“E
Deus, não fará justiça aos seus escolhidos, que dia e noite gritam por ele?
Será que vai fazê-los esperar?” (Lc 18,7).
O evangelho segundo Lucas fala de
uma parábola que Jesus contou aos discípulos “para mostrar-lhes a necessidade de rezar sempre, e nunca desistir”:
estas palavras de Lucas explicam os motivos pelos quais a parábola é contada.
Rezar sempre e nunca desistir: duas atitudes fundamentais na vida cristã. Na
parábola (cf. Lc 18, 1 – 8) aparecem dois personagens: um juiz impiedoso, que
não teme a Deus e não respeita homem algum e uma pobre viúva que,
insistentemente, procura o mesmo juiz para fazer-lhe justiça. Cansado de ser
procurado pela viúva, o juiz, depois de muito tempo, resolve fazer justiça. Jesus
chama a atenção dos discípulos para o fato de que Deus, que não é um juiz
injusto, faz justiça aos seus escolhidos e escuta o clamor dos desesperados e
finaliza, perguntando: “o Filho do homem,
quando vier, será que ainda vai encontrar fé sobre a terra?”
O juiz injusto
De modo geral, os poderosos deste
mundo são impiedosos, não ligam para a justiça, não temem a Deus e, por isso
mesmo, fazem inúmeras pessoas sofrer. A ausência do temor a Deus torna-os
autossuficientes ao ponto de se considerarem deuses, donos da própria vida e da
vida dos outros. Nas três esferas do poder público (executivo, legislativo e
judiciário) encontramos mulheres e homens que recebem altos salários, oriundos
dos cofres públicos, sabem muito bem que não passam de funcionários públicos,
portanto, deveriam estar a serviço do povo, mas comportam-se vergonhosamente,
fazendo o povo sofrer, esperar e, em muitos casos, morrer.
O Judiciário é lento e é estruturado
para continuar sendo. Inúmeros operadores do direito fazem de tudo para que a
justiça continue do jeito que está: absurdamente ineficaz. É também
tendencioso, julga de acordo com as pessoas, tratando os ricos de forma
diferenciada, acobertando seus crimes e perpetuando, assim, a impunidade. O executivo
é omisso ao deixar a população desassistida em seus direitos e garantias
fundamentais. Infelizmente, o povo sofre porque os direitos básicos não são
assegurados (direito à saúde, educação, moradia, alimentação, segurança, transporte
etc.). Estes e outros serviços são oferecidos de forma que para gozá-los as
pessoas sofrem, demasiadamente.
O legislativo também peca por omissão,
principalmente porque tem a tendência de legislar em causa própria,
beneficiando-se da prerrogativa da criação das leis, sendo que a maioria quando
não é injusta, infelizmente não é posta em prática, servindo apenas para compor
o denso ordenamento jurídico. No mundo da iniciativa privada encontramos os
empresários com suas corporações empresariais, sedentos de lucro e tendenciosos
quanto aos direitos de seus trabalhadores. As pessoas são lesadas em seus
direitos trabalhistas e também no que tange à prestação de serviços. Tudo concorre
para legitimar a exploração do homem pelo homem. Estas e tantas outras
situações e contextos estão bem representadas pelo juiz injusto da parábola
contada por Jesus.
A viúva
insistente
Em todos os tempos e lugares os
pobres enfrentam a má vontade e a ambição dos poderosos. A luta cotidiana pela
sobrevivência marca suas vidas. A esperança dos pobres é a mesma que guiou
Jesus na sua caminhada neste mundo. Unidos a Jesus, os pobres constroem o Reino
de Deus. Apesar do sofrimento, continuam firmes na caminhada. O Espírito do
Senhor é a força que não os abandona jamais. Por isso, são fortes e ousados. Este
auxílio divino se manifesta na simplicidade da vida que levam, nas palavras e
gestos de solidariedade. Somente eles sabem o que realmente significa a
solidariedade, pois os poderosos só conhecem e só podem conhecer o
assistencialismo viciado pelos interesses. A solidariedade praticada pelos pobres
é gratuita e verdadeira.
A união faz a força e as lutas dos
pobres para que a justiça prevaleça sobre a injustiça são provas claras dessa
verdade fundamental. Os ricos se unem para garantir seus privilégios e os
pobres se unem para lutar por justiça. Nunca se viu na história da humanidade
uma reunião de poderosos em prol da justiça. Toda reunião que congrega os
poderosos só tem um objetivo: pensar estratégias para evitar a própria ruína
porque o maior medo deles é chegar a ser pobres. Tais estratégias não respeitam
nem as pessoas, nem a natureza. Não há valor ético ou moral que impeça os
poderosos de agir em prol dos próprios interesses. Os EUA são a maior prova
disso: em nome de uma pseudodemocracia ceifam milhares de vidas humanas no
Oriente Médio e em outras partes do mundo. Na verdade, o que desejam são as
riquezas dos outros países, assim como a manutenção da hegemonia política. Querem
dominar o mundo!
A importância da
oração na luta por justiça
Na vida eclesial há várias formas
de oração, mas, de modo geral, ou a oração leva as pessoas a se afastarem do
mundo e, portanto, a alimentarem uma fé intimista, ou ocorre o contrário, a
oração é alimento para uma vida inserida no mundo. Inserir-se no mundo e viver
o seguimento de Jesus não é coisa fácil. Somente quem está unido a Jesus é
capaz de segui-lo. Isto parece óbvio, mas não é o que acontece em muitos casos.
Não chega a lugar nenhum o discípulo de Jesus que deseja segui-lo sem a experiência
da oração, pois é por meio desta que o seguimento torna-se possível.
O seguidor de Jesus não é um discípulo
de Aristóteles ou de Karl Rahner (grandes pensadores do mundo da Filosofia e
Teologia, respectivamente), mas do Deus que se encarnou no mundo em Jesus de
Nazaré. Seguir Jesus não é sucedê-lo na mera compreensão e exposição de suas
ideias. Este é um desafio para estudiosos e curiosos, que não desejam aderir ao
seu projeto. Seguir Jesus é, antes de tudo, encontrar-se com ele, fazer a experiência
do encontro que muda definitivamente a pessoa e a transforma em missionária da
palavra de Deus. Assim, a pessoa vai anunciar Jesus ao mundo a partir do
encontro que teve com ele, levando outras pessoas a vivenciar a mesma experiência.
A oração do missionário deve ser um
reavivamento do encontro realizado com Jesus. Todo momento de oração é momento
de encontro com ele, momento de confirmação, esclarecimento, reavivamento,
reabastecimento das energias e convicções, momento fundamental para a missão. Não
há missionário sem oração. A missão necessita de momentos de intimidade com
Deus no alto da montanha, mas é preciso ter cuidado para não cair na tentação
de permanecer na montanha, armando a tenda longe dos problemas da vida.
Neste sentido, a oração não é verdadeira
quando afasta as pessoas do mundo, alienando-as. Quando isso ocorre, não temos
oração, mas reunião de pessoas que buscam alimentar seus medos e egoísmos,
desabafar as angústias e livrar-se do estresse. Não passa de pura sessão terapêutica!
Portanto, a verdadeira oração impulsiona o missionário ao anúncio da palavra de
Deus, palavra que liberta integralmente o ser humano e o coloca no caminho de
Jesus, caminho da justiça do Reino de Deus.
Tiago de França
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