“Com
efeito, em Cristo, Deus reconciliou o mundo consigo, não imputando aos homens
as suas faltas e colocando em nós a palavra da reconciliação” (2 Cor 5, 19).
A famosa parábola do filho pródigo
(cf. Lc 15, 1 – 3.11 – 32) se encontra no centro da Liturgia da Palavra desde
IV Domingo da Quaresma. Trata-se de uma parábola que Jesus contou referindo-se
aos fariseus e mestres da lei, que o criticavam por se aproximar dos cobradores
de impostos e comer com os pecadores. A crítica merece destaque: “Este homem acolhe os pecadores e faz
refeição com eles”. Eis duas atitudes importantes de Jesus: acolher os
pecadores e fazer refeição com eles. Isto escandalizou os religiosos da época e
continuar escandalizando nos dias de hoje.
É uma profunda contradição pensar
que se segue a Jesus excluindo as pessoas. Infelizmente, na comunidade eclesial
muitas pessoas são excluídas por vários motivos: por causa da condição social,
da cor da pele, das ideias que defendem, por não tolerarem abusos, por se recusarem
à obediência cega etc. Além destas pessoas, há as que pertencem às “minorias
abraâmicas”, como dizia o santo bispo Dom Helder Câmara; aquelas pessoas
excluídas na sociedade, que são desprezadas por diversos motivos.
Infelizmente, as Igrejas cristãs pouco
se interessam por estas pessoas. Elas se encontram no anonimato, padecendo em
seus sofrimentos; não aparecem nos templos religiosos e não vivem segundo as
prescrições religiosas das Igrejas. Estas pessoas, de modo geral, estão muito
unidas a Deus porque participam, na carne, da cruz de Cristo. Deus é sua única
riqueza. Ele se encontra com elas, cotidianamente, sustentando-as de algum
modo. Ele as ama com ternura e espera que o encontremos nelas. Elas conhecem o
mistério do Reino de Deus, pois pertencem à numerosa porção dos “pequeninos de
Deus”.
Jesus acolheu os pecadores do seu tempo.
A leitura desta acolhida para a Igreja de hoje traz sérias implicações. Jesus
era um homem próximo dos que sofriam e dos que eram excluídos. Para estes, ele
era a Boa Notícia de Deus. De fato, Jesus é o evangelho do Pai. A Igreja,
essencialmente missionária, é chamada a ser uma Boa Notícia para o mundo. Para
isto, precisa fazer a mesma coisa que Jesus fez: acolher os pecadores e fazer
refeição com eles. É preciso que as condenações deem lugar à prática da
misericórdia. Fazer refeição significa estar (permanecer) com os pecadores,
identificar-se com eles. Para a Igreja este sempre foi um desafio.
A parábola é a resposta de Jesus a seus
opositores. Nela, ele está falando de si e da misericórdia do Pai, que acolhe a
todos, especialmente os excluídos. Os fariseus e mestres da lei não eram homens
do povo, mas servidores da lei e separados, que julgavam e condenavam as
pessoas, pois se achavam melhores e superiores a elas. Na Igreja temos inúmeros
fariseus e mestres da lei, tanto no laicato quanto no clero: pessoas que se
julgam superiores às outras somente por serem observantes das prescrições
religiosas. Às vezes, nem são tão observantes, mas se escondem por trás da
falsa observância. São pessoas apegadas à lei, que se esqueceram do evangelho
de Jesus.
A parábola fala da misericórdia divina. Deus
é essencialmente misericordioso. Ele ama e perdoa, infinitamente. Jesus revelou
a verdadeira face de Deus: amoroso e misericordioso para com seus filhos e
filhas. Como nos ensina o apóstolo Paulo, Ele não imputa aos homens suas
faltas, mas coloca no coração humano a palavra da reconciliação. Portanto, todo
gesto de reconciliação é o Espírito do Senhor agindo nas pessoas. Este Espírito
torna possível a experiência salvífica da reconciliação.
