terça-feira, 10 de maio de 2011

Carta aberta ao Pe. Josimo Moraes Tavares


Querido padre Josimo,

Já faz um bom tempo que conheço a tua história. Há 25 anos exatos foste brutalmente assassinado na cidade de Imperatriz – MA, diante da sede da CPT – Comissão Pastoral da Terra. Infelizmente, não tive a graça de te conhecer, pois nasci dois anos antes, em 1984. Depois que soube do teu martírio, procurei te conhecer através dos livros que muitas pessoas escreveram para não deixar morrer a memória de teu martírio.

A tua personalidade é rica de Jesus Cristo, nosso Mestre comum. Quero ressaltar, para dizer-te de minha profunda veneração para contigo, três aspectos louváveis e dignos de admiração e respeito para com tua pessoa. Estas três qualidades que vou citar são as qualidades proféticas encontradas na vida dos mártires, que derramaram e derramam o sangue na construção do Reino de Deus.

Caro amigo, tu foste, a exemplo de Jesus, um fiel pastor. Creio que te recordas de que o verdadeiro pastor é aquele que dá a vida por suas ovelhas. Basta lembrares da aula que tiveste sobre a teologia joanina, pois no Evangelho segundo João, Jesus é o bom pastor. Deste a tua vida pela vida do povo de Deus, povo explorado e massacrado pelo latifúndio.

Josimo, meu irmão, em minhas reflexões pessoais, ando um pouco preocupado. Creio que já estás sabendo do que está acontecendo: apareceu na Igreja um novo modelo de padre. Acreditas que, aos poucos, ser padre não corresponde mais à doação da própria vida? Pois é, meu amigo. Isto mesmo! Agora virou “moda” salvar a própria vida: ser padre virou meio de vida. Posso te explicar: o padre pode ser cantor, escritor, ter programas na TV, ser famoso junto com outros famosos.

Caro irmão, a situação tem piorado depois de tua morte. Falar de libertação na Igreja de hoje é sinônimo de cura interior. O teu projeto de vida é tido como coisa de comunista. Quando alguém fala da Igreja de teu tempo, a nova geração diz logo que é coisa do passado. Hoje, Josimo, usa-se a Palavra de Deus não para ajudar a libertar as pessoas, mas para aliená-las cada vez mais.

Para teres uma idéia, na sexta-feira santa deste ano, fiz um “sermão” sobre a morte de Jesus na perspectiva do teu martírio (doação da própria vida). Sabe o que aconteceu? Um ministro que distribui a Eucaristia me veio com sangue fervendo nas veias e me disse que não quer problemas comigo. Outros, ainda, me chamaram de “perigoso”. Tudo isto só porque eu disse que Jesus foi assassinado por causa do Reino de Deus, e não para nos lavar dos nossos pecados.

Josimo, meu prezado, aconteceu em 2007 a V conferência do CELAM, aqui, no Brasil; pois tu acreditas que os bispos ousaram dizer que os padres precisam ser discípulos missionários de Jesus de Nazaré? É engraçado, mas é verdade. Está escrito no documento, mas não passou de mais um documento. Substancialmente, nada mudou nem demonstra sinais de mudanças. Parece que nada aconteceu. Padre J. Comblin, nosso companheiro de caminhada e de profecia disse que o documento só serviria para os estudantes de Teologia estudar nas faculdades católicas. E, pelo que vejo, a profecia está se cumprindo.

Meu querido, outra qualidade que me chama a atenção na tua pessoa é a tua pobreza. Lembras do profeta João Batista, aquele que preparou o caminho de Jesus? Pois é, tu tiveste a pobreza dele. Chama-me a atenção a maneira como assimilaste a pobreza de Cristo. Esta, de fato, nos deixa livres para a missão. A exemplo de Cristo, tu foste pobre e livre.

Estimado Josimo, o poder, o prestígio e a riqueza continuam atrapalhando a vida da Igreja. A estrutura da Igreja continua do mesmo jeito, não mudou nada. Tudo está sacralizado. Até parece coisa implantada pelo próprio Deus e sustentada pelo Espírito Santo. E a cada ordenação, salvo as exceções, vejo que o sistema torna-se cada vez mais conservado e rigoroso. Só aparecem “vocações” para reforçar o que está estabelecido. Quase que não há contestação. Às vezes, me sinto na Idade Média.

Por último, não posso me esquecer de que possuíste um profundo senso de justiça. Neste sentido, foste obediente ao Evangelho no qual Jesus recomenda que se buque primeiro o Reino de Deus e sua justiça. De fato, a justiça é uma das palavras-chave que identifica o perfil profético do missionário de Jesus. Clamaste por justiça em meio às injustiças cometidas contra os pobres. Com isto, asseguradamente, posso dizer que fizeste a opção preferencial pelos pobres: foste um irmão dos pobres entre os pobres.

Querido Josimo, despeço-me te pedindo que rogue por nós ao Pai, tu que lavaste tuas vestes no sangue do Cordeiro. A Igreja precisa de tua valiosa intercessão, a fim de que desperte para a realidade dos pobres, a quem serviste com amor e fidelidade até as últimas conseqüências. Pede a Jesus que permaneça conosco e nos confirme na missão de sermos testemunhas dele nesta hora tão difícil da humanidade.

Obrigado, meu querido irmão e mártir de Cristo, pelo testemunho dado à Igreja. Para mim, é motivo de alegria e revigoramento fazer a memória de tua entrega. Como ensinou Tertuliano nas origens, creio e professo que o teu sangue é semente de novos cristãos.

Teu irmão em Cristo e na esperança dos pobres,


Tiago de França
Campina Verde – MG, 10/05/2011

Um comentário:

José Evaldo Ribeiro disse...

Caro Pe. Tiago de França,

Apraz-me cumprimentá-lo e desejar ao reverendíssimo um FELIZ ANO NOVO com PAZ, SAÚDE E BENÇAS na graça de Deus.

Aproveito para Parabenizá-lo pelo excelente e real relato ao Pe. Josimo Moraes Tavares um martírio da santa igreja atual, verdadeiro defensor e seguidor dos ensinamento de Jesus entre os homens. A nosso igreja carece de mais Padres com vocações espirituais pelos chamamentos de Jesus Cristo. Ao Pe. Josimo esse defensor e homem de justiça que derramou o sangue do cordeiro pelo pobres, está neste momento ao lado do nosso Pai, olhando pelas suas ovelhas aqui na terra.

Abraços,

José Evaldo Ribeiro
Caridade - Ceará