quarta-feira, 10 de setembro de 2014

Dilma Rousseff do PT

        Por parte de algumas pessoas, foram violentas as reações aos nossos dois primeiros textos publicados, sobre as candidaturas de Aécio Neves do PSDB e Marina Silva do PSB. Infelizmente, boa parcela do povo brasileiro não foi habituada a discutir questões políticas com maturidade, liberdade, respeito e espírito crítico. Nas escolas, a política somente é mencionada em tempos eleitorais. Qual o resultado disso? Daí surge a violência nas discussões, provocada por pessoas apaixonadas que, ferrenhamente, defendem seus pontos de vista atacando quem pensa diferente.  

É verdade que não podemos falar em neutralidade na política, pois esta exige que tomemos posição com clareza e convicção. Os que almejam ocupar os postos da vida pública, quer no executivo, quer no legislativo, são pessoas que, como as demais, possuem suas virtudes e seus limites. Não nos interessa o que ocorre na vida privada dos candidatos e que não afeta a ordem constitucional. Nosso olhar se volta para o projeto que cada candidatura representa para o país. Isto, sim, não é somente de nosso interesse, como também deveria ser do interesse de todos. Portanto, não estamos nos remetendo à mera análise da personalidade, com o intuito de tecer elogios, mas nos detemos naqueles pontos críticos dos projetos que cada um apresenta.

            Quando o ex-presidente Lula concluiu seus dois mandatos, teve que escolher uma pessoa de sua confiança para uma possível candidatura pelo PT. A escolhida foi Dilma Rousseff. Esta representou uma grande novidade na vida política, e um dos motivos era visível: uma mulher candidatando-se, pelo PT, à presidência da República. Considerando a formação cultural e política do povo brasileiro, o ex-presidente Lula foi ousado ao escolher uma mulher para concorrer à presidência. Ele acreditou na ideia porque ele mesmo foi uma novidade chegando ao mesmo posto. Tratava-se de um nordestino de origem humilde, sem diploma universitário, filho do movimento sindical. Isto foi inédito na história do Brasil.

            A esperança do povo pobre, principalmente dos nordestinos, era a de que o presidente Lula iria resolver os problemas do Brasil. Suas propostas eram radicais. Eram, praticamente, as mesmas defendidas, atualmente, pela candidata Luciana Genro do PSOL. A simplicidade do presidente Lula encantava multidões. A classe média alta, a mídia neoliberal capitalista, encabeçada pela Rede Globo e os partidos PSDB e PFL (atual DEM) investiram pesado contra a candidatura do nordestino Luís Inácio Lula da Silva. Preconceitos, chavões e muitas piadas tentaram impor a cultura do medo. Afirmavam que, se eleito, o nordestino não chegaria a terminar, sequer, o primeiro mandato. E o que aconteceu? Aconteceu que o presidente Lula governou durante oito anos e ainda conseguiu eleger para mais quatro anos uma mulher como presidenta da República.

            Isto mudou a vida do povo brasileiro? Isto resolveu nossos gravíssimos problemas? Transformamo-nos em um país de primeiro mundo? Claro que não! Então, o que realmente representou a passagem de um ex-metalúrgico e de uma mulher na presidência da República Federativa do Brasil? Antes, é necessário refazermos as perguntas feitas. O que significa mudar a vida do povo brasileiro? De quem é a responsabilidade desta mudança? De que tipo de mudanças estamos falando? Quais os gravíssimos problemas do país e de quem é a responsabilidade para solucioná-los? Precisamos nos transformar em um país de primeiro mundo? O que é um país de primeiro mundo? Como vivem, atualmente, os povos dos países de primeiro mundo? Poucas pessoas fazem este tipo de pergunta. Pensá-las faz doer a cabeça!

