quarta-feira, 18 de maio de 2011

Uma palavra sobre a evasão de seminaristas dos Seminários da Igreja


Introdução

A evasão de seminaristas dos Seminários da Igreja é tema de estudos e análises por parte de estudiosos católicos e dos membros do Serviço de Animação Vocacional das Dioceses, Congregações e Institutos de Vida Apostólica. Ultimamente, tem aumentado o número daqueles que deixam o processo formativo e diminuído o número dos que ingressam nos Seminários. Ou seja, saem muitos e entram poucos. A situação é mais agravante nas antigas ordens e congregações religiosas. A conseqüência maior desta situação é a falta de presbíteros e de missionários para a evangelização do mundo. Alguns aspectos nos chamam a atenção. Há motivações e causas que levam à evasão dos seminaristas. Discorramos, pois, brevemente, sobre algumas delas e sobre outros aspectos referentes.

1 – A seleção dos candidatos. A Pastoral Vocacional busca acompanhar aqueles que se apresentam com o desejo ou a vontade de ingressar no Seminário. Trata-se de uma experiência de encontros, visitas, leituras e conhecimento superficial da instituição e da vocação. Após os escândalos de pedofilia ocorridos no seio da Igreja, o Vaticano tem orientado para que se faça uma seleção mais rigorosa dos candidatos às ordens sacras. Não se sabe se nas bases vão dar ouvidos ou não à recomendação do Vaticano. O que se constata é que, de fato, tal recomendação é, urgentemente, necessária. Entende-se por seleção mais rigorosa levar cada vez mais a sério o processo de seleção dos candidatos, tendo em vista a formação de presbíteros preocupados e comprometidos com as grandes causas do Reino de Deus.

2 – Seminário: lugar de aburguesamento? O Seminário é, por vezes, acusado de ser um lugar de aburguesamento, ou seja, lugar em que se adquire uma cultura burguesa. De fato, os seminaristas não realizam a experiência do trabalho. São pouquíssimos os seminaristas que trabalham para a manutenção e subsistência de suas Casas de Formação. Eles são quase que inexistentes. A maneira como a formação está estabelecida não permite que os seminaristas tenham trabalho remunerado. Apesar do alto valor das despesas, a Igreja optou por livrar os seminaristas do competitivo mercado de trabalho. Assim, alimentação, moradia e estudos ficam por conta da Igreja. Nas Congregações, depois da emissão dos primeiros votos, os religiosos têm todas as despesas custeadas.

Por ser um processo que dura de sete a nove anos (dependendo da instituição), boa parte dos seminaristas se deixam levar pelo espírito burguês, pois sua condição não permite saber o quanto custa a vida no mundo. Quando procuram saber, só lhes é permitido na teoria. Antes do Concílio Vaticano II, os seminaristas não sabiam de nada daquilo que acontecia no mundo, pois a formação era, plenamente, interna. Ou seja, tudo acontecia no interior dos Seminários. Viviam isolados do mundo. Hoje é diferente, mas recomenda-se que, durante a semana, não se saia dos Seminários. Mesmo que se queira, a programação interna não permite.

Quando o ser humano tem tudo, gratuitamente, ao seu alcance corre um sério risco de acomodar-se. Quando nos encontramos com padres preguiçosos e acomodados, tal preguiça e acomodação originaram-se antes e durante o processo formativo. Estes padres ignoram a situação dos empobrecidos e em relação a estes procuram manter distância; não aceitam viver em paróquias ou lugares pobres; costumam possuir bons carros, morar em boas casas, usar roupas caras etc. Esta situação aburguesada motiva muitos jovens a serem padres. Apesar do aliciamento do espírito burguês, alguns seminaristas conseguem superá-lo sendo, posteriormente, padres despojados e simples.

