Neste
ano, o Brasil vai sediar a Jornada Mundial da Juventude – JMJ, evento da Igreja
Católica que reúne jovens vindos de diversas partes do mundo. Nesta reflexão
queremos abordar algumas questões referentes à JMJ, dada a importância deste
evento para a vida da Igreja. Vamos dar ênfase aos aspectos positivos e
negativos que traduzem a realidade da Jornada. Refletir sobre o que acontece é necessário
para evitarmos o fanatismo religioso, que cega as pessoas e as impede de
enxergar os fatos com clareza.
Alguns aspectos
positivos
O Papa Francisco
Diferentemente das outras vezes,
será o Papa Francisco uma das figuras centrais da JMJ. Nos anos anteriores,
desde a criação da JMJ, os Papas João Paulo II e Bento XVI compareceram à JMJ,
mas a expectativa em torno de Francisco é bem maior, considerando a simpatia e
a simplicidade com as quais vem lidando com as pessoas. Certamente, Francisco
falará de consolo, de esperança, de futuro, de encorajamento, de alegria, de
fé, amor e justiça. Tudo isto está em falta na vida de muitos jovens.
Espera-se também que Francisco se
posicione radicalmente contra a tudo aquilo que oprime e mata a juventude. Consciente
de que não falará somente para jovens, o Papa chamará a atenção da sociedade
brasileira, dos governantes e da Igreja para a causa da juventude, que no
Brasil é praticamente esquecida, marginalizada. Nenhuma instância social, tanto
civil quanto religiosa priorizou a juventude até hoje no Brasil. Quando se fala
da juventude, a maioria das notícias está associada ao crime, à prostituição,
ao abandono e à morte. Quase não há projetos.
Francisco chamará a atenção da
juventude para o seguimento de Jesus, origem e fonte de toda felicidade humana.
Com palavras e gestos mostrará que vale a pena se apaixonar por Jesus e
segui-lo na intimidade do coração. Certamente, vai despertar a esperança nos
corações de muitas pessoas desoladas e desesperadas. Será uma bênção de Deus o
encontro com um Papa que tem se esforçado em responder o chamado de Deus na
verdade, na caridade e na simplicidade.
O anúncio do
Evangelho
A JMJ é um dos momentos propícios
para lembrar aos jovens e à Igreja a verdade fundamental de que Jesus deve
ocupar o centro da vida cristã. Por isso, com todas as letras, Francisco deve
deixar bem claro que o autêntico Cristianismo é aquele no qual a Palavra e a
vida se misturam e, intimamente, se comunicam e se entrelaçam. Apontar para
Jesus, o Cristo que tem um projeto de vida claro e aberto a todos: eis a missão
daquele que é chamado a confirmar os irmãos na fé.
O louvor, o
encontro das culturas e a reconciliação
A JMJ deve ser momento de alegria
contagiante, de troca de experiências, de encontro entre pessoas de diferentes
culturas; portanto, é um momento plural, feliz, fecundo, que é capaz de
conferir ânimo aos desanimados. Os jovens de outras nações terão a oportunidade
de conhecer uma das maiores cidades do país, Rio de Janeiro, palco da violência
urbana, dos recentes protestos, da beleza exuberante das praias, do Cristo
Redentor, do samba carioca, do chão batido por onde passam, diariamente,
milhares de pessoas que lutam pela sobrevivência.
Chamados à penitência através do
sacramento da reconciliação, os jovens serão despertados para o real sentido da
comunhão com Deus e com os irmãos. Sentirão o coração vibrar de alegria pela
graça recebida e verão, na liturgia, na música, no encontro e nos demais
momentos que ali se organizarão o quanto é belo e saudável viver na alegria dos
irmãos. Saberão que Deus é verdadeiramente bom e que sua misericórdia é
infinita, capaz de chegar a todos, indistintamente.
Alguns aspectos
negativos
Os custos da JMJ
Pelo que se sabe, os governos
municipal, estadual e federal entrarão com uma pesada parcela de contribuição
para a JMJ. Trata-se de um evento que custará alguns milhões de reais aos
cofres públicos. Os cofres públicos brasileiros andam sendo saqueados
indevidamente nos últimos anos. Direcionam-se milhões de reais para projetos e
eventos que não são essenciais à vida da população. O maior saque indevido aos
cofres públicos refere-se ao que se gastou com os estádios de futebol, em vista
das copas das confederações e do mundo, sem contar os gastos com as olimpíadas
de 2016. Não somos uma superpotência econômica com condições para arcar com
tantos eventos sem que a nossa população fique no prejuízo.
