terça-feira, 12 de março de 2013

A misericórdia de Deus e a eleição do novo Papa


“Com efeito, em Cristo, Deus reconciliou o mundo consigo, não imputando aos homens as suas faltas e colocando em nós a palavra da reconciliação” (2 Cor 5, 19).

            A famosa parábola do filho pródigo (cf. Lc 15, 1 – 3.11 – 32) se encontra no centro da Liturgia da Palavra desde IV Domingo da Quaresma. Trata-se de uma parábola que Jesus contou referindo-se aos fariseus e mestres da lei, que o criticavam por se aproximar dos cobradores de impostos e comer com os pecadores. A crítica merece destaque: “Este homem acolhe os pecadores e faz refeição com eles”. Eis duas atitudes importantes de Jesus: acolher os pecadores e fazer refeição com eles. Isto escandalizou os religiosos da época e continuar escandalizando nos dias de hoje.

            É uma profunda contradição pensar que se segue a Jesus excluindo as pessoas. Infelizmente, na comunidade eclesial muitas pessoas são excluídas por vários motivos: por causa da condição social, da cor da pele, das ideias que defendem, por não tolerarem abusos, por se recusarem à obediência cega etc. Além destas pessoas, há as que pertencem às “minorias abraâmicas”, como dizia o santo bispo Dom Helder Câmara; aquelas pessoas excluídas na sociedade, que são desprezadas por diversos motivos.

Infelizmente, as Igrejas cristãs pouco se interessam por estas pessoas. Elas se encontram no anonimato, padecendo em seus sofrimentos; não aparecem nos templos religiosos e não vivem segundo as prescrições religiosas das Igrejas. Estas pessoas, de modo geral, estão muito unidas a Deus porque participam, na carne, da cruz de Cristo. Deus é sua única riqueza. Ele se encontra com elas, cotidianamente, sustentando-as de algum modo. Ele as ama com ternura e espera que o encontremos nelas. Elas conhecem o mistério do Reino de Deus, pois pertencem à numerosa porção dos “pequeninos de Deus”.

Jesus acolheu os pecadores do seu tempo. A leitura desta acolhida para a Igreja de hoje traz sérias implicações. Jesus era um homem próximo dos que sofriam e dos que eram excluídos. Para estes, ele era a Boa Notícia de Deus. De fato, Jesus é o evangelho do Pai. A Igreja, essencialmente missionária, é chamada a ser uma Boa Notícia para o mundo. Para isto, precisa fazer a mesma coisa que Jesus fez: acolher os pecadores e fazer refeição com eles. É preciso que as condenações deem lugar à prática da misericórdia. Fazer refeição significa estar (permanecer) com os pecadores, identificar-se com eles. Para a Igreja este sempre foi um desafio.

A parábola é a resposta de Jesus a seus opositores. Nela, ele está falando de si e da misericórdia do Pai, que acolhe a todos, especialmente os excluídos. Os fariseus e mestres da lei não eram homens do povo, mas servidores da lei e separados, que julgavam e condenavam as pessoas, pois se achavam melhores e superiores a elas. Na Igreja temos inúmeros fariseus e mestres da lei, tanto no laicato quanto no clero: pessoas que se julgam superiores às outras somente por serem observantes das prescrições religiosas. Às vezes, nem são tão observantes, mas se escondem por trás da falsa observância. São pessoas apegadas à lei, que se esqueceram do evangelho de Jesus.

A parábola fala da misericórdia divina. Deus é essencialmente misericordioso. Ele ama e perdoa, infinitamente. Jesus revelou a verdadeira face de Deus: amoroso e misericordioso para com seus filhos e filhas. Como nos ensina o apóstolo Paulo, Ele não imputa aos homens suas faltas, mas coloca no coração humano a palavra da reconciliação. Portanto, todo gesto de reconciliação é o Espírito do Senhor agindo nas pessoas. Este Espírito torna possível a experiência salvífica da reconciliação.

