segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

A conversão do apóstolo Paulo

“O Deus dos nossos antepassados escolheu-te para conheceres a sua vontade, veres o Justo e ouvires a sua própria voz. Porque tu serás a sua testemunha diante de todos os homens, daquilo que viste e ouviste” (At 22, 14 – 15).

            Paulo de Tarso era homem culto, educado na escola de Gamaliel. Foi instruído no rigor da Lei. Aprovado pelo Sumo Sacerdote e conselho de anciãos, foi orientado a perseguir os cristãos, seguidores do Caminho. Dirigindo-se a Damasco se encontrou com Jesus, e este mudou radicalmente a sua vida (cf. At 22, 3 – 16). De perseguidor a missionário, tornou-se um dos maiores anunciadores do evangelho de Jesus, reconhecido por todos como ungido de Deus e fundador de comunidades cristãs que constituíram a Igreja Primitiva. Vamos meditar a vocação deste grande homem, procurando compreender as palavras de Ananias, homem piedoso e fiel à Lei, que o esperava em Damasco, conforme orientação do próprio Cristo Jesus.

            O Deus que o chamou foi “O Deus dos nossos antepassados”, Pai de Jesus e nosso Deus. Não foi um homem que o escolheu, mas o próprio Deus. E a escolha foi para o conhecimento da vontade divina. Eis, portanto, nossa vocação primeira: Conhecer a vontade de Deus. Este conhecimento está acima de qualquer outro e constitui a garantia plena da felicidade e da salvação do gênero humano. Paulo também foi escolhido para ver Jesus e ouvir a sua voz. Ver e escutar Jesus são atitudes que visam conhecê-lo, tal como ele é. Conhecer, ver e ouvir: Eis as ações que todo discípulo deve ter para ser enviado em missão. Mas como e onde isto ocorre? Ocorre dentro de nossos templos? Conhecemos, vemos e ouvimos Jesus em nossas faculdades de teologia? Vamos pensar um pouco.

            O como ocorre é ação do Espírito: Ocorre de forma dinâmica, livre e espontânea. Não há um manual que ensine a conhecer, ver e ouvir Jesus. Tudo ocorre no movimento da vida. No cotidiano despojado da vida dos pobres se manifestam o conhecimento e a visão de Jesus. É a realidade da vida que fala de Jesus, e é por meio dela que ele nos fala; especialmente nos dirige sua palavra através do clamor das vítimas deste mundo. Estas nos falam de Jesus porque estão com ele na cruz, participando de sua paixão dolorosa e redentora. Também na vida contemplativa, os místicos conhecem, veem e escutam Jesus. Eles fazem a mesma experiência quando vivem a experiência mística em meio ao barulho deste mundo. Há místicos dentro e fora da clausura. Entre eles não há graus de importância, pois a experiência se mede pela entrega do místico ao mistério de Deus.

            Inicialmente, o apóstolo Paulo se encontrou com Jesus, ouviu a sua voz, mas não conseguiu vê-lo, pois a experiência sensível o impediu de fazê-lo: Jesus apareceu como que em forma de uma luz forte. O mais importante do encontro não foi exatamente a forma como Jesus apareceu, mas a escolha divina que o elegeu à vida apostólica. Na vida dos escolhidos e eleitos por Deus os sinais sensíveis que atestam a sua presença são poucos. São sinais que apontam para o mistério maior. Não podem ser buscados nem provocados em vista da vaidade humana, mas acolhidos na humildade e na discrição, para a edificação da vida espiritual, em vista de uma união cada vez mais clara e convicta com Deus.

            Um exemplo que atesta a presença de Deus na vida de seus escolhidos e eleitos: a perfeita alegria (expressão de São Francisco de Assis). Não há palavras que possam dizer com precisão o sentido deste sinal amoroso de Deus. Sabe-se que se trata de uma alegria que não passa, que não é dada por este mundo, que pode ser experimentada já nesta vida e que perdura para a vida eterna. Quem a sente experimenta a verdadeira paz e ninguém consegue tirá-la, porque é fruto da graça divina, da ação do Espírito. O que o Espírito dá ninguém tira. Jesus a experimentou e a transmitiu a seus discípulos por meio do sopro do Espírito que sonda todas as coisas. Os escritos paulinos também comprovam a mesma coisa: também ele experimentou a perfeita alegria.

            Por que conhecer, ver e escutar Jesus? Ananias responde: Porque tu serás a sua testemunha diante de todos os homens, daquilo que viste e ouviste. Ser testemunha de Jesus diante dos homens: Esta é a razão por excelência do conhecimento, da visão e da escuta de Jesus. Ser testemunha de Jesus é colocar-se em seu caminho e nele perseverar. Permanecer fiel ao que foi visto e escutado, partilhar com os irmãos e irmãs a beleza da escolha e eleição divinas. Partilhar com os irmãos e irmãs o mistério de Deus, que se revela em seu amor infinito e incondicional pela humanidade. Essa partilha cria fraternidade e renova toda a face da terra, transformando-a naquilo que Deus quer: Em um Reino de justiça e paz para todos.

            Paulo foi uma fiel testemunha do Cristo ressuscitado diante dos homens: Encontrou-se com Jesus, o conheceu de perto, o viu na carne sofrida de seus irmãos e irmãs, o escutou no clamor das vítimas de seu tempo. Deus o escolheu e o ungiu para a missão, concedendo-lhe o dom da palavra que revela a ação de Deus no mundo. Seus escritos falam de sua intimidade com Jesus, da sabedoria divina revelada na cruz de Cristo e da esperança que nos motiva a seguir adiante, construindo o Reino de Deus. As cartas paulinas são uma tradução do evangelho de Cristo, uma releitura fiel e eficaz da mensagem de Jesus para que surja no mundo uma humanidade nova.

            Com o apóstolo Paulo, homem convertido a Jesus, a Igreja é convidada a se colocar numa atitude de escuta amorosa, de serviço permanente aos pobres da terra. Desse modo, transformar-se-á numa testemunha fiel, humilde e servidora, de Jesus de Nazaré. Despojando-se das pretensões e/ou ambições mundanas, a Igreja fortalecerá a esperança dos pobres, a fim de que o Reino de Deus apareça na história.  

Alimentados pela esperança, pelo amor e pela fé, orientados pelo conhecimento da vontade divina, reconhecemos que o projeto de Deus vai transformando este mundo, atualmente tão marcado pelo derramamento de sangue dos inocentes e fracos. Responder a este convite é missão da Igreja, comunidade dos crentes em marcha, rumo à plena libertação. Que o Espírito que guiou Jesus e Paulo na missão nos mantenha firmes e fieis a este santo propósito.


Tiago de França

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