Jesus, onde
fica?
Quando estão diante do Papa,
geralmente, as pessoas se esquecem de Jesus. Ao longo da história, a figura do
Papa foi se transformando em algo quase sobrenatural. Em certas épocas
pensou-se até que o Papa seria o Santo de Deus, o único caminho que leva o
homem a Deus. A figura papal foi ganhando títulos, honras, glória, poder,
majestade até chegar o ponto de as pessoas pensarem que se trata de um
semideus. Continua sendo chamado de Santo Pai o simples homem oriundo da
Argentina.
Eventos como a JMJ e outros, direta
e indiretamente, terminam reforçando essa imagem antievangélica da figura do
Bispo de Roma. Neste sentido e de modo geral, as pessoas caem no pecado da papolatria. Claro que Francisco não
deseja isso para si nem para a Igreja, mas somente pelo fato de aparecer como
vai aparecer, levará a tantos a cometer tal pecado. É preciso lembrar que foi o
papa polonês, amigo da grande mídia sensacionalista e possuidor de extrema
vaidade, o criador da JMJ. Esta para ele era uma excelente oportunidade de
preparar a sua aclamação pública de santo súbito. Assim, Jesus vai sendo marginalizado
e por mais que apontem para ele, as pessoas não tiram os olhos dos dedos de
quem o aponta.
Os jovens pobres
e marginalizados, onde ficam?
O número de jovens pobres que vão
à JMJ é relativamente pequeno, uma vez que os pobres de outros países não tem
condições financeiras para virem ao Brasil. Os poucos jovens pobres que irão participar
são aqueles que foram auxiliados pelas paróquias e dioceses de origem. A maioria
dos jovens é de classe média e desconhece a triste realidade dos que vivem à
margem da sociedade. Portanto, Francisco vai falar para uma juventude que está
um pouco distante dos grandes dilemas que afetam a maioria dos jovens no mundo
de hoje.
Os jovens pobres, sem escola, sem
casa, sem salário, os que estão envolvidos com as drogas, com a prostituição,
com o crime organizado, os ameaçados de morte e os depressivos, os
desorientados e sem rumo na vida, enfim, todos estes e tantos outros não irão
participar da JMJ. Francisco vai falar para a juventude “convertida”, porque os
jovens “transviados” não se interessam pela Igreja.
Ausência de
projetos para a salvação da juventude
De modo geral, os jovens que irão
participar da JMJ são jovens que tem certa prática religiosa. No caso dos
brasileiros, boa parte pertence à renovação carismática católica (RCC), outra à
Pastoral da Juventude, outra parcela pertence a grupos de oração e uma minoria
participa somente das celebrações eucarísticas. Estes grupos revelam a existência
de uma geração de mentes um pouco fechadas para os reais problemas. A maioria
está alheia aos problemas do mundo. Na RCC fala-se que se converteram a Jesus e
abandonaram o mundo. Cultivam a perigosa espiritualidade (se é que podemos
chamar de espiritualidade tal coisa!) da fuga
mundi.
Por isso, a mensagem de Francisco
talvez chegue à mente, mas não descerá aos corações dos jovens. Estes amarão as
palavras do Papa e irão aplaudi-lo, mas, no fundo, querem somente se alegrar e
louvar o Senhor. Se isto, de fato, ocorrer, infelizmente se repetirá o que
ocorreu com a Campanha da Fraternidade deste ano, que teve como Tema Fraternidade e Juventude, porém, pouco
se fez em prol da juventude. A Campanha parece ser coisa do passado. O que
ficou das Jornadas anteriores? Qual o efeito delas além de ter chamado a
atenção da grande mídia para o fato de que ainda há jovens que se identificam
com a Igreja? O que ficará da JMJ 2013?...
Conclui-se que há esperanças de que
o Papa Francisco possa colaborar para que a JMJ ganhe um novo sentido e uma nova
orientação, mais concreta. A realidade da juventude em todo o mundo clama por
justiça. De fato, a sociedade, os governos e a Igreja precisam trabalhar pela
salvação da juventude. A Igreja precisa renunciar a seu velho e ultrapassado
discurso moralista para levar a juventude a abraçar as grandes causas do Reino
de Deus. A juventude precisa conhecer o que é este Reino e colocar-se a serviço
dele, pois somente assim os jovens serão Igreja e a esta ganhará sangue novo em
suas veias; do contrário, continuaremos assistindo ao progressivo e inevitável
definhamento eclesial.
Tiago de França
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