Nesta terça-feira, 12 de março, ocorrerá o conclave que elegerá o novo Bispo de Roma e Pontífice da Igreja. Após o grande Papa João XXIII, que ousou convocar o Concílio Vaticano II vieram os Papas Paulo VI, João Paulo I, João Paulo II e Bento XVI. Paulo VI não interrompeu o Concílio e o aprovou. Foi o maior feito de seu pontificado. João Paulo I morreu, prematura e misteriosamente; seu pontificado durou apenas 33 dias. Era homem de bom coração, simples e de um sorriso acolhedor.

João Paulo II foi eleito bem jovem. Seu pontificado ficou marcado pelo conservadorismo e pela volta à grande disciplina. Após quase três décadas de pontificado, um dos maiores da história, foi eleito Bento XVI. Este foi fiel a seu predecessor: continuou na mesma linha de pensamento e ação sem apresentar novidade alguma. Após séculos sem renúncia papal, Bento XVI recorreu à renúncia por não ter mais condições físicas e psicológicas de permanecer no pontificado. Surpreendeu a Igreja, principalmente os membros de Cúria Romana, deixando os sedentos de poder de “orelha em pé”.

A mídia tem falado de alguns nomes fortes para o conclave que se aproxima. São os candidatos mais fortes: Angelo Scola, Cardeal Arcebispo de Milão, Itália; Gianfraco Ravasi, Cardeal Presidente do Pontifício Conselho para a Cultura, Roma; Odilo Pedro Scherer, Cardeal Arcebispo de São Paulo, Brasil e Timothy Michael Dolan, Cardeal Arcebispo de Nova Iorque, EUA. Estes quatro são os mais falados. Um deles pode ser eleito, ou não.

Os dois primeiros são os candidatos que possuem certa cultura teológica reconhecida. Ambos são da mesma linha de Bento XVI. De repente, surgiu Dom Odilo! Assim como na Igreja onde é Arcebispo, se fosse eleito não apresentaria novidades, seria um fiel continuador de Bento XVI. O que está causando entusiasmo é o norte-americano Cardeal Timothy M. Dolan: simpático, parece progressista e pouco apegado à pomposidade, inteligente, rejuvenescido, aberto ao diálogo. Particularmente, creio que se fosse eleito poderia apresentar algumas novidades.

O novo Papa precisa ser um homem misericordioso e atento aos sinais dos tempos. A Igreja precisa de reformas. O espírito do Vaticano II precisa ser retomado e a Cúria Romana carece de uma reforma radical. Muitas coisas precisam ser revistas e como os leigos não tem espaço sequer para opinar, resta esperar que o novo Papa e os Bispos possam realizar as mudanças necessárias. É verdade que não podemos esperar que as mudanças venham de cima, pois elas nascem da ação do Espírito do Senhor, que age nas bases da Igreja, a partir das lutas do povo de Deus. Aguardemos, pois, o resultado do conclave e rezemos para que o eleito seja um homem sensível aos apelos do povo de Deus e à voz do Espírito do Senhor.

Tiago de França

3 comentários:

Marco Antonio Osório da Costa disse...

Curioso ver, Tiago, como, mesmo diante do fato de que Jesus acolhia os pecadores e comia come eles, ainda vemos nos dias de hoje Padres e Paróquias negando a participação na Eucaristia (comunhão) àqueles que, segundo eles, "se encontram em pecado", como, por exemplo, os recasados...

Tiago de França disse...

Pois é, meu caro. É de se pensar nisso. Vamos ver se o novo Papa vai repensar esta e outras questões.

Anônimo disse...

Acredito que as reformas que vocês almejadas por vocês em seus respectivos tópicos de um jeito ou de outro irão acabar passando senão pela igreja mas pelo mundo ou ambos, e quem for fiel a tradição irá ser perseguido o que vem a confirmar as profecias sobre a apostasia...