sábado, 27 de fevereiro de 2016

A fecundidade espiritual

       
          Em nós, Deus é semelhante a uma criança graciosa, que nos conquista com seu sorriso. Um sorriso doce, de uma alegria profundamente verdadeira. Sorriso que vem acompanhado de um olhar conquistador, suave, sereno, leve, que diz:

- Vem, não precisas ter medo. Levanta-te da tua fraqueza. Segura na minha mão. Confia. Vem, companheiro, vamos à Ceia. Alimenta-te. Repousa na suavidade da minha força. Recebe-a. Olha as águas, elas se agitam. São águas, somente isso. Não matam, só amedrontam. Repousa teu coração junto ao meu. Vem... (dos colóquios espirituais, arquivo pessoal).

            Deus está lá no mais profundo de nós. Ele deseja cuidar de cada um de nós, alimentando-nos com a sua palavra. A sua palavra é fonte de toda força, de um consolo extraordinário. Seu coração é generoso e fala ao nosso coração. Ele vibra em nossas entranhas, nos preenche, fazendo-nos renascer. Com Ele, o deserto é fértil. Tudo se recria, se renova. Unidos a Ele estamos seguros, aquecidos e protegidos. Estamos na luz.

            Ele nos eleva, fazendo-nos conhecer a nossa verdadeira dignidade, a de filhos escolhidos e amados. Ele nos escolhe para o amor. Quando nos tornamos íntimos dele, tudo ganha cor, perfume, luz, orientação, sentido. Nele, os pingos da chuva, o calor do sol, o frio do chão, o verde das folhas, toda a natureza, nos faz integrados no amor. Os desenrolar dos fatos e a evolução da história, suas idas e vindas, altos e baixos, tudo é graça, nada se instaura no acaso. Ele está em todas as coisas.

            Separados dele, somos como figueiras infrutíferas, secas. A secura da falta de vida, falta de amor. A falta de amor é a pior de todas as ausências, de todas as secas, é o deserto sem o olhar divino, sem o cuidado dos anjos. É a morte interior. Homens e mulheres cadáveres são os que já faleceram interiormente. A estes, a misericórdia divina aparece como uma chuva fina e duradoura, insistindo em fecundar o chão, na firme esperança de que as raízes da figueira consigam beber da força da ressurreição.

            Apegados às vaidades das vaidades, na busca da satisfação dos prazeres desenfreados, nos apegos aos bens que clamam pelo consumo, tomados pelo ódio e por tantos sentimentos que destroem e conduzem à morte... assim, muitos de nossos irmãos seguem agonizando... São como Caim após ter matado seu irmão Abel: Vivem errantes no meio do mundo, perseguidos pelo desassossego, por uma inquietação interior, pelo vazio existencial... Caso não encontrem o Deus da vida no percurso da existência na carne, morrerão sem ter conhecido a vida que pensaram ter vivido...

            Apesar disso, Deus, Pai de misericórdia, é incansável no chamado: Ele não se cansa de nos chamar e de nos amar. Ele nos criou para vivermos eternamente unidos a Ele no amor. Quando nos alcança, conquista-nos para sempre. Quando o seu amor permanece em nós, a nossa vida se transforma na Sua vida. E os sinais da Sua presença em nós é evidente: “Vejam como ele se amam!”, dirão os que enxergam Deus em nós. Quem se deixa encontrar-se por Deus conhece a verdadeira felicidade: A felicidade de um amor que não deixa faltar absolutamente nada. É pura graça, verdadeira alegria e paz. Graça, alegria e paz que permanecem para toda a vida e nos fazem mergulhar, desde já, no mistério da vida eterna.


Tiago de França

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