sábado, 11 de novembro de 2017

Acordar para a vida

     
        A fé cristã nos chama à vida. Trata-se de um chamado à vida em plenitude. Viver de qualquer jeito é desperdiçar a vida, e quem vive no desperdício perde a oportunidade de viver plenamente. O que significa desperdiçar a vida? Significa viver na superfície, sem o necessário mergulho no mais profundo de si mesmo. Sem este mergulho não há autoconhecimento, e sem este não há conteúdo, mas superficialidade. O mundo atual nos chama à superficialidade e à futilidade. Muito facilmente, encontramos pessoas superficiais e fúteis, que vivem ocupadas com o nada fazer. Estas pessoas vivem dormindo. Não vivem, mas passam pela vida.

        Quem realmente conhece o sentido, o valor e o conteúdo da vida, vive acordado. Viver acordado significa experimentar a vida como ela é, sem fugas, sem desculpas, sem mesquinhez. A vida é sinônimo de alegria, generosidade, doação, movimento, relação com o outro, dinamismo, potência. Por si mesma, a vida é bela e se multiplica, é simples e verdadeira, é uma teia de possibilidades. Viver é bom, e somente conhece a bondade da vida aqueles que ousam viver, libertando-se do egoísmo e da mesquinhez. Quem realmente vive não perde tempo com os entraves da vida, não fica parado no caminho. A vida é como um pássaro livre, leve e solto. O pássaro é uma ave que nos ensina a liberdade de viver.

        As preocupações, as ambições, os interesses, a mentira, a aparência, a descartabilidade, a sede de dinheiro e de poder, e tantos outros entraves, tiram a alegria de viver de muita gente. Muita gente vive triste, abatido, ansioso, depressivo, desmotivado, portanto, sem sentido para viver porque se deixam travar, permitem-se amarrar pelos entraves da vida. Por si mesma, a vida tem um poder muito forte. Nada nem ninguém consegue controlar o impulso da vida. Todos aqueles que conseguem enxergar e compreender o poder da vida, jamais se deixam abater pelos impulsos de morte. É possível que em meio às tempestades da vida, a pessoa possa caminhar, firme e perseverante, de olhos fixos no horizonte, com a plena consciência de que tudo é transitório, tudo flui, tudo passa.

        Acordar para a vida é permitir que a vida se manifeste, é deixar viver. Os entraves tendem a não permitir que a vida flua. A vida de todo ser vivo: as pessoas, os animais e as plantas, enfim, todo organismo vivo, aparece e se manifesta porque quer viver. Assim, precisamos recuperar o respeito e a reverência pela vontade de viver e de deixar que tudo o que é vivo, de fato, viva. Isso significa que não podemos nos transformar em entraves na vida dos outros seres vivos.

Nossa missão é de fazer com que a vida continue fazendo o que lhe é peculiar: multiplique-se! Enxergar esta realidade é permanecer acordado. A vida não pode passar despercebida. Não percamos a oportunidade de viver e fazer a vida viver! A vida é como um rio, que, silenciosamente, segue seu curso até o mar: sem violência, com constância, carregando vida por onde passa, até desaguar na imensidão misteriosa do oceano.

Assim é cada pessoa: nasce para viver, e vivendo com os outros e para os outros, sem cochilar, experimenta a alegria de viver e transmite esta mesma alegria aos outros, até chegar o dia e a hora do desaguar, do mergulho definitivo na plenitude total da vida sem fim. A vida de cada pessoa teve um início com a sua concepção e nunca mais terá fim. E é assim porque a nossa vocação primeira é para vivermos, de verdade, neste mundo e para o infinito, porque somos eternos.

Portanto, enquanto perdura a nossa vida neste mundo, precisamos assumir, responsavelmente, o nosso compromisso com a promoção da vida de tudo e de todos, posicionando-nos contra a todas as forças de morte que operam neste mundo. Infelizmente, há muita gente a serviço do esquadrão da morte, mas a força daqueles que se colocam a serviço do poder da vida, é muito superior. A regra é viver e fazer viver. Quem quiser ser feliz, destrave-se e viva! Destrave-se com os outros e para os outros porque viver é permanecer aberto, disponível, disposto e acordado. É preciso manter as lâmpadas acesas, e o combustível das lâmpadas é o amor, sem o qual não é possível viver, verdadeiramente. Que o amor nos destrave e nos desperte para a vida!


Tiago de França