domingo, 10 de novembro de 2013

Ressurreição: realidade humana e espiritual

“Deus não é Deus dos mortos, mas dos vivos, pois todos vivem pra ele” (Lc 20, 38).

            O tema da ressurreição ocupa o centro da mensagem cristã. Não há Cristianismo sem fé na ressurreição. O que significa ressuscitar? Ressurreição não é reanimação de cadáver, como pensavam os saduceus que foram falar com Jesus (cf. Lc 20, 27 – 38) e como até hoje pensam muitos cristãos. A realidade da ressurreição é indescritível, ninguém sabe ao certo como acontece. Metaforicamente, arriscamos imagens e ideias, mas continua sendo um mistério. Portanto, todas as afirmações a respeito da ressurreição são aproximativas, pois não conseguem falar plenamente do mistério.

            Para entendermos a ressurreição precisamos olhar para Jesus, o Filho de Deus, primeiro a ressuscitar dentre os mortos. Ele mostrou que a ressurreição não é mera realidade pós-morte. Quando o discípulo se coloca no caminho de Jesus já começa a experimentar a realidade da ressurreição. Portanto, ressuscitar é estar em comunhão com Deus. Comunhão que ressuscita a pessoa para uma vida nova, transformada pela força do Espírito. A ressurreição é um mistério impulsionado pela ação amorosa do Espírito do Senhor.

            A ação do Espírito é silenciosa e gradativa, sem pressa alguma. A pessoa sente no seu cotidiano que há uma força que a conduz, encoraja, ilumina, torna a vida possível. A vida dessa pessoa é alegre e cheia de paz. Mesmo em meio às dificuldades e desafios, não há abatimento nem desespero, mas passo firme na direção de Deus. É algo tão misterioso que a pessoa já se sente naquela comunhão plena de que fala a escatologia. Há certa antecipação das alegrias celestiais. Essas pessoas que assim vivem são inabaláveis porque são movidas pela força divina. Elas já se desapegaram de tudo, inclusive de si mesmas. Deus, misteriosamente, as habita.

            Neste sentido, a ressurreição é uma experiência que antecede a morte e chega após esta à sua plenitude. Com a morte somos transformados em algo que no momento é indizível, algo que transcende a realidade humana. A este algo chamamos de ressurreição. Os que nesta vida estão unidos a Deus e esperam confiantemente nele são resgatados na morte para uma realidade nova. Em Jesus e na força do Espírito, a pessoa entra definitivamente na comunhão trinitária. É algo sublime, racionalmente inalcançável.

            Ter fé na ressurreição é colocar-se no caminho de Jesus. O caminho do calvário e a realidade da cruz antecedem à glória da ressurreição. Jesus entregou-se confiantemente a Deus, cumprindo sua vontade. As Escrituras atestam que sua fidelidade ao Pai o fez ressurgir da morte para a vida. Por meio de Jesus, Deus ressuscita a humanidade, concedendo-lhe vida plena. Não basta crer com a boca, mas é necessário fazer a experiência cotidiana da ressurreição.

            Quem acredita na ressurreição sabe que a vida não tem fim, que a morte é como que uma metamorfose, certa transubstanciação da realidade. Por isso, o discípulo de Jesus vai ao encontro da morte como seu Mestre: com a confiança que não será abandonado no túmulo. Quem acredita na ressurreição só conhecerá a morte do corpo, sabendo que este será transfigurado, transformado em algo eterno, assim como aconteceu com Jesus. É isso que Deus quer e é isto que Ele fará, pois é o que diz as Escrituras, palavra de Deus que não passa.

            A Igreja e o mundo de nossos dias carecem de mulheres e homens ressuscitados no Cristo Jesus: pessoas alegres, firmes, esperançosas, trabalhadoras, corajosas, audaciosas, simples, livres e de fé enraizada no testemunho da palavra de Deus. Há muito sofrimento no mundo, causado pelas diversas formas de violência e exploração. Os discípulos missionários de Jesus, iluminados pelo evangelho da vida e da liberdade, devem testemunhar a ressurreição de Jesus. Isto significa abraçar as grandes causas do Reino de Deus até as últimas consequências.

Nenhuma força deste mundo é superior à força da ressurreição e esta acontece por meio do suor e do sangue dos discípulos de Jesus, que são chamados a ser fermento, sal e luz em meio à desumanização que está acontecendo no mundo. E na parusia do Senhor, o grande dia da vitória sobre a morte, o Deus e Pai de Jesus fará justiça aos oprimidos e todos se sentarão à mesa de seu Reino. A festa vai ser bonita e sem fim, pois a vida, definitivamente, vai ser a realidade única. E Deus, Pai infinitamente amoroso e misericordioso, será tudo em todos. Enquanto este dia não chega, o Espírito consolador vai mantendo viva a nossa esperança e o caminho vai se tornando possível.


Tiago de França

Um comentário:

Marco Antonio Osório da Costa disse...

Mais um belíssimo artigo, meu amigo! Porque a ressurreição é exatamente isso; ela só acontece pela prática da fé. Como diz um meu outro grande amigo, "se a fé não faz diferença, que diferença faz ter fé?"