Deus colocaram-se a serviço da libertação do povo. A presença constante de Deus fez os oprimidos perseverarem na luta permanente pela libertação, luta pela vida. Esta luta dura até hoje e durará até a vinda definitiva daquele que foi constituído Juiz dos vivos e dos mortos e Salvador da humanidade.

A experiência profética que precedeu a encarnação do Verbo de Deus é marcada pela perseguição e pela morte, destas Deus fez ressurgir a vida de seu povo. O sistema opressor dos reis e faraós, que explorava e matava as pessoas foi denunciado pelas profetisas e profetas. Estes tinham a força de Deus e esta força os impelia a levar a missão até as últimas conseqüências. Assim como Jesus, as profetisas e os profetas foram fiéis ao chamado divino até a morte. Jesus herdou a coragem e a ousadia daqueles que o precederam na história da salvação. No seu Evangelho sempre o encontramos sendo identificado com algum dos profetas de Israel.

Não somente João, o Batista, mas todas as demais profetisas e profetas prepararam a encarnação do Verbo divino. Este continuou com plena fidelidade a ação profética dos antigos rumo à redenção plena da humanidade. Quando chegou o tempo certo, Deus enviou Jesus ao mundo na condição das profetisas e profetas: nasceu segundo as condições dos empobrecidos, na cidade de Belém, na pobreza de uma manjedoura. O Verbo encarnou-se na pobreza da humanidade. Deus quis nascer, viver e morrer entre os últimos. Esta foi a sua opção.

Esta opção de Deus pelos últimos escandalizou muita gente no tempo de Jesus, na história da Igreja e continua escandalizando até os dias de hoje. Sempre existiram resistências ao estado de pobreza material da vida de Jesus, muitas pessoas se recusam a aceitar Jesus nascido numa manjedoura. Há pessoas que até veneram a pobreza de Jesus, mas no fundo não compreendem, e mesmo compreendendo se recusam a aceitar. Os únicos que se identificam com o Cristo pobre são os empobrecidos. Estes têm mais facilidade de compreender e aceitar Jesus porque são como ele: sem poder, sem prestígio e sem riquezas.

A encarnação do Verbo é Deus entrando, humanamente, no mundo e na história. Deus quis se revelar como homem. Deus se tornou, plenamente, pessoa. Assim, aquele Deus das alturas dos céus se tornou humano, acessível a todos. Quem viu, escutou e tocou em Jesus, viu, escutou e tocou no próprio Deus. Muita gente teve essa graça. Uns acreditaram, outros não. Os que não acreditaram, tiveram dificuldades de ver em Jesus o Deus de Israel porque Jesus foi, plenamente, homem; igual a nós em tudo, exceto no pecado (cf. Hb 4, 15). Ele foi tão humano que quando se autoafirmou Filho de Deus foi acusado de blasfêmia.

As autoridades religiosas da época não aceitaram o fato do Deus todo-poderoso, o Senhor dos exércitos, o Terrível e o Insondável se fazer presente no mundo, humilde e simplesmente, humano. Eles sempre acreditaram que Deus estava longe, nas alturas, distante da corrupção deste mundo. Jamais poderiam aceitar que o Deus cultuado no Templo pudesse comer com os pecadores públicos e com estes viver. Com o seu jeito de ser, Jesus desmistificou essa falsa imagem de Deus e os escandalizou. Somente os empobrecidos não se escandalizaram com o jeito de Jesus.

Qual a missão do Verbo de Deus encarnado no mundo? O que Jesus veio fazer entre nós? A resposta a estas indagações é importante para a perfeita compreensão do mistério da encarnação. Quem não compreende o verdadeiro sentido da missão de Jesus no mundo acredita que ele veio perdoar pecados, curar os enfermos e atender às necessidades materiais e espirituais das pessoas. É verdade que Jesus fez tudo isso e muito mais, mas é verdade, também, que esta não foi a sua missão fundamental. Quem somente acredita num Jesus milagreiro, dotado de poderes para a resolução de todos os problemas da vida e do mundo, desconhece, completamente, o Filho de Deus.

