“Em
verdade, em verdade vos digo, eu sou a porta das ovelhas”
(Jo 10, 7).
Neste domingo do Dia das Mães, a Igreja Católica também celebra
o domingo do Bom Pastor e o texto evangélico proposto pela liturgia é o de Jo
10, 1 – 10. Nele, Jesus aparece como a porta das ovelhas. Vamos meditar o texto
à luz da fé no Cristo Ressuscitado e com os pés firmes no chão da vida.
Nossa
reflexão quer oferecer algumas provocações a respeito da espiritualidade do
Cristo Bom Pastor. Inevitavelmente, iremos nos dirigir não somente às ovelhas
como também aos pastores de nossas Igrejas. A celebração do domingo do Bom
Pastor é a celebração da vocação de todos aqueles e aquelas que atualizam na
própria vida os gestos e palavras de Jesus, o Senhor e Cristo.
Entrar
pela porta
Pastor é aquele
que entra pela porta, que chama as ovelhas pelo nome e as conduz e que caminha
à sua frente. Estas são as atitudes do pastor ensinadas por Jesus. O que
significa entrar pela porta? Quem é a porta? Jesus é a porta das ovelhas. Assim
como estas, o pastor também é chamado a entrar pela porta. Passar por Jesus
para chegar ao Pai.
Nas
Igrejas cristãs, os líderes religiosos apresentam-se como pastores. Na Igreja
Católica, no momento da ordenação presbiteral, o bispo afirma que o padre é
chamado a seguir o Bom Pastor, tornando-se pastor, sendo como Jesus. Portanto,
o padre é membro do povo de Deus e juntamente com o povo deve passar pela
porta. Não há uma porta para os pastores e outra para as ovelhas, mas somente
uma: a porta das ovelhas, e todos são chamados a passar por ela.
Entrar pela porta significa se tornar íntimo da pessoa de
Jesus, fazendo a experiência da ovelha que é conhecida pelo seu pastor. Os líderes
religiosos são ovelhas de Jesus e são chamados a escutar a sua voz. Líderes que
não escutam a voz do Pastor não conseguem ser bons pastores à imagem do Bom
Pastor. Facilmente, transformam-se em ladrões e assaltantes.
Nas
Igrejas, os pastores não possuem rebanho, pois este é de Jesus. Assim, se não
fazem a experiência de entrar pela porta acabam roubando, matando e destruindo
o rebanho de Jesus. Quando forem chamados à “prestação de contas”, o que
responderão ao Bom Pastor?... Os pastores não são donos das ovelhas, mas apenas
cuidadores de cada uma delas, especialmente aquelas mais frágeis e as que estão
dispersas. Pastores que não passam por Jesus são vazios, superficiais,
vaidosos, mentirosos, portanto, ladrões e assaltantes.
Jesus não deu a ninguém a sua missão de ser porta. Desse modo,
somente Ele é a porta. O papa, os bispos, os padres, os diáconos, os demais
líderes do povo de Deus não são a porta, mas devem conduzir à porta. Neste sentido,
estes líderes e os demais membros do povo de Deus são iguais, foram igualados
pelo Bom Pastor: todos devem passar pela porta das ovelhas. Nenhum líder
religioso deve se sentir mais importante do que os demais membros do povo de
Deus. É pura ilusão, engano e pecado.
Quando
dirige o seu olhar para a grande Assembleia do povo de Deus, Jesus enxerga as
ovelhas porque somente Ele é o Pastor. Não adianta o líder fazer sacrifícios,
evitando o pecado e mostrando-se piedoso: aos olhos de Jesus este líder é igual
às demais ovelhas do rebanho. No encontro definitivo com o Bom Pastor, não receberá
tratamento especial, pois é e sempre será uma simples ovelha do Senhor.
Chamar
as ovelhas pelo nome e as conduzir
Para chamar pelo
nome é preciso conhecer e para conhecer é preciso se aproximar, e para
aproximar-se é preciso deslocar-se. Este é o itinerário da pastoral. Nas comunidades
cristãs, geralmente, os pastores só se interessam em saber de alguns nomes e somente
estes são chamados.
Os
demais nomes desconhecidos, nunca são chamados. São os esquecidos da
comunidade, os que são excluídos do convívio fraterno. A isto chamamos acepção
de pessoas: a escolha de umas em detrimento de outras. Há um tratamento
desigual. Geralmente, os nomes das pessoas financeiramente ricas são mais
lembrados. Trata-se de uma mistura de acepção de pessoas com hipocrisia.