            Os mandatos do presidente Lula e de Dilma foram marcados pelas denúncias de corrupção. Inúmeros políticos e pessoas da administração pública foram desmascarados, processados e muitos foram parar na cadeia. Como em outros casos, alguns processos e prisões precisariam ser revistos, pois também o poder judiciário no Brasil desrespeita o princípio da isonomia, mas nosso artigo não tem o objetivo de analisar esta questão. A corrupção nos governos de Lula e Dilma nos faz indagar: No Brasil, a corrupção na política se iniciou no governo Lula? Por que antes do governo Lula praticamente nenhum político era preso? Não havia corrupção? Tente o leitor responder, olhando a história republicana do país, com sinceridade, honestidade e verdade responder a estas perguntas.

            O leitor pode está pensando: “O autor deste artigo é petista e está querendo inocentar Lula e Dilma da responsabilidade pelos crimes praticados por petistas e pessoas da administração pública...” A procura pelo inocente e pelo culpado tem gerado grandes mazelas na política brasileira; mas, então, ninguém é responsável por nada? Boa pergunta. Considerando a veracidade dos fatos, pautada nas provas autênticas, quem foi condenado está respondendo pela sua conduta. Quem não foi condenado está livre e não pode responder por quem quer que seja. Ninguém pode ser responsabilizado pelo que não fez.

Em todas as relações interpessoais, assim como nas relações políticas, a confiança é quebrada. Há infidelidade em todo lugar. Os acontecimentos mostram, apesar da deturpação que a mídia faz dos fatos, que muitas pessoas sedentas de poder, prestígio e dinheiro, deixam de lado o bem comum e se aproveitam da coisa pública em benefício próprio. Em todo lugar é assim: na política, na religião, no mercado, na família, na educação etc. O que aconteceu nos governos Lula e Dilma? Pessoas receberam cargos de confiança por serem consideradas competentes para o ofício. Envolveram-se com atos ilícitos, foram descobertas e a justiça brasileira teve a liberdade para punir.

O poder judiciário agiu a seu modo, dentro dos seus limites constitucionais. Também nele houve quem se aproveitasse para fazer, a partir do seu ofício, o que é notoriamente um crime: a criminalização de pessoas e a midiatização dessa criminalização. Se houve condenação e punição aos verdadeiramente culpados, ótimo! É um dever do Estado, numa relação equilibrada entre os poderes, zelar pela manutenção e promoção dos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos. As denúncias e a apuração dos fatos foram passos significativos na democratização do país.

            As reformas política, agrária e tributária, assim como outras reformas necessárias ao autêntico progresso do país não foram feitas nos governos Lula e Dilma. É óbvio e nem precisaria mencionar, que também não foram feitas antes deles. Em relação a isto, para não cairmos na ilusão comum a tanta gente ingênua e ignorante em matéria política, precisamos fazer quatro perguntas fundamentais: Por que estas reformas não foram feitas antes da chegada do PT à presidência da República? Por que Lula e Dilma não as fizeram? A quem interessam estas reformas? Como e quem é responsável por realizá-las?  

Geralmente, os candidatos afirmam: “Nós vamos fazer a reforma política!” Boa proposta! Mas, quem é este “nós”? Como fazer reformas? Quem não compreende o funcionamento do sistema político alicerçado nos princípios democráticos, pensa que é o presidente da República que, sozinho, tem a responsabilidade de fazer todas as reformas necessárias ao país, assim como a de efetivar todo o plano de governo proposto na campanha eleitoral. A realidade mostra que não é assim. Quando qualquer candidato afirma que vai colocar a saúde, a educação, a segurança, enfim, o país nos trilhos, se expressa demagogicamente. 

Quando olhamos a história do Brasil, logo nos convencemos de que não se resolve em pouco tempo os gravíssimos problemas do país. É verdade que o tema das grandes reformas foi praticamente abandonado por Lula e Dilma. Apesar dos esforços, não há justificativas para tal abandono. Por outro lado, perguntamos: Com um Congresso Nacional composto por grupos de interesses e sedentos de poder, diante de um sistema econômico que somente visa o lucro, sem a cultura da participação popular, e com uma mídia neoliberal profundamente marcada pela demonização de pessoas e dos movimentos e governos populares, é possível fazer tais reformas?... Cremos que não!