A missão do Filho de Deus enviado ao mundo foi a de inaugurar o Reino de Deus. Crer nesta verdade significa comprometer-se com este Reino inaugurado. Quem acredita no Reino de Deus precisa se colocar a seu serviço. O serviço ao Reino acontece na prática da justiça, da caridade e da verdade. A vivência destes valores traz sérias conseqüências para a vida das pessoas, estas passam a ser perseguidas e mortas, pois as forças do anti-Reino estão atuando no mundo, impiedosamente. Estas forças não poupam a vida dos operários do Reino de Deus. Este Reino exige seguimento radical a Jesus de Nazaré.

O mal que tem prejudicado todas as Igrejas cristãs refere-se ao fato de que muitas pessoas preferem acreditar no Jesus milagreiro, não naquele que inaugurou o Reino. De fato, é mais fácil crer no primeiro modelo, pois o mesmo não exige compromisso. O Jesus milagreiro não exige seguimento, mas devoção. Quem crer neste modelo não tem coragem de seguir Jesus, mas somente gostar dele, ser-lhe devoto, conhecer, superficialmente, sua vida, pedir e agradecer pelos milagres recebidos. Assim, se constrói uma relação pautada na recepção constante de milagres. Para as pessoas que professam este tipo de crença, o culto serve, somente, para pedir e agradecer. A religião dessas pessoas é superficial e alienante.

O Evangelho apresenta-nos o Cristo que inaugurou o Reino. Crer no Evangelho é acreditar e seguir este Cristo. Os que acreditam e seguem este Cristo são chamados de cristãos. Pe. José Comblin ensina que “seguir Jesus é colocar-se no seu caminho e perseverar”. Colocar-se no caminho significa aderir ao projeto de Jesus: o Reino de Deus. Este projeto é constituído de alguns valores a serem praticados por quem o adere: justiça, perdão, partilha, solidariedade, compreensão, acolhida, comunhão, respeito, confiança, fé, esperança, responsabilidade, compaixão, verdade, entre outros. Todos estes valores são frutos do amor. Somente quem ama é quem pode vivenciá-los.

A celebração solene do Natal do Senhor não é a celebração do aniversário de Jesus, mas da presença amorosa e salvífica de Deus no mundo. A celebração da encarnação do Verbo de Deus convida todas as Igrejas cristãs para uma avaliação de suas práticas religiosas. Será que nossas Igrejas estão comprometidas com os valores do Reino de Deus? Todas as Igrejas são chamadas a serem instrumentos na construção do Reino. Assim sendo, esta competição pautada numa evangelização superficial e desumanizadora é um pecado grave, e por que não dizer, uma força do anti-Reino dentro do Cristianismo.

Que o Deus da vida e dos empobrecidos seja tudo em todos.

FELIZ NATAL!

Tiago de França da Silva
Colônia Leopoldina – AL, 17/ 12/ 2010.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Complexo do Alemão: exclusão e violência


Todos os brasileiros assistiram à trágica ação policial no Complexo do Alemão ocorrida nestes dias. Ação trágica porque nela morreram inocentes e os considerados bandidos. Estes foram o alvo por excelência. Pois bem, esta ação violenta da polícia nos revela alguns aspectos que nos oferecem uma reflexão significativa para entendermos a situação. Vamos por parte.

1. O Governo age utilizando-se de represália

A ação repressiva da polícia, alicerçada na ação bruta, não educa nem resolve o problema. Quem estiver pensando que o problema da violência no Complexo do Alemão está resolvido está profundamente enganado. Violência gera violência. Contra esta verdade não existe discussão. Certamente, surgirão outros “bandidos” para substituírem os que morreram e para continuar a ação criminosa naquele sofrido lugar. Não adianta a polícia permanecer até o próximo ano pensando que as milícias irão desistir do crime organizado. A eliminação dos “bandidos” é uma solução paliativa, que provoca, aparentemente, uma falsa paz.

2. As causas da violência no RJ e no Brasil

A violência presente no RJ não está somente no Complexo do Alemão. A violência se faz presente na totalidade das grandes cidades brasileiras, e as pesquisas têm demonstrado que as pequenas cidades e as populações que moram na zona rural também estão sofrendo com a violência. Por que a violência toma conta do país? Esta deve ser a pergunta fundamental. Nós podemos respondê-la de dois modos: um se mostra superficial e outro aborda o mal pela raiz. Há duas respostas. Vejamos.