3 – Vocações e aparências de vocação. Um dos maiores problemas vocacionais da Igreja se encontra na falta de sinceridade por parte de muitos daqueles que se apresentam como vocacionados. A falta de sinceridade leva o candidato a enganar os responsáveis pelo processo formativo e a falsificar a vocação, procurando, assim, obter vantagens na vida religiosa e clerical. Alguns, devido a problemas de ordem afetivo-sexual, procuram se esconder por trás das seguranças da vida presbiteral.

Quando a promoção vocacional e o processo formativo não conseguem detectar o problema a tempo, certos candidatos mal intencionados terminam chegando ao ministério ordenado. Quando isto acontece, a resolução do problema se torna mais difícil. Às vezes, é mais fácil aquele que procura se aproveitar do estado clerical chegar ao sacerdócio ministerial do que o que procura corresponder de verdade ao chamado divino.

4 – A escassez de vocações. A escassez de vocações tem levado muitas Congregações, Ordens, Dioceses e Sociedades de Vida Apostólica a um erro comum: Acolher todo e qualquer indivíduo nos Seminários sem a necessidade da rigorosa seleção. A busca por vocações, aos poucos, está ficando cada vez mais desesperada. Nos países europeus, muitos Seminários foram fechados e são poucos os seminaristas nos que ainda estão funcionando. O maior número de vocações surge na América Latina e África, principalmente nesta última, onde os jovens não têm muitas oportunidades na vida. Nos países africanos, é muito comum o ingresso de jovens nos Seminários somente para cursarem a Filosofia, outros ainda, cursam a Teologia, sem contar os que procuram um lugar para viver melhor, confortavelmente.

5 – O modelo tradicional de presbítero na Igreja. Os recentes escândalos de pedofilia comprometeram, seriamente, a imagem tradicional do presbítero. Tal imagem já vem sendo comprometida há séculos. A vocação presbiteral não chama mais a atenção da grande maioria dos jovens de hoje. Estes jovens não vêem sentido em tal vocação. Apesar dos esforços da Igreja em reformar, aparentemente, o clero, a maioria dos membros do mesmo trabalham em paróquias com as chamadas “pastorais de manutenção”, denunciadas pelo Documento de Aparecida. Não aprenderam a fazer outra coisa a não ser lidar com paróquias. Outro fator que desanima a juventude é o longo período da formação.

O jovem pós-moderno não tem paciência para esperar tanto tempo. O desânimo e a falta de dinamicidade e criatividade também desanimam a juventude na procura do sacerdócio ministerial. Os desafios que a vocação presbiteral apresenta entusiasmam poucos jovens. A figura do presbítero na Igreja continua se parecendo com a do tempo da cristandade: Um homem separado do mundo. Muitos seminaristas desistem da formação depois que conhecem mais de perto este modelo tradicional desanimador.

6 – O celibato obrigatório. Esta é uma das obrigações que mais pesam no discernimento vocacional de muitos vocacionados. O celibato na Igreja não é opcional, mas obrigatório. Quem desejar ser presbítero deve aceitá-lo, obrigatoriamente. O problema não está no celibato em si mesmo, que é um dom de Deus, mas na obrigação imposta pela Igreja. Por que tal obrigação é um problema? Frisemos dois motivos.

Primeiro, porque nenhuma obrigação é, evangelicamente, correta. O chamado de Deus não implica, obrigatória e/ou necessariamente, o celibato. Em nenhum momento da história Deus exigiu o celibato para a vocação presbiteral. Trata-se de uma obrigação disciplinar, não evangélica. Não há uma citação bíblica que sirva para legitimar a obrigatoriedade do celibato. Peca contra a Escritura Sagrada quem se utiliza do testemunho de Jesus e do apóstolo Paulo para legitimar tal obrigação.

Segundo, porque nem todo aquele que tem vocação presbiteral tem, também, para o celibato. A realidade tem demonstrado que muitos padres têm vocação para o sacerdócio ministerial, mas não tem para o celibato. Há, também, aqueles que têm vocação para o celibato, mas não tem para o sacerdócio ministerial. Neste segundo caso, a Ordenação torna-se inconcebível, ou seja, não é correto conferir o Sacramento da Ordem a um candidato que não tenha vocação para o sacerdócio ministerial. Neste sentido, os responsáveis pela formação e o Bispo são quem reconhecem ou não a vocação do candidato. Muitos seminaristas desistem do processo formativo porque não suportam o peso da obrigação do celibato. Muitos presbíteros também têm deixado o ministério para casarem-se.

