O
amor à Igreja é um dos temas relevantes que merece nossa atenção. Para falar
sobre esta questão é preciso responder a seguinte pergunta: De que Igreja
estamos falando? Quando este tema aparece é comum as pessoas confundirem amor à
Igreja com amor à hierarquia. São dois amores diferentes.
O Concílio Vaticano II ousou afirmar que
a Igreja é Povo de Deus. Cresce cada
vez mais o número dos que não aceitam este valioso conceito; conceito que fala
de uma realidade nova, coisa do Espírito do Senhor. Vamos, então, falar alguma
coisa sobre o amor à Igreja e o amor à hierarquia. O leitor procure se
encontrar e aceitar o convite de se fazer Igreja Povo de Deus, Assembléia dos
chamados à edificação do Reino de Deus.
Os que constituem a hierarquia da
Igreja são denominados Pastores do povo de Deus: diáconos, presbíteros e
epíscopos. Por decisão da própria Igreja, sem nenhuma legitimação evangélica e
histórica, as mulheres não podem fazer parte da hierarquia; portanto, não
exercem o ministério ordenado. Este é um tema para outra reflexão.
Ao falar do corpo hierárquico não
podemos deixar de denunciar esta injustiça. Ai da Igreja se não fosse a
presença e a disponibilidade generosa das mulheres! Se elas pudessem exercer o
ministério ordenado, certamente, a Igreja seria mais humana, mais terna e
sensível às grandes causas do Reino de Deus.
Os Pastores são chamados a serem servidores do povo de Deus, homens de
Deus, entregues à oração e ao serviço. É deste modo que devem procurar
responder ao chamado de Deus à santidade, que consiste amar as pessoas e dar
suas vidas pela vida delas. Sem sombra de dúvidas estes homens são dignos de respeito
e veneração.
O amor aos que procuram servir
verdadeiramente a Deus e aos irmãos se traduz na participação em seu ministério
de serviço. Portanto, juntos, ministros ordenados e ministros leigos, todos
iguais aos olhos de Deus, são chamados à promoção e defesa da vida humana.
Este, a meu ver, seria o verdadeiro amor que se deve ter aos Pastores.
Além deste amor autêntico há um
falso amor. Este é reconhecido pela submissão
que muitos leigos têm em relação aos Pastores, especialmente aos padres, aos bispos
e ao Papa. O Evangelho de Jesus denuncia toda forma de submissão e/ou
subserviência. Submeter-se à vontade do outro, por mais santo que seja este
outro, não é atitude evangélica.
Os discípulos de Jesus não eram seus
empregados, mas amigos (cf. Jo 15, 15). Quem se submete cegamente à hierarquia
é porque entende que a Igreja é a hierarquia. Comumente, quem assim procede não
aceita a verdade de que os Pastores também estão sujeitos ao erro e que, de
fato, pecam do mesmo modo como os demais membros da Igreja.
O verdadeiro amor não conduz à
submissão. Ama-se na liberdade e para a liberdade. Quem ama não ver o outro nem
como superior, nem como inferior. O amor conduz à igualdade, à fraternidade e
nos ensina que somos, em Cristo Jesus, irmãos uns dos outros. Os filhos de Deus
são todos irmãos.
O padre, o bispo e o papa são irmãos na
fé, filhos de Deus em igual dignidade em relação aos demais filhos de Deus e
irmãos de Jesus. Por fazer parte do corpo hierárquico ninguém goza de
privilégios diante de Deus. No Reino de Deus não existe hierarquia. Quando enviado
a este mundo para realizar sua missão, Jesus não participou de nenhum corpo hierárquico
e corrigiu seus discípulos quando queriam ser senhores ao invés de servidores
da comunidade (cf. Mc 10, 43).
Muitos católicos praticam um excesso de
veneração em relação aos hierarcas da Igreja, e isto acontece porque há uma
idealização da figura do padre, do bispo e do Papa; tal idealização chega ao
absurdo da cegueira em relação à realidade. Estes católicos, vítimas do mal da
idealização de pessoas, se escandalizam facilmente diante dos contratestemunhos
cometidos por membros da hierarquia. Além disso, compõem o número da maioria
que deixa a Igreja e procura outras denominações religiosas pensando que nestas
não vão encontrar escândalos.
Os que se posicionam de forma crítica em
relação à Igreja costumam ser acusados de não terem amor à Igreja. Os que não
aceitam as análises dos críticos acham que é pecado criticar a Igreja. Trata-se
de um amor destituído de crítica. Os que condenam os críticos certamente não se
dão bem com Jesus de Nazaré, que criticou a religião de seu tempo. Jesus não concordava
com certas práticas religiosas e com algumas leis do Judaísmo e procurou
corrigi-las.
Entre os estudiosos se encontram os
teólogos da libertação, que no interior da Igreja nunca foram vistos com bons
olhos; são acusados de não terem amor à Igreja, simplesmente porque não aceitam
as diversas contradições nas quais está mergulhada a hierarquia. Os teólogos da
libertação anunciam o Evangelho de Jesus que é o Evangelho da vida e da
liberdade. Portanto, acreditam e lutam por uma Igreja essencialmente
missionária, que se empenhe na defesa e promoção da vida e da liberdade dos
seres humanos.
Fechar os olhos diante dos pecados da
Igreja e se recusar a aceitar a Igreja Povo de Deus é ir contra as orientações
essenciais do Evangelho de Jesus. O desejo de Jesus é o mesmo de seu Pai: que o
povo de Deus viva com dignidade na fé, na esperança e no amor. Libertando-se do
mal da condenação, a Igreja deve ser
instrumento de libertação do gênero humano: esta é sua missão fundamental.
Criticar a Igreja quando ela se desvia
de sua missão não consiste em pecado algum, mas é gesto de amor e serviço. A crítica
lúcida e coerente, pautada na verdade e na liberdade, não visa à destruição da
Igreja, mas quer ser um alerta à mesma, a fim de que possa se colocar a serviço
do Reino de Deus, pois é para isto que Deus a chama, insistentemente. As
críticas dos críticos da Igreja merecem uma leitura atenta e sem preconceitos,
pois em muitas delas há muita profecia, voz do Espírito do Senhor que aponta
para o verdadeiro caminho.
Tiago de França