“Os
cristãos não se distinguem dos demais homens, nem pela terra, nem pela língua,
nem pelos costumes. Nem, em parte alguma habitam cidades peculiares, nem usam
alguma língua distinta, nem vivem uma vida de natureza singular” (Carta a
Diogneto, séc. II).
O ser precede o fazer. Impulsionada
por um modo próprio de ser, a pessoa age, manifesta-se no mundo com sentido e
convicção. Esta ação é capaz de transformar, de fazer a vida acontecer, de
recriar as coisas, aperfeiçoando-as para o bem. A experiência cristã acontece
no caminho, no movimento peregrinante. Cristo, quando habitou historicamente
este mundo adotou um estilo próprio: o de fazer-se companheiro do ser humano na
lida simples do cotidiano da vida.
Ele não fez nem pediu para fazer
nada além disso. Sua religião consistia na leitura e na prática da palavra
transformadora de Deus. A novidade de Jesus estava na observância da palavra de
Deus. Era um judeu praticante da palavra, não mero observante da lei mosaica. Sua
união com o Deus de Israel o levou à perfeição. Quem o encontrava não via nada
de extraordinário em seu jeito de ser.
Justamente por isso, as autoridades
religiosas de seu tempo não viam nele o Messias esperado. Não aparentava ser
dotado de poderes especiais. Todos perguntavam pela origem da autoridade de sua
pregação, admiravam-se quando souberam que era filho de carpinteiro, nascido em
Nazaré. Até seus familiares se escandalizaram com seu jeito de ser. Dedicou a
vida ao anúncio do Reino de Deus, foi perseguido, crucificado e ressuscitou ao
terceiro dia.
Depois de Jesus, os cristãos
permaneceram fiéis à sua mensagem por um bom tempo. Passado o tempo das
perseguições, a hierarquia da Igreja já nitidamente constituída aderiu ao
Império Romano e o evangelho de Jesus foi aos poucos sendo esquecido. Um número
significativo de cristãos saiu das cidades e foi morar no deserto, viviam sozinhos
(eremitas) e em comunidade (cenobitas), esforçando-se para preservar a prática
da mensagem cristã.
O poder, as riquezas e o prestígio
se infiltraram na vida da Igreja, mas mesmo assim o Espírito suscitou, ao longo
da história, mulheres e homens evangélicos. Estas pessoas simplesmente se
colocaram no caminho de Jesus e foram confirmadas por Deus. Ao longo do tempo,
a Igreja foi se institucionalizando e, com isto, foram aparecendo códigos,
normas e regras das mais diversas sobre todos os aspectos da vida eclesial. Junto
a todo este conjunto normativo apareceram pessoas que foram se apegando à
observância de tais coisas, em detrimento do evangelho de Jesus.
Com o aparecimento das normas
institucionais e das diversas práticas religiosas o ser cristão passou a ser
identificado com a observância de tais normas e práticas. A fidelidade cristã
passou a ser medida pela fidelidade aos princípios religiosos. O aparato
religioso e institucional abafou a novidade do evangelho de Jesus, que faz o
verdadeiro cristão. A preocupação pelo cumprimento fiel do que foi estabelecido
pela instituição religiosa não deixa espaço para a prática da palavra de Deus. De
modo geral, as pessoas não tem tempo para meditar e compreender a palavra de
Deus.
O cristão é pessoa simples e
humilde, que vive no meio do mundo orientando-se pelos valores do Reino. Portanto,
diferencia-se pela abertura, pela generosidade, pelo serviço e pela acolhida do
outro. Vivendo despojadamente, procura fazer, acima de tudo, a vontade de Deus.
Nada faz de extraordinário, sua vida já é extraordinária. Sua regra de vida é o
amor e neste persevera até o fim. Este é o jeito de ser cristão, que supera o
mero fazer que conduz ao vazio. Preenchido pelo Espírito e, por isso mesmo,
livre de todo vazio existencial, o cristão tem os olhos fixos em Jesus, porque
apaixonado por este confere sentido à vida, mesmo que esta aparentemente esteja
desfigurada, mas a esperança cristã o faz superar todas as coisas.
Tiago de França
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