segunda-feira, 8 de outubro de 2012

O matrimônio e a vocação à santidade


“No entanto, desde o começo da criação, Deus os fez homem e mulher. Por isso, o homem deixará seu pai e sua mãe e os dois serão uma só carne. Assim, já não são dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus uniu, o homem não separe!” (Mc 10, 6 – 9).

            No tempo de Jesus a cultura era marcada pelo patriarcalismo, no qual a figura do homem dominava; a mulher era submissa à vontade e aos caprichos do homem. Além disso, podia ser despedida, caso este não a quisesse mais (cf. Dt 24, 1). Neste contexto, toda mulher divorciada ficava abandonada, sem proteção alguma. Em Mc 10, 2 – 16, os fariseus, para colocar Jesus à prova, perguntam-lhe sobre a validade da carta de divórcio autorizada por Moisés. A partir da resposta de Jesus, que não se deixou levar pela provocação dos fariseus, mas aproveitou bem para recordar-lhes o mandamento de Deus a respeito do matrimônio, vamos meditar algumas questões que merecem nossa atenção.

            Desde o começo da criação, Deus os fez homem e mulher. Na criação, Deus fez o homem e a mulher: ambos, diante de Deus são iguais. Não deveria haver superioridade nem submissão, mas igualdade. Na família, infelizmente a mulher sempre foi considerada um ser inferior, portanto, responsável pelos serviços “inferiores”: o cuidado da casa. Confinada no interior da casa, a mulher não assumia o espaço público e quando o fazia era acompanhada do esposo. O modelo tradicional de família colocava a mulher no seu devido lugar, lugar que não era o dos homens. Ocupada nos afazeres domésticos, a mulher era sustentada pelo homem e como este detinha o dinheiro, tudo era conforme seu gosto. Servidora do homem em todos os sentidos, a mulher estava obrigada à obediência e ao respeito.

            No século passado, em plena abertura do Concílio Vaticano II, em outubro de 1962, o Papa João XXIII viu na emancipação da mulher um dos sinais dos tempos modernos. Esta emancipação não significa a submissão do homem à mulher, mas o reconhecimento da igualdade querida por Deus desde a criação. Deus não criou a mulher para ser escrava do homem, mas para ser companheira: ambos devem caminhar juntos em pé de igualdade para serem verdadeiramente felizes. Sem companheirismo não há felicidade possível no matrimônio. No respeito e na promoção das diferenças que caracterizam os gêneros masculino e feminino, o dado da pessoalidade deve ser considerado. Mulher e homem são pessoas e assim devem ser tratados.

            Deus os criou para serem uma só carne. Na criação, Deus viu que o homem estava sozinho. A solidão nunca fez bem ao ser humano e não é criação divina. Em todos os momentos da história da salvação, a família e a comunidade sempre estiveram presentes. A humanidade acontece e se desenvolve a partir da família e da comunidade. É aí também que acontece a felicidade do gênero humano. Criados por Deus para viverem a união matrimonial, mulher e homem devem fazer todo o esforço possível para construírem juntos uma vida feliz. Para isto, dentre os valores possíveis, alguns são fundamentais, a saber: o amor, a fé, a compreensão, a paciência, o respeito e a perseverança.

            Não há matrimônio sem amor. Portanto, o mesmo deixa de existir quando falta o amor. Aqui entra o desafio da indissolubilidade do matrimônio. Que sentido tem um casal continuar “unido” se não há amor? Deve continuar somente para atender à exigência da indissolubilidade matrimonial? Nenhuma instituição religiosa pode obrigar alguém a permanecer numa relação que já não tem o amor como o fundamento e, portanto, o sentido de sua existência. Este amor a que nos referimos é sinônimo de doação recíproca, do querer bem ao outro, sem apegos nem submissão, pois o verdadeiro amor liberta o ser humano, o realiza e o torna feliz.

            A no Deus que ama incondicionalmente o ser humano é força e ânimo na caminhada matrimonial. Com a ajuda da graça divina é possível superar as dificuldades que vão surgindo no caminho. Por meio da fé, o Deus que constituiu a união entre a mulher e o homem eleva esta mesma união à perfeição no seu amor. A difícil situação atual do matrimônio mostra claramente que os casais precisam ser cada vez mais pessoas de fé, que confiem mais em Deus e esta confiança os manterá sempre unidos, principalmente em meio às tribulações da vida.

            Não há convivência possível sem compreensão mútua. Onde não há compreensão há intolerância e violência. A incompreensão tira do outro o direito de ser visto e considerado na sua real condição de ser limitado, finito, frágil, sujeito a falhas. Além disso, a incompreensão impede o diálogo, que consiste na recepção da verdade do outro, daquilo que o outro tem para oferecer de bom. Quando não se busca compreender o outro, a vida matrimonial se torna um tormento, pois abre espaço à impaciência. A compreensão gera a paciência e esta insiste na continuidade da relação para o bem de todos. A paciência em meio às dificuldades é uma virtude que sustenta o casal.

            O respeito às diferenças é outro valor imprescindível para o matrimônio. Mulher e homem são diferentes nas formas de agir, pensar e ser. O respeito recíproco conserva a dignidade do matrimônio e colabora para a valorização da singularidade de cada cônjuge. A falta de respeito é um dos piores males que afeta a relação matrimonial, pois onde não há respeito há o ridículo, a exposição do outro e a humilhação. O desrespeito é uma forma de violência contra o matrimônio.

            Estes valores colaboram com o casal e os faz viver o dom da perseverança. O difícil não é iniciar a vida matrimonial: todo início é alegre e feliz. Colocar-se no caminho não é algo difícil, o necessário e desafiante é perseverar. A perseverança está intimamente ligada à fidelidade, que gera mais amor e confiança. Na fidelidade há tranquilidade e paz.

            Por fim, é preciso considerar que o matrimônio é um chamado de Deus, é vocação cristã. Portanto, é caminho de Jesus no qual se deve perseverar até as últimas consequências. Deus chama cada casal à santidade no matrimônio, e esta santidade não é outra coisa senão contribuir na obra da criação, no cuidado recíproco e com o que Deus concede: construir a família para um outro mundo possível.

O futuro da humanidade está necessariamente ligado à família. Com o passar do tempo, esta tem passado por profundas e complexas transformações. Surgem novos tipos de famílias que merecem um olhar atento e misericordioso. As mudanças são rápidas, causam preocupação e nos remetem à verdade de que o velho modelo tradicional de família já não existe mais, salvo raríssimas exceções. Portanto, é necessário rever o conceito, a doutrina, os valores e o olhar sobre a relação conjugal; do contrário, tudo o que se falar a respeito do matrimônio já não fala nada a ninguém, torna-se discurso vazio e, portanto, sem sentido. Em outra reflexão poderemos discorrer a respeito destas profundas transformações que afetam a família na sociedade hodierna.

Tiago de França

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito bom o texto, Tiago! O matrimonio é isso, AMOR, RESPEITO, PACIÊNCIA, e varias coisas que forma uma unica vida feliz entre duas pessoas. Creio que seja muito belo uma vida assim... Eu particularmente tenho um ótimo namorado que queria passar o resto da minha "Vidinha" com ele..Amo muito!