sábado, 6 de dezembro de 2014

Chamados à conversão

“O que nós esperamos, de acordo com a sua promessa, são novos céus e uma nova terra, onde habitará a justiça” (2 Pd 3, 13).

            Apareceu no deserto aquele que foi enviado por Deus para preparar o caminho de Jesus, o Messias. Seu nome é João Batista. O deserto é o lugar da escuta e da revelação, da intimidade e da contemplação, da provação e da conversão. O precursor do Messias Jesus é um homem do deserto: ungido pelo Espírito e experimentado, livre porque viveu na humildade e na simplicidade. Seu estilo de vida revela a maneira como o cristão deve preparar o coração para acolher Jesus.

            O deserto também é o lugar da tentação. Jesus viveu a experiência do deserto, e nela aprendeu que o ser humano é fraco. A condição humana é frágil. Toda pessoa está exposta à fraqueza. Conscientes de nossa fragilidade não ousamos apontar o dedo contra ninguém. Nossa acusação é inválida e pecaminosa. Todos, sem exceção, estamos encerrados na finitude. Somos irmãos na fragilidade para sermos resgatados por Aquele que não nos abandona jamais.

            A experiência do deserto é uma experiência de secura e de aridez. Nela experimentamos crises, ao mesmo tempo em que temos a feliz oportunidade para a mudança de vida. Os que permanecem acordados e atentos, portanto, vigilantes, de fato, conseguem passar pela provação para ser aquilo que Deus quer: pessoas livres e vigilantes, experimentadas no caminho de Jesus. É isto que Deus quer: nossa liberdade.

            A humildade do profeta João nos convida ao reconhecimento de nossos limites, fraquezas e pecados. Reconhecer-se pecador: eis o início do caminho da mudança de vida, da conversão. Quem não dar uma pausa para mergulhar no mais profundo de si mesmo é incapaz de reconhecer-se pecador.  

Isto significa que precisamos conhecer nosso interior, nossos abismos. Como São João da Cruz ensinava, é preciso passar pela “noite escura” para nela encontrar-se com Jesus. Ele vem a nós caminhando sobre as águas, na escuridão da madrugada, quando estamos perturbados no frágil barco agitado pelas ondas do mar da vida, que tendem a nos afogar.

            Para ser irmão do outro é imprescindível passar por este movimento humano e espiritual de autoconhecimento e de reconhecimento das próprias fraquezas. É aí que tomamos consciência de que, realmente, não somos melhores nem piores, mas somos igualmente pessoas e irmãos no Cristo Jesus.

A partir daí o pecado do outro deixa de nos interessar. Além disso, tal consciência nos enche de compaixão e nos move na direção do outro, para ajudá-lo em suas lutas por libertação. Desse modo, perdemos aquela infeliz disposição para a acusação do outro. Por que acusar e condenar meu irmão, se sou pecador como ele? É a pergunta que surge em quem tem consciência das próprias fraquezas. A ausência desta consciência nos faz cair, constantemente, na tentação de vivermos condenando o outro.

            Conta-nos o evangelista Marcos (1, 1 – 8), que as pessoas procuravam o profeta João para confessarem seus pecados e serem batizadas por ele. O profeta as preparava para a chegada de Jesus, o Messias, que batiza com o Espírito Santo. Hoje, o discípulo missionário de Jesus é chamado a fazer o mesmo: confessar seus pecados e ser batizado com o Espírito.

Confessar os pecados é mais do que receber o sacramento da reconciliação (para os católicos), mas é, sobretudo, aderir a uma atitude permanente, sendo humilde diante do outro e diante da vida, despojando-se do espírito de superioridade, prepotência e arrogância. Não adianta confessar o pecado sem um arrependimento sincero e humilde.  

            Nossas Igrejas cristãs precisam continuar a missão do profeta João por meio do anúncio da Boa Notícia do Reino e da denúncia das injustiças que assolam a humanidade. Cada batizado em nome da Trindade é chamado a ser como João: ser mensageiro de Deus, na humildade e na simplicidade, em um mundo marcado pela discórdia e pelas injustiças.  

Esta missão se inicia com a confissão humilde de nossas faltas, passando pela adesão à mensagem de Jesus e terminando na missão no meio do mundo. Não são etapas separadas, mas um movimento único que acontece no cotidiano da vida sob a direção e na força do Espírito.


Tiago de França

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