As reformas precisam surgir com a participação das bases da sociedade e o povo precisa aprender a votar, escolhendo políticos que se identifiquem, de fato, com tais reformas. Aliás, mais do que identificação, precisam ser pessoas que tenham um histórico que demonstre real interesse pelo bem comum. Quem realmente se interessa pelo bem comum não se opõe às reformas de que o país precisa.

            Dilma é continuidade de Lula. Isto não é novidade. Pelo que parece, ela foi fiel ao estilo de governar de seu antecessor. Há entre eles uma sintonia que não se encontra facilmente entre pessoas da vida pública. Caso seja eleita, ainda será por causa dele. Isto significaria que o povo brasileiro continuaria acreditando no jeito petista de governar, que em muitos aspectos se assemelha ao do PSDB. Em quais aspectos? Nos que ocorrem a assimilação da política neoliberal. Neste sentido, os mais poderosos da nação ainda se identificam um pouco com Lula e Dilma porque ambos não questionaram nem ameaçaram com radicalidade os privilégios dos mais ricos dos brasileiros. Sem a reforma política, não ocorrem o questionamento e a ameaça aos poderosos do poder econômico.

            Assim sendo, se quiserem continuar querendo contribuir com a democracia e com o progresso do país, o PT precisa rever sua maneira de fazer política. Precisa voltar às origens, às fontes primitivas que geraram o partido. O cenário político é outro. Estamos no século XXI. Há outras demandas e em muitos aspectos a vida humana evoluiu. A política precisa acompanhar tudo isto para continuar sendo o instrumento necessário à vida humana.  

As políticas sociais são necessárias? Sim, inegavelmente. Elas fizeram o povo pobre viver melhor. Somente os pobres conhecem o sentido disso. Os de classe média criticam as cotas raciais, o bolsa família e os demais programas sociais porque não dependem deles. Há uma hipocrisia de fazer nojo em certas declarações. Pronunciam-se como se estivessem na Europa, que está praticamente falida em todos os aspectos da vida social. No fundo, qual a verdade embutida no discurso anti-política sociais? A verdade é que os mais ricos não gostam de ver os pobres vivendo melhor. O Brasil é marcado pela escravidão. Foram séculos de escravidão. No inconsciente coletivo ainda há a ideia de que pobre nasceu para viver na pobreza, servindo aos ricos.

Postos como os de juiz de direito, médico, engenheiro e todas as demais profissões consideradas mais importantes por darem maior visibilidade às pessoas sempre foram reservados aos ricos. E o caminho para se chegar a estes postos sempre foi visível: os filhos dos ricos estudavam nas escolas particulares (e ainda estudam!) e faziam vestibular nas universidades públicas, competindo com os que vinham de escolas públicas. Qual resultado? Os ricos chegando cada vez mais ao poder e os pobres continuando na servidão. Exemplo claro disso: no poder judiciário, a maioria dos juízes nasceu no seio de famílias ricas. Mantidos por estas, tiveram todo apoio necessário para se dedicarem exclusivamente aos estudos e serem aprovados nos concursos públicos, que estão cada vez mais difíceis.

 “Meu filho, estou com 80 anos, e até hoje nunca vi rico ter pena de pobre!”, me dizia uma senhora do Vale do Jequitinhonha, região mais pobre de Minas Gerais. É verdade que deve haver algum abastardo compassivo, que, pelo menos, estenda a mão para ajudar pontualmente algum pobre, mas, de modo geral, os ricos hostilizam, perseguem e procuram eliminar quem os ameaça em seus privilégios. Até certo ponto, os governos de Lula e Dilma representam esta ameaça. Poderiam ter sido mais radicais, mas a realidade exige cautela e prudência. Na política, para o bem do povo, não se pode fazer tudo o que se quer.

Caso seja reeleita, Dilma terá a oportunidade de continuar tentando fazer o que vem fazendo: dando a oportunidade para muitos brasileiros pobres a encontrarem seu lugar na sociedade, um lugar digno de ser humano, distante da servidão e do ostracismo social. Caso não seja reeleita, é o que também desejamos a quem vai se colocar como o legítimo representante do povo brasileiro na qualidade de presidente da República.

Tiago de França 

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