sábado, 7 de março de 2015

Jesus, o templo e a falsa religião

“Não façais da casa de meu Pai uma casa de comércio!” (Jo 2, 16).

            O templo é símbolo da religião. Para o povo judeu é o lugar da morada de Deus. Portanto, lugar sagrado, digno de veneração e respeito. Deve-se ter zelo pela Casa do Senhor, pois nela os crentes o adoram. Esta era a mentalidade e a regra. Todo crente tinha que ir ao templo porque assim Deus o quis. Jesus, na passagem do evangelista João (cf. 2, 13 – 25), surpreende a todos: aparece com um chicote de cordas, expulsando os comerciantes do templo. Para quem está acostumado com a imagem de um Cristo manso e cheio de ternura, Jesus com chicote nas mãos parece ser um pouco assustador; mas foi isto que aconteceu, segundo o relato unânime dos evangelistas.

            Os comerciantes do templo representam, hoje, todos aqueles que se utilizam do nome de Deus e da religião para explorar as pessoas. Infelizmente, precisamos ter a humildade para admitir que em todas as Igrejas cristãs podemos encontrá-las. Isto não constitui nenhuma novidade. Facilmente, ganha-se muito dinheiro, prestígio e poder em nome de Deus. Esta vergonhosa exploração religiosa é, sem dúvida alguma, uma das formas de violência que atingem o ser humano e, pelo que se vê, é das mais perigosas. A atitude enérgica de Jesus mostra que não se trata de um problema novo. Ele teve que lidar com a exploração religiosa que ocorria no Judaísmo de sua época.

            Transformar os templos religiosos em centros de comércio é um pecado gravíssimo. Hoje, assistimos a negócios em nome da fé, no interior de nossas Igrejas. Prega-se um Deus fonte de bens, que exige dinheiro para operar milagres e bênçãos. As pessoas são chamadas a investirem na fé. Quanto maior o investimento, maior é o resultado. Deus está ligado à prosperidade. Crer nele é crer na prosperidade da própria vida. Toda sorte de bens e milagres vem da bondade de Deus, mas para ele agir é necessário dar-lhe o que lhe pertence, ou seja, dízimos e ofertas generosas. Como o dinheiro que circula nas Igrejas não é passível de fiscalização por parte do governo, então o enriquecimento ilícito se torna cada vez mais uma prática comum.

            Para isto, busca-se construir templos cada vez mais luxuosos, que custam dezenas e centenas de milhões de reais. Enquanto muita gente morre de fome no mundo, muitas de nossas Igrejas estão preocupadas com a construção e manutenção de templos luxuosos. A justificativa é conhecida por todos: Dar a Deus o melhor. Ele é o Senhor. O objetivo é acolher o maior número de pessoas para “evangelizá-las”.

Na verdade, o que está por trás da citação insistente e fervorosa de textos bíblicos rigorosamente escolhidos para tal fim é a sede de poder, de prestígio e de dinheiro. Para onde vai este dinheiro? Certamente não vai para os pobres, pois são estes que, na maioria das vezes, levam seu suado dinheiro para depositarem nos cofres destes templos. A maioria do dinheiro arrecadado vai parar nas contas bancárias de muitos líderes religiosos. A outra parte serve para investir na construção e manutenção dos templos, assim como no marketing religioso.

            Este comércio da fé merece o chicote da denúncia porque é o oposto daquilo que Jesus pediu. Não encontramos nos relatos evangélicos nenhuma recomendação de Jesus para a edificação de templos religiosos. É verdade que ele frequentou o templo de Jerusalém e as sinagogas de algumas cidades, mas é verdade também que reprovou, com chicote nas mãos, a exploração religiosa que acontecia nestes lugares. Hoje, assistimos a uma preocupação exagerada, por parte de muitos líderes religiosos, no que se refere à construção e manutenção de templos. Investe-se muito dinheiro em ouro, prata, mármores etc. e, muitas vezes, se esquece da caridade evangélica para com os pobres. Geralmente, os pobres não frequentam templos luxuosos. Podem até contribuir para a construção e manutenção, mas lá não aparecem.

            Por fim, é preciso considerar, a partir deste relato joanino, um ensinamento fundamental para o Cristianismo: Os templos religiosos não podem ocupar o centro da vida das comunidades cristãs. Segundo os evangelistas, na maioria dos casos, Jesus se encontrava com as pessoas nas casas, ruas, praças, beira de caminho, praias e campos. Nestes lugares se encontrava com os pecadores públicos, excluídos e condenados pela sociedade e pela religião da época.

Aqui faço memória de um testemunho evangélico que entrou para a história da Igreja no Brasil: Alfredinho, padre missionário suíço que morou na periferia de Crateús – CE e, posteriormente, na favela Lamartine, em Santo André – SP. Viveu e morreu com o povo de rua. Encontrou-se com Jesus na pessoa dos pobres sofredores. Testemunha da ressurreição de Jesus, mostrou com a própria vida que a pregação do evangelho acontece mais no meio do povo, na simplicidade da vida cotidiana.

Por isso, as grandes e solenes liturgias de muitos templos religiosos, desligadas do cotidiano da vida do povo de Deus, são vazias e sem nenhum significado. Certamente, causam bem-estar e alegria passageira, mas permanecem longe daquilo que Jesus pediu. Oremos em nossos templos sem nos esquecermos de que a missão do cristão acontece fora dele, no encontro com Jesus na pessoa do outro. Este costuma ser sempre o desconhecido, o homem caído no caminho de Jerusalém, vítima dos assaltos da vida, à espera de socorro, com suas feridas abertas. O que estamos fazendo quando nos deparamos com as feridas abertas do outro?... Não adianta ir orar por ele no templo, pois suas feridas continuarão abertas.


Tiago de França

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