Nesta terça-feira, 12 de março, ocorrerá
o conclave que elegerá o novo Bispo de Roma e Pontífice da Igreja. Após o
grande Papa João XXIII, que ousou convocar o Concílio Vaticano II vieram os
Papas Paulo VI, João Paulo I, João Paulo II e Bento XVI. Paulo VI não
interrompeu o Concílio e o aprovou. Foi o maior feito de seu pontificado. João
Paulo I morreu, prematura e misteriosamente; seu pontificado durou apenas 33
dias. Era homem de bom coração, simples e de um sorriso acolhedor.
João Paulo II foi eleito bem jovem. Seu
pontificado ficou marcado pelo conservadorismo e pela volta à grande
disciplina. Após quase três décadas de pontificado, um dos maiores da história,
foi eleito Bento XVI. Este foi fiel a seu predecessor: continuou na mesma linha
de pensamento e ação sem apresentar novidade alguma. Após séculos sem renúncia
papal, Bento XVI recorreu à renúncia por não ter mais condições físicas e
psicológicas de permanecer no pontificado. Surpreendeu a Igreja, principalmente
os membros de Cúria Romana, deixando os sedentos de poder de “orelha em pé”.
A mídia tem falado de alguns nomes
fortes para o conclave que se aproxima. São os candidatos mais fortes: Angelo
Scola, Cardeal Arcebispo de Milão, Itália; Gianfraco Ravasi, Cardeal Presidente
do Pontifício Conselho para a Cultura, Roma; Odilo Pedro Scherer, Cardeal Arcebispo
de São Paulo, Brasil e Timothy Michael Dolan, Cardeal Arcebispo de Nova Iorque,
EUA. Estes quatro são os mais falados. Um deles pode ser eleito, ou não.
Os dois primeiros são os candidatos que
possuem certa cultura teológica reconhecida. Ambos são da mesma linha de Bento
XVI. De repente, surgiu Dom Odilo! Assim como na Igreja onde é Arcebispo, se
fosse eleito não apresentaria novidades, seria um fiel continuador de Bento
XVI. O que está causando entusiasmo é o norte-americano Cardeal Timothy M.
Dolan: simpático, parece progressista e pouco apegado à pomposidade,
inteligente, rejuvenescido, aberto ao diálogo. Particularmente, creio que se
fosse eleito poderia apresentar algumas novidades.
O novo Papa precisa ser um homem
misericordioso e atento aos sinais dos tempos. A Igreja precisa de reformas. O espírito
do Vaticano II precisa ser retomado e a Cúria Romana carece de uma reforma
radical. Muitas coisas precisam ser revistas e como os leigos não tem espaço
sequer para opinar, resta esperar que o novo Papa e os Bispos possam realizar
as mudanças necessárias. É verdade que não podemos esperar que as mudanças
venham de cima, pois elas nascem da ação do Espírito do Senhor, que age nas
bases da Igreja, a partir das lutas do povo de Deus. Aguardemos, pois, o
resultado do conclave e rezemos para que o eleito seja um homem sensível aos
apelos do povo de Deus e à voz do Espírito do Senhor.
Tiago de França
3 comentários:
Curioso ver, Tiago, como, mesmo diante do fato de que Jesus acolhia os pecadores e comia come eles, ainda vemos nos dias de hoje Padres e Paróquias negando a participação na Eucaristia (comunhão) àqueles que, segundo eles, "se encontram em pecado", como, por exemplo, os recasados...
Pois é, meu caro. É de se pensar nisso. Vamos ver se o novo Papa vai repensar esta e outras questões.
Acredito que as reformas que vocês almejadas por vocês em seus respectivos tópicos de um jeito ou de outro irão acabar passando senão pela igreja mas pelo mundo ou ambos, e quem for fiel a tradição irá ser perseguido o que vem a confirmar as profecias sobre a apostasia...
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