sexta-feira, 4 de março de 2011

Carnaval: celebração da vida ou da morte?


“Não se deixe dominar pela tristeza, nem se aflija com preocupações.
Alegria do coração é vida para o homem, e a satisfação lhe prolonga a vida”

(Eclo 30, 21 – 22).

A origem do carnaval remonta à Grécia dos meados dos anos 600 a 250 a.C. Tratava-se de uma festa de agradecimento aos deuses pela fertilidade do solo e pela produção. Com o passar do tempo, gregos e romanos introduziram bebidas alcoólicas e práticas sexuais na festa carnavalesca despertando, assim, a aversão por parte da Igreja.

Curiosamente, a história registra que no ano 590 d.C., a Igreja passou a adotar o carnaval. Este passou a ser comemorado através de cultos oficiais que baniam os “atos pecaminosos”. Esta modificação causou espanto no povo, que ignorava o fato de que a Igreja estava, com tal adoção, traindo a idéia original da festa.

Com o Concílio de Trento, em 1545, o carnaval voltou a ser uma festa popular. Sob forte influência européia, em 1723 (aproximadamente), o carnaval chegou ao Brasil, marcado pelo desfile de pessoas mascaradas e fantasiadas. A partir do séc. XIX, começaram a aparecer os blocos carnavalescos de forma semelhante aos que são vistos hoje.

O povo brasileiro adotou o carnaval, e este se tornou uma de suas maiores festas. As tradicionais escolas de samba e as marchas carnavalescas são frutos de exaustivo empenho de incontável número de pessoas, que trabalham dia e noite, para abrilhantar cada vez mais a festa.

O Evangelho de Jesus nos exige que façamos uma séria reflexão em torno deste grande momento nacional. Antes, porém, é preciso destacar a sua importância para a vida do povo brasileiro. A formação deste povo é marcada pela festa. Na verdade, esta faz parte da vida do ser humano, desde que o mesmo passou a viver em sociedade e em comunidade.

A festa é constitutiva da vida humana e necessária para uma convivência sadia e, conseqüentemente, feliz. Sem a festa, a vida humana perderia o seu gosto e ludicidade. A religião não nega a dimensão lúdica e festiva da existência do gênero humano. A celebração é em si uma festa, uma reunião de pessoas em torno do louvor e da gratidão pelos dons recebidos e pela vida vivida.

Infelizmente, dada a condição limitada do homem, a festa também tem se tornado lugar da manifestação da morte. Toda alegria que converge para a vida é sadia, louvável e bendita; mas há certa aparência de alegria na busca do prazer desenfreado que se manifesta todos os anos durante os dias de carnaval. O saldo de violência, tragédias e mortes é altíssimo e tem crescido a cada ano.

Há quatro males que preocupam e destroem a verdadeira alegria do carnaval: violência, drogas, bebida e sexo fácil. São quatro males que estão, intimamente, interligados; ou seja, um conduz ao outro. Pessoas que bebem, excessivamente, tendem a serem violentas e perdem facilmente o controle da sexualidade. Sob os efeitos de bebida alcoólica e das drogas o homem se torna, comumente, um ser perigoso.

Os católicos praticantes, ligados à RCC – Renovação Carismática Católica, que não querem deixar de festejar o carnaval inventaram, recentemente, o que se passou a ser chamar Carnaval com Cristo. Trata-se de festejar buscando se preservar dos excessos e mantendo-se fiéis aos valores morais e cristãos. De maneira sadia, os “renovados em Cristo” procuram celebrar a vida; mas mesmo assim, também constatamos certos “desvios de conduta” em alguns que estão se “divertindo com Cristo”.

Um dos equívocos do Carnaval com Cristo, e que parece ser o pior deles, é a prática farisaica do indiferentismo em relação ao semelhante; ou seja, quem se diverte nesta modalidade de carnaval sente-se, na maioria das vezes, melhor do que as demais pessoas que optam pelo “carnaval do mundo”. O pecado da indiferença leva ao desprezo e à condenação do próximo. Fariseus hipócritas são, na verdade, aquelas pessoas que, por trás de uma festa camuflada de adereços e valores cristãos, aproveitam-se para julgar e condenar o outro. Neste sentido, o evento Carnaval com Cristo pode ser considerado um gesto de profunda indiferença.

Outro mal que se tornou comum no carnaval é a banalização do corpo. Basta olhar as fantasias carnavalescas das escolas de samba. Não somente nestas, a nudez se tornou marca comum do carnaval em todos os lugares. Homens e mulheres investem em academias, medicamentos e cirurgias para expor, sem pudor algum, um corpo “sarado”. Assim, o corpo perde a sua dimensão autenticamente bela, saudável, natural e sagrada e passa a ser objeto de desejo sexual, mais um produto entre outros a ser cobiçado.

Assim sendo, é pecado assistir ou participar do carnaval? De maneira alguma! Bíblica e teologicamente, não existe nenhuma condenação ou recomendação contrária à participação nas festas produzidas pela vontade humana de ser feliz. Desde as origens, o povo de Deus celebrou com muitas festas o dom da vida e os dons concedidos por Deus. Diante de uma nação marcada pelas diversas formas de corrupção que geram gritantes injustiças sociais, a participação no carnaval é uma ótima oportunidade para recobrar o ânimo para continuar lutando por dias melhores.

Que o carnaval seja mais uma oportunidade para nos alegrarmos juntos e para sermos, coletivamente, irmãos que se querem bem alimentando o sonho de um país mais justo e fraterno. Como nos ensina a citação bíblica acima, não nos deixemos dominar pela tristeza, que tem a força de nos tirar a vida; nem de nos afligir pelas preocupações, porque na vida tudo passa. Só Deus, que dá alegria e sentido à nossa vida é quem permanece para sempre.

Quero concluir com mais uma citação bíblica: “Não siga suas paixões. Coloque freio nos seus desejos. Se você permite satisfazer a paixão, ela tornará você motivo de zombaria para seus inimigos” (Eclo 18, 30 – 31). Não se trata de reprimir os desejos, pois faz mal à saúde física, metal e psíquica; mas de controlar os impulsos interiores, que podem nos envergonhar, prejudicar e nos afastar do próximo e de Deus. A você que leu esta mensagem, meus sinceros votos de um ótimo e feliz carnaval!


Tiago de França

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