Com estas palavras não estou sendo contra o celibato, que, repito, é um dom de Deus, mas apenas constatando as conseqüências de sua obrigatoriedade na vida da Igreja.

7 – O desconhecimento por parte do povo. De modo geral, os católicos não têm a mínima idéia de como seja a formação dos ministros ordenados da Igreja. Muita gente não sabe sequer o significado da palavra seminarista. O povo não sabe de onde vem o padre nem para onde o mesmo vai. Isto acontece porque o povo não participa da formação nem da colocação dos mesmos nas paróquias e comunidades, tendo que suportar, às vezes, padres não muito realizados na vocação, restando apenas esperar a boa vontade do Bispo ou do Superior para uma possível punição (no caso de abusos) ou transferência. Esta é mais comum do que aquela na vida da Igreja. O presbítero católico é formado, muitas vezes, longe do povo, pois o contato dos seminaristas com o povo é pouco.

8 – O problema da homossexualidade. Esta é uma das causas mais comuns da evasão de seminaristas dos Seminários. A verdade nos obriga a declarar que a homossexualidade é um dos maiores problemas dos Seminários. As orientações e normas da Igreja nos ensinam que a homossexualidade é incompatível com o sacerdócio, mesmo sabendo que temos presbíteros homossexuais. Os recentes escândalos não nos deixam mentir, pois boa parte dos padres pedófilos era homossexual. Eles não molestaram crianças do sexo feminino, mas crianças, adolescentes e jovens do sexo masculino. Na verdade, foram molestados mais adolescentes e jovens do que crianças.

O tema da homossexualidade nos exige que façamos uma clara distinção: Há aqueles que têm a prática homossexual e há os que têm a tendência. São duas situações diferentes. Segundo as orientações e normas da Igreja, os que possuem a tendência e se comprometem em viver a castidade podem ser admitidos à formação e às ordens sacras, do contrário, os que têm a prática devem ser expulsos do processo formativo, e os que não ingressaram nos Seminários devem ser impedidos de fazê-lo.

Conclusão

Os Seminários e/ou Casas de Formação devem a sua existência, praticamente, ao Concílio de Trento (séc. XVI), que tomou a iniciativa de formar aqueles que se candidatam às ordens sacras na Igreja. Antes deste período, muitos padres mal sabiam presidir uma Missa, não tinham quase nenhuma formação e cometiam abusos dos mais absurdos, sem contar os que se ordenavam sem vocação alguma, mas somente através das influências políticas e financeiras.

Esta presente reflexão teve o objetivo de esclarecer, brevemente, alguns fatores que explicitam a evasão de seminaristas nos Seminários da Igreja. Muitas vezes, assistimos a tal evasão sem fazermos uma reflexão, nem que seja superficial. O teólogo José Comblin dizia que o Seminário é uma instituição vencida na Igreja, que não serve mais para formar missionários. Ele ensina que os Seminários formam professores de Filosofia e Teologia, e que para formar discípulos missionários de Jesus Cristo a Igreja precisa rever, séria e urgentemente, o modelo de formação daqueles que se propõem evangelizar. Será que o padre José Comblin estava equivocado?... É algo a se pensar.


Tiago de França da Silva
Campina Verde - MG, 18/05/2011.

2 comentários:

Terezinha Brito N. Silva disse...

THIAGO,

EXCELENTE MATÉRIA!
PARABÉNS!

CAMPINA VERDE GANHOU UMA JOIA COM SUA CAPACITADE DE TRANSMITIR E CONQUISTAR ADEPTOS.
QUE DEUS O ABENÇOE>
Terezinha

Tiago de França disse...

Prezada Terezinha,
obrigado pelo elogio.
Abraços!