sábado, 26 de dezembro de 2015

Família: Lugar de encontro com Deus

“Vós sois amados por Deus, sois os seus santos eleitos. Por isso, revesti-vos de sincera misericórdia, bondade, humildade, mansidão e paciência, suportando-vos uns aos outros e perdoando-vos mutuamente se um tiver queixa contra o outro” (Cl 3, 12 – 13).

            A família é chamada a ser um dos lugares de encontro com Deus. Para que haja esse encontro, é necessário que haja abertura ao outro. No seio de nossas famílias há esta abertura? Somos, de fato, capazes de compreender os limites de nossos parentes? Acolhemo-nos, mutuamente, ou vivemos, continuamente, condenando-nos uns aos outros? Quando escreve aos Colossenses, o apóstolo Paulo nos fala do amor de Deus: Somos amados por Deus. Abrindo-nos a este amor, nos unimos a Deus e agimos como Ele: Somos revestidos pela santidade de Deus.

            Segundo o evangelho, Jesus pertencia a uma família. Deus não quis enviar seu Filho a este mundo, descendo através das nuvens. Em outras palavras, Jesus não apareceu do nada, mas assumiu a condição humana, nascendo do ventre materno, como os demais homens. Jesus é filho de família humana e viveu no contexto familiar marcado pelos valores da tradição judaica. O evangelho fala que Jesus foi um filho obediente, porém não preso à família (cf. Lc 2, 41 – 52). O vínculo familiar não tirou a sua liberdade. Na verdade, Jesus fez parte da grande família humana, cujo Pai é Deus.

            Eis outro ensinamento que se apresenta às nossas famílias: Abertura não somente para os de casa, mas, inclusive, para o mundo, para a sociedade. A família não deve se transformar em um gueto, num grupo isolado, pois assim não sobrevive. Quando bem estruturada porque alicerçada em valores fundamentais, a família torna-se, de fato, a base da sociedade. É comum escutarmos a famosa sentença de que quando a família vai mal, a sociedade também sofre. Realmente, se olharmos bem para a sociedade brasileira, não teremos nenhuma dificuldade para constatarmos que vivemos mergulhados numa crise de valores.

            Em parceria com o Estado, com as Igrejas e com a Escola, a família não pode se omitir diante da situação na qual está profundamente atingida. Novas formas de entidade familiar estão surgindo, assim como novas formas de conflitos e modismos. O que fazer diante desta realidade complexa e desafiadora? A realidade tem mostrado, claramente, que a criminalização e a condenação das pessoas não constituem solução.  

Infelizmente, a discriminação, a criminalização e a condenação das pessoas tem, vergonhosamente, ocorrido com frequência. É de causar indignação os atos de intolerância e tantas outras formas de violência contra casais homoafetivos, noticiados diariamente nos jornais. Somos um povo marcado pela intolerância, preconceito e homofobia. E o mais absurdo é que, em muitos casos, os intolerantes, os preconceituosos e os homofóbicos agem em nome de Deus, como se fossem soldados de Cristo que combatem o mal, sendo que, na verdade, são agentes de Satanás, que visam, em nome de um discurso religioso tradicional, destruir as pessoas.

Todas as famílias são abençoadas por Deus. Nenhuma delas está excluída do projeto salvador de Deus. Em Deus não há exclusão de pessoas porque estas são suas filhas. Na religião existe condenação, mas não em Deus. Os homens criam leis e sentenças, julgam, absolvem e condenam, mas Deus, que é puro amor, não age nos moldes humanos. E, além disso, Deus não deu a homem nenhum o poder e a autoridade para julgar e condenar pessoas em seu nome. Por isso, os pais e mães devem ensinar aos filhos a verdadeira imagem de Deus: A imagem de um Deus misericordioso. Se a crença em Deus não passar pelo cultivo da misericórdia, facilmente os crentes caem na tentação de viver julgando e condenando as pessoas.

Hoje, a família precisa urgentemente resgatar o valor que as edifica e sustenta, sem o qual não sobrevive: O amor. Quando não há amor, a família vive de aparência. A falta de amor deixa a família totalmente vulnerável e sem vida. Quando o amor está presente, a alegria também se faz presente. A tristeza, as intrigas, o julgamento e a condenação do outro, os olhares sombrios, a falta de sentido; enfim, tantos outros males estão nas famílias que desprezam o verdadeiro amor.

Na verdade, aí já não há mais família, mas uma justaposição de pessoas, que sobrevivem em um ambiente hostil e, portanto, insuportável. Não há pureza, mas puritanismo; não há moral, mas moralismo; não há fé, mas descrença; não há reta intenção, mas malícia; não há paz, mas desordem e toda espécie de energia negativa. Somente o amor é capaz de libertar os núcleos familiares que se encontram nesta triste situação. E não adianta somente rezar pelas famílias, mas é preciso tomar atitudes libertadoras, impulsionadas pelo amor e para o amor.


Tiago de França

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