“Bem
profetizou Isaías a vosso respeito, hipócritas, como está escrito: ‘Este povo
me honra com os lábios, mas seu coração está longe de mim. De nada adianta o
culto que me prestam, pois as doutrinas que ensinam são preceitos humanos’. Vós
abandonais o mandamento de Deus para seguir a tradição dos homens” (Mc 7, 6 – 8).
O texto evangélico deste XXII
Domingo Comum (cf. Mc 7, 1-8.14-15.21-23) traz o confronto de Jesus com os
fariseus e alguns mestres da leis, seus opositores declarados, a respeito da
incompatibilidade dentre a vivência do mandamento
de Deus, o amor, e o apego à tradição
dos homens. Para entender o que Jesus quis dizer, é preciso considerar
algumas afirmações.
A
partir da revelação divina na história humana, o ser humano criou a religião.
Esta não é criação divina, mas humana. Em toda religião há a manifestação e a
comunhão com o sagrado, que é considerado e nomeado de diversos modos. Todas as
religiões possuem crenças, preceitos e ritos. Estes contêm suas normas e regras:
tudo criação humana. Cada religião nasceu num contexto histórico, a partir de
mulheres e homens limitados. E Deus, mistério indizível e insondável, não fica
preso a nenhuma religião e socorre os que o buscam de coração sincero e
humilde.
Não
há religião verdadeira, nem falsa; há mulheres e homens que procuram a Deus nas
religiões. Toda procura de Deus é legítima, desde que seja livre e sincera.
A procura de Deus anda bem conturbada, isto acontece porque o ser humano é um
ser de angústias e conflitos. A procura em si é angustiante, seu valor é incomensurável.
Não há um caminho certo em detrimento de outros, que possam ser considerados
errados; há o mundo criado por Deus e nele, em toda parte, o ser humano pode
encontrar-se com seu Criador e Pai.
No
Cristianismo, os cristãos criaram e criam as Igrejas e brigam entre si, cada um
reivindicando Jesus como o fundador de sua denominação religiosa. Considerando
Jesus e sua mensagem, podemos afirmar sem medo de equívoco algum: não passava
na cabeça de Jesus a criação nem de religião nem de denominação religiosa
alguma. Ele não foi enviado para isto. Portanto, é sinal de pura ignorância perder
tempo defendendo que Jesus fundou religião ou a Igreja.
Considerando estas afirmações, vamos
ao texto evangélico. Diante dos fariseus e mestres da lei, Jesus é questionado:
Por que teus discípulos não seguem a
tradição dos antigos, mas comem o pão sem lavar as mãos? Se pensarmos bem
esta pergunta, veremos que diante do mandamento de Deus ela questiona algo que
não tem importância alguma. Deus estaria preocupado com o lavar as mãos antes
de comer, com a maneira de lavar copos, jarras e vasilhas de cobre, e outras
tradições meramente humanas e supérfluas?...
Recordando a profecia de Isaías, Jesus chama a atenção para o essencial,
e entre outras palavras, afirma: Vós
abandonais o mandamento de Deus para seguir a tradição dos homens. Segundo Jesus,
os fariseus e mestres da lei abandonaram o mandamento de Deus para seguir a
tradição dos homens. Isto é muito grave. De fato, era o que acontecia, pois
viver segundo a tradição dos homens assegurava-lhes uma vida tranquila. As tradições
eram pesados fardos que eles colocavam nas costas dos pobres, que não tinham as
mínimas condições de observá-las. Por isso, a maioria dos pobres é considerada
impura.
Jesus não vivia preocupado com a observância
das tradições dos homens, nem pautava sua vida a partir delas. O que lhe
interessava era o cumprimento da vontade do Pai. Cumprir a vontade do Pai: eis o essencial de sua vida. Isto significa
que ele procurou em tudo permanecer unido ao Pai realizando, assim, a sua
missão. Ele ensinou a seus discípulos a fazerem o mesmo: viverem atentos ao
essencial, que consiste no anúncio da Boa Notícia aos pobres.
Com o surgimento das comunidades
cristãs e, consequentemente, da Igreja, os cristãos criaram o culto. Eis o que
disse o profeta Isaías, a quem Jesus fez questão de recordar: Este povo me honra com os lábios, mas seu
coração está longe de mim. De nada adianta o culto que me prestam, pois as
doutrinas que ensinam são preceitos humanos. Honrar com os lábios e manter
o coração longe de Deus, ensinar a observância de preceitos humanos ao invés de
anunciar a Palavra encarnada de Deus: eis os graves pecados que podem ser
cometidos pelos que cultuam a Deus.
Atualmente, é perceptível na vida da
Igreja uma excessiva preocupação pelo culto. Busca-se uma liturgia cada vez
mais perfeita, porém desencarnada da vida do povo. A preocupação com as rubricas,
que assegura o cumprimento fiel das regras estabelecidas, assegura um culto esteticamente
plausível, porém mecanicista. Os ministros estão mais preocupados com as rubricas
do que com o que estão rezando!
Multiplicam-se as casulas, as batinas, as
sobrepelizes; enfim, sofisticam-se os paramentos litúrgicos. Tudo serve mais
para desconcentrar as pessoas, que ficam admirando tais vestes, do que para
conferir beleza e sentido à liturgia. Além do rubricismo litúrgico, há outras
questões nas quais a Igreja termina perdendo muito tempo, em detrimento de sua
missão fundamental, que consiste no anúncio do Evangelho de Jesus.
São
inúmeros os preceitos humanos e tradições existentes que sufocam o surgimento
do novo na vida da Igreja. No interior desta, há uma luta constante entre o
apego à tradição dos homens e a prática do mandamento de Deus. Os que procuram
viver o mandamento de Deus são aqueles que se deixam conduzir pelo Espírito do
Senhor, enquanto os que se apegam à tradição dos homens procuram nela a sua
segurança.
Só se vive o mandamento de Deus na
liberdade. Somente quem é livre pode praticar a religião pura e sem mancha de que fala o apóstolo Tiago: Com efeito, a religião pura e sem mancha
diante de Deus Pai é esta: assistir os órfãos e as viúvas em suas tribulações e
não se deixar contaminar pelo mundo (Tg 1, 27). Os órfãos e as viúvas no
povo de Israel eram os mais indefesos. Com isto, o apóstolo está falando do mandamento
de Deus, que consiste na solidariedade para com os mais pobres. O anúncio do
Evangelho de Cristo implica a opção pelos pobres: eis a missão fundamental da
Igreja neste mundo, missão que só acontece na liberdade.
Tiago de França
Um comentário:
Agora deu para saber a intenção do coracao das pessoas?
Dizer que quem usa batina ou casula esta apegado ao rito, e nao tem boas intencoes?
Ha muitos padres que usam isso e sao BONS PASTORES. Ha muitos que usam e sao PESSIMOS pastores.
Ha muitos padres que com uma tunica ou estola sao BONS PASTORES e muitos outros nao o sao.
Assim que os "homens ve as aparencias e Deus ve o coracção" A Escritura foi certera nisso;
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