2.1 – A violência ocorre porque falta segurança pública. Quem defende esta tese reclama do Governo a qualificação e a boa remuneração das polícias, assim como o aumento numérico das mesmas. Não sou contra a nenhuma destas reivindicações, pois são mais que justas e necessárias. A segurança pública é um direito do cidadão e um dever do Estado. Isto é lei. Só que por si mesma, a segurança pública não resolve o problema da violência.

Temos uma população carcerária de quase meio milhão de pessoas. Não sou contra a prisão dos, realmente, infratores; mas isto resolveu o problema da violência? Se a situação se perpetua, se o papel da polícia se restringir a prender infratores, vai chegar um momento em que não teremos onde colocar tanta gente, pois os presídios se tornarão insuficientes. Não nego o fato de que a falta de segurança provoca violência, mas repito: a segurança oferecida pelo Estado, por si mesma, não resolve o problema da violência.

2.2 – A violência ocorre por causa das desigualdades sociais. A falta de uma educação de qualidade, o desemprego, a fome e tantos outros problemas são as verdadeiras causas da violência no RJ e em todo o país. Portanto, a preocupação fundamental de nossos governantes deve se voltar para a resolução de tais problemas. Tal resolução se dá por meio de políticas públicas eficientes, ou seja, que atendam às reais necessidades da população.

Se os governos não procuram erradicar a fome, o desemprego; se não procuram oferecer uma educação de qualidade, então o problema da violência vai continuar. Certamente, quando as pessoas tiverem acesso a uma vida digna, a violência haverá de diminuir em todo o país. Vida digna não significa que todos devem ser ricos, mas ter assegurados os direitos fundamentais, que se traduz na satisfação das necessidades básicas: educação, saúde, saneamento, moradia, alimentação, segurança, lazer etc.

3. Quem sofre com a violência são os empobrecidos

A realidade das grandes cidades revela que os empobrecidos são as maiores vítimas da violência urbana. Os empobrecidos não têm segurança alguma, pois dependem da boa vontade das políticas públicas que devem ser promovidas pelos governantes. No Complexo do Alemão não moram os ricos, logo, estes não são vítimas da terrível ação criminosa das milícias. São os empobrecidos que perdem a vida facilmente em meio aos tiroteios entre polícia e “bandidos” e entre uma facção e outra. Estes mesmos empobrecidos apóiam, plenamente, a ação violenta da polícia porque julgam que tal ação vem trazer a paz. Para quem vive em meio à violência, o fim daqueles que causam medo, opressão e morte é algo justo e necessário.

Se a violência atingisse, cotidiana e significativamente, os filhos da classe média alta deste país, certamente já teria sido diminuída; mas como quem morre, na maioria das vezes, anonimamente, são pessoas sem poder aquisitivo algum, então o sistema quando age, age lentamente. A grande maioria dos envolvidos no mundo do crime organizado é formada por jovens empobrecidos, que não tiveram a chance de ter uma boa educação que os qualificassem para o mundo do trabalho. Jovens desocupados sobrevivendo em áreas de risco se entregam facilmente às drogas e à prostituição.

4. O que fazer? Uma solução aparentemente utópica

O que os governantes deveriam fazer era acabar com as favelas e aglomerados das grandes cidades, pois se mostram lugares indignos para a sobrevivência de seres humanos. A construção de moradias com as condições básicas de sobrevivência é um direito de todos. Neste sentido, o Governo Federal fez alguma coisa, mas tem muito a se fazer. Quando tiveram que deixar a zona rural e as pequenas cidades do interior para morar nas capitais, a maioria dos empobrecidos não teve outra opção senão tentar sobreviver nas favelas; e por residirem nelas se tornaram vítimas do preconceito social, pois muita gente pensa que não há pessoas boas nas favelas, mas somente gente violenta e o que não presta. Juntamente com a moradia digna, a educação gratuita e de qualidade e o emprego formal, certamente, são a solução para a erradicação da marginalização social que existe no país.


Tiago de França