sábado, 4 de outubro de 2014

Os trabalhadores da vinha do Senhor

“Vós nunca lestes nas Escrituras: ‘A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular; isso foi feito pelo Senhor e é maravilhoso aos nossos olhos’? Por isso eu vos digo, o reino de Deus vos será tirado e será entregue a um povo que produzirá frutos” (Mt 21, 42 – 43).

            No texto evangélico a ser proclamado e meditado nas comunidades cristãs católicas neste domingo (cf. Mt 21, 33 – 43), Jesus continua se dirigindo à elite religiosa de seu tempo: sumos sacerdotes e anciãos do povo. Estes nunca se deram bem com Jesus porque não cuidavam da vinha do Senhor, mas estavam preocupados em satisfazer seus próprios interesses. Esta é a tentação que persegue os líderes religiosos de todos os tempos e lugares: o abandono da vinha do Senhor para buscar o poder, o prestígio e a riqueza. Jesus não se cansa de denunciar este gravíssimo pecado.

            Jesus conta uma parábola simples e de linguagem curiosa: a de um proprietário que plantou uma vinha e arrendou-a a vinhateiros. No tempo da colheita, envia seus empregados para receber os frutos. Os vinhateiros agarraram os empregados e os mataram. O dono das terras mandou outros empregados e estes foram assassinados da mesma forma. Por fim, pensando que iria ser diferente, o proprietário mandou seu próprio filho, mas este também foi assassinado. Aqui Jesus levanta uma pergunta, que a elite religiosa responde positivamente. Quando escuta a resposta, Jesus se dirige diretamente a eles, dizendo o que transcrevemos acima.

            A resposta de Jesus é atual e muito nos interessa. O proprietário da parábola é o próprio Deus e Pai de Jesus, mas precisamos fazer duas observações: a primeira se refere ao fato de que Deus passa longe da imagem de um poderoso latifundiário. Deus não é patrão de ninguém e nem possui empregados, mas é um Pai amoroso, que em Cristo Jesus nos acolhe como filhos e filhas. A segunda observação se refere ao fato de que Deus não usa de violência para perseguir e matar os vinhateiros que não foram fieis no cuidado com o que é seu. Estas observações são importantes para que não façamos uma imagem falsa de Deus.

            A vinha da parábola não é a Igreja católica, nem qualquer outra denominação religiosa. Mesmo que algum papa, bispo ou padre afirmem que Jesus está confiando sua vinha (a Igreja) nas mãos do clero (vinhateiros), isto não corresponde ao que Jesus quis dizer. Quando se dirige à elite religiosa, ele faz questão de dizer que a vinha é o Reino de Deus. No Antigo Testamento a vinha do Senhor era a casa de Israel, conforme nos fala o profeta Isaías (cf. Is 5, 7).

Em Cristo Jesus, a vinha é o Reino de Deus, e nossos irmãos judeus continuam fazendo parte dela. Mesmo que não aceitem Jesus como Filho de Deus e salvador da humanidade, a vinha pertence ao Pai de Jesus, que é o Deus de Israel. A Igreja católica, portanto, assim como as demais denominações religiosas são chamadas a se colocarem a serviço da vinha do Senhor. Essa maneira de pensar e enxergar a realidade facilita o ecumenismo (diálogo entre as Igrejas cristãs) e o diálogo inter-religioso (entre as religiões); do contrário, ambos os diálogos não são possíveis.

            A advertência de Jesus é direta, clara e objetiva: “Por isso eu vos digo, o reino de Deus vos será tirado e será entregue a um povo que produzirá frutos”. Os líderes religiosos são chamados a produzirem frutos na vinha do Senhor. Os frutos do Reino de Deus são justiça e paz para todos. No Reino, a promoção da justiça e da paz parte das lutas dos pequenos e marginalizados. Cuidar da vinha é cuidar das pessoas com amor, justiça e atenção. Na Igreja católica, significa fazer a opção pelos pobres, afetiva e efetivamente.

            Tanto na história do povo de Israel quanto na história da Igreja, apareceram os profetas, que foram enviados com a missão de lembrar a necessidade do cuidado com a vinha do Senhor. Por denunciarem o abandono da vinha, estes profetas foram incompreendidos, perseguidos e mortos. Na parábola contada por Jesus, os empregados do proprietário são os profetas.

Quando chegou no tempo devido, Deus enviou seu próprio Filho unigênito, que experimentou a mesma sorte dos profetas. Até nossos dias, os vinhateiros da vinha do Senhor continuam perseguindo e matando inúmeros profetas. Quando estes não são assassinados, infelizmente, são maltratados e expulsos, como ocorreu com o profeta Amós, no Antigo Testamento, que foi expulso de Israel do Norte porque estava anunciando a Boa Nova de Deus junto ao santuário de Betel (cf. Amós 7, 10 – 15).

            A profecia sobrevive a duras penas no interior das Igrejas cristãs porque estas tendem a priorizar o fator institucional em detrimento do carisma. A instituição sempre visa o poder e a influência sobre as pessoas, enquanto que o carisma visa o serviço a elas. Trata-se de uma tensão constante. Os profetas não se apegam à instituição, mesmo estando dentro delas. O Espírito que os guia trabalha para que permaneçam sensíveis às grandes causas do Reino. Os profetas não exercem sua missão em função da salvação de instituições religiosas, mas anunciam a Boa Nova do Reino para que este se torne realidade no mundo.  

Hoje, os profetas continuam incomodando, e seu grito é simples e verdadeiro: Os líderes religiosos precisam colocar o evangelho no centro de sua vida e missão; do contrário, o Reino lhes será tirado. Todos os que são batizados e se tornam discípulos de Jesus precisam escutar essa mesma advertência. A conversão é necessária e, portanto, essencial, e deve ser procurada enquanto há tempo. Acontece no caminho de Jesus. Por isso, é preciso nele se colocar e perseverar.

            Neste domingo, 5 de outubro, teremos eleições. Os brasileiros irão eleger seus representantes, que são chamados a cuidar da coisa pública, visando o bem comum. Neste sentido, o eleitor deve votar também visando o bem comum, não se deixando levar pelo voto egoísta, consistindo naquele voto em função do bem-estar de algumas pessoas e grupos. Devemos votar pensando no bem de todos, especialmente dos que precisam, necessariamente, dos serviços públicos que o Estado tem obrigação de assegurar. Votar conscientemente é uma atitude cristã, pois a boa política é útil e necessária à edificação do Reino de Deus.

Tiago de França

Obs: Acompanha este artigo a foto do Pe. Alfredinho Cunz (Suíça, 1920 - Brasil, 2000), missionário pobre, santo profeta de Deus entre os pobres. Na foto está com uma garotinha chamada Saara, em Crateús - CE, onde viu por muitos anos.

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