Conduzir significa cuidar e não tornar-se o guia da
comunidade. Somente um é o mestre e o guia: Jesus de Nazaré. O pastor cuida das
pessoas, dando-lhes atenção. A atenção é uma forma sublime de cuidado. Enxergar
o outro e tornar-se próximo. Aqui começa o exercício da misericórdia.
Pastores
que somente julgam, condenam, repreendem, tratam com gritos e ameaças, na
verdade, não são pastores, mas ladrões e assaltantes. Os pastores que passam
por Jesus são dóceis, acolhedores, compreensivos, mansos, humildes, cheios de
ternura e alegria. Os que passam por Jesus aprendem com Ele a serem
misericordiosos.
Nenhum
líder religioso recebeu de Jesus a missão de julgar e condenar as pessoas. Se assim
procedem, agem por conta própria, desviando-se da missão recebida. No encontro
definitivo com o Bom Pastor, como vão se justificar?... Certamente, haverá
choro e ranger de dentes!
Caminhar
à frente das ovelhas
Significa caminhar
junto com as pessoas, de mãos dadas a caminho do Pai. Junto com implica solidariedade
constante, jamais aparência de caridade. Jesus, a porta das ovelhas, caminhava
com as pessoas, experimentando suas alegrias e tristezas, angústias e
esperanças.
Os
pastores de nossas Igrejas precisam fazer a mesma experiência: caminhar com as
pessoas. Geralmente, o que ocorre é o seguinte: grande parte dos pastores se
encontra com as ovelhas no culto. Alguns nem as cumprimentam, simplesmente
presidem o culto e, posteriormente, desaparecem. Ninguém os vê mais! São fugitivos
que evitam as pessoas, negando-se à escuta e à atenção.
Presidem
o culto e retornam para a vida cômoda de suas residências. São funcionários do
altar, que depois de cumprida a obrigação, retornam ao conforto de seus
aposentos. Estes pastores são capazes de ir à frente das ovelhas,
conduzindo-as?... Dificilmente!
A
vocação de pastor nas Igrejas
Nos seminários,
onde se encontram os que se preparam para o exercício do ministério
presbiteral, há muitos que não se identificam com o Cristo Bom Pastor e o
motivo é claro: não querem servir, mas desejam se utilizar do ministério para
serem servidos.
Vale
recordar o que disse o papa Francisco, durante a homilia em uma missa na capela
da Casa Santa Marta, em Roma: “Na Igreja, há pessoas que seguem Jesus por
vaidade, sede de poder ou dinheiro; que o Senhor nos dê a graça de segui-lo
apenas por amor”. E fazendo a todos rir, completou: “Se
queres escalar o poder na Igreja, vá fazer alpinismo, é mais sadio!”
Infelizmente,
não é pequeno o número dos que escalam e dos que desejam escalar o poder na
Igreja. Não precisamos apresentar nenhum argumento para convencer o leitor de
que estes não são pastores do povo de Deus, mas são ladrões e assaltantes, pois
não entraram pela porta das ovelhas.
Seminaristas que almejam escalar o poder na Igreja
poderiam fazer um grande favor ao povo de Deus: regressar para suas casas e
procurar fazer outra coisa na vida. Basta de mercenários e mentirosos! O
ministério ordenado não deveria ser lugar para homens frustrados e medrosos,
que vivem fugindo do mundo e da vida.
A
Igreja não precisa de funcionários do altar, mas de pastores capazes de fazer a
experiência de Jesus: fazer com que todos tenham vida e a tenham em abundância!
Fora disso, jamais teremos uma Igreja pobre para os pobres. Na escalada do
poder não há lugar nem tempo para os pobres.
Enfim,
neste domingo dedicado à oração e reflexão sobre a vocação presbiteral e
consagrada, é preciso afirmar com clareza e objetividade: a Igreja precisa de
pastores com coração de carne, mansos, humildes e misericordiosos, capazes de
doar a própria vida no serviço ao Reino de Deus. Isto é o que Deus quer. Este é
o sentido do seguimento a Jesus de Nazaré, a porta por onde todos somos
chamados a passar e pela qual teremos acesso à vida plena.
E
sem nos esquecermos das mães, neste dia que também lhes é dedicado, é preciso lembrar,
em comunhão com Jesus, que todas são chamadas a ser, na família, na Igreja e na
sociedade, pastoras do povo de Deus, geradoras da vida e da liberdade, do amor
e da solidariedade. A maternidade é dom de Deus, é vocação e missão. É o
próprio Deus gerando a vida no mundo. Assim, ao assumir com responsabilidade e
coragem a maternidade, todas as mães participam da maternidade divina, vocação
sublime e gesto concreto e permanente de amor.
Tiago de França
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