terça-feira, 6 de dezembro de 2011

O risco de pensar


O homem é um ser que pensa, que sabe que sabe e que dá sentido às coisas, aos fatos e à própria existência. Somente o ser humano é assim. Na difícil arte de pensar há inúmeras dificuldades, dentre as quais enumero três para uma breve reflexão: 1) o pensar no que os outros pensam; 2) o pensar por si mesmo e 3) a liberdade: conseqüência inevitável do pensar autônomo.

Pensar no que os outros pensam é uma preocupação de muita gente. Penso que pensamos no que os outros pensam a respeito de tudo e de todos. Aqui se questiona a falta de liberdade no pensar, ou seja, é preciso que pensemos diferente. É comum o pensamento comum: “Eu penso como fulano pensa”. É verdade que não há problema nisso, mas é verdade também que não é possível que todo mundo pense igualmente, sem diferença alguma.

Há pessoas que não se dão o trabalho de pensar diferente. Elas dizem que pensar diferente dá trabalho e gera sofrimento. Por isso, se contentam com o senso comum, com aquilo que está estabelecido e normatizado, considerado correto e normal. No fundo, estas pessoas não querem questionar as próprias certezas que adquiriram durante os dias até então vividos. Elas têm medo de perder a segurança oriunda das convicções arraigadas e intocáveis.

Há outras que vivem preocupadas em saber sobre o que os outros pensam delas e quando tomam conhecimento de alguma opinião a seu respeito, elas consomem suas energias no pensar no que estes outros pensam. Isso significa que tais pessoas vivem em função daquilo que os outros dizem. Mostram que não possuem opiniões formadas a respeito de si mesmas dependendo, assim, da opinião alheia. Pessoas que assim procedem acostumam-se ao sofrimento e nele sobrevivem até não suportarem mais.

O pensar por si mesmo é uma arte bela e perigosa. Bela porque confere ao ser pensante uma sensação daquela liberdade que se alcançará plenamente numa outra vida que não é essa; perigosa porque pode levar à morte. Todos os sistemas de organização social e religiosa nunca admitiram que as pessoas pensassem por si mesmas. O pensar por si mesmo sempre foi considerado como caminho para a desordem. Para evitar a desordem, o sistema pensa pelas pessoas, dando-lhes respostas prontas para seus anseios e problemas.

Todo sistema, quer civil, quer religioso tem a solução pronta para todo problema e para qualquer tipo de pessoa. Tudo funciona quando as pessoas aceitam as recomendações, orientações, prescrições e obrigações impostas sem nenhuma abertura e diálogo. O leitor poderá chamar isso de ditadura, e eu afirmo que, de fato, é. Há ditaduras escondidas por detrás de pseudodemocracias. É ilusão pensar que as pessoas são livres para fazer o que quiser de suas vidas. Isto nunca foi verdade. Esta liberdade ainda não existe. Os sistemas são tão bem pensados e seu funcionamento é tão eficaz que se procura até controlar o pensamento das pessoas.

Quem procura pensar por si mesmo é alvo da perseguição e da falsa compreensão. Perseguição porque pensar diferente não é normal, pois vai contra aquilo que está estabelecido e aceito como ordenadamente correto e normal; falsa compreensão porque os que pensam diferentes são compreendidos, só não são aceitos. Na verdade, podem ser tolerados, jamais aceitos, porque seu pensar representa, em menor ou maior grau, uma ameaça à ordem estabelecida. As ideologias e os mecanismos de controle que as produzem e as asseguram são os instrumentos necessários para que tudo se perpetue.

A vida só vale a pena ser vivida na busca constante da liberdade, e somente a busca quem se arrisca a pensar por si mesmo. Diante dos mecanismos de controle e manipulação da consciência é preciso encontrar as brechas que existem, ou seja, com jeito e ousadia procurar criar espaços de liberdade. Estes são poucos, mas existem em todo lugar do mundo. O primeiro espaço de liberdade é a própria consciência humana, livre do controle e da subordinação. A consciência livre é o maior instrumento de conquista da liberdade. O pensar por si mesmo ensina o agir por si mesmo e a coragem torna-se a virtude daquelas pessoas que lutam pela conquista da liberdade, direito inalienável de todo ser humano. Não há verdadeira felicidade fora da conquista pela liberdade. Esta é a conseqüência inevitável do pensar autônomo.


Tiago de França

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