“Permanecei
em mim e eu permanecerei em vós” (Jo 15, 4).
No evangelho segundo João, Jesus aparece como a videira
verdadeira, e afirma que seu Pai é o agricultor. Consciente desta verdade, todo
cristão é chamado a viver unido a Jesus, pois quem assim procede frutifica,
experimenta a verdadeira vida. Como acontece essa união com Jesus? Une-se a ele
quem se abre aos irmãos e irmãs; quem, de fato, procura viver a fraternidade. Ser
fraterno significa enxergar o outro como irmão em Cristo Jesus.
Hoje, a fraternidade está cada vez mais distante de muitos
ambientes. O egoísmo e o individualismo pregam o oposto: instiga-nos ao
isolamento e à indiferença. Vivemos numa sociedade profundamente marcada pela
selvageria. As pessoas se agridem, enxergando-se e tratando-se como inimigas. Como
dizia o filósofo Thomas Hobbes, ao falar do estado de natureza, realidade
anterior ao surgimento do Estado: há uma guerra de todos contra todos. Mas esta
não é a vontade de Deus.
Quem vive unido a Jesus é pacífico e promove a paz. Jesus desmascarou
todos aqueles que, em nome de Deus e da religião, tratavam com total
indiferença e violência os outros. Os fariseus eram assim. Eram hipócritas
porque tinham o nome de Deus na boca, mas seus corações estavam longe de Deus. Também
hoje assistimos a esta mesma hipocrisia: inúmeras pessoas que se dizem cristãs,
mas que são, na verdade, lobos ferozes, devoradores da carne humana, falsos cristãos.
Facilmente as reconhecemos, pois não vivem unidas a Jesus, mas são possuídas
pelo espírito do mal, espírito que divide, destrói e mata.
A pessoa que se une a Jesus permanece nele e ele permanece
nela. Trata-se de uma comunhão plena de amor. Jesus permanece para sempre. Não é
um forasteiro, que do nada aparece e depois vai embora. Ele vem para fazer
morada. Vem para amar e ser amado, para ensinar o verdadeiro amor. No interior
da pessoa, ele desperta o que há de melhor no ser humano: a capacidade que cada
um tem para amar, infinita e gratuitamente. Toda pessoa habitada por Jesus,
pelo Pai e o Espírito é amorosa, verdadeira, justa, livre, mansa e pacífica. A Trinidade
é Comunidade de Amor, e quer despertar em nós o amor.
Na mesma passagem em
que Jesus aparece como a videira e Deus Pai como o agricultor, ele também nos
fala que para permanecermos nele precisamos guardar as suas palavras. Estas
precisam permanecer em nós. O que isso quer dizer? É tudo muito simples. As palavras
de Jesus são palavras de vida eterna. Elas são verdade e liberdade, vida
abundante para quem as acolhe. Trata-se do alimento espiritual de todo
discípulo que permanece fiel. As palavras de Jesus iluminam, orientam,
fortalecem, concedem força e direciona o discípulo na caminhada da vida.
Acolher as palavras de Jesus implica um compromisso, uma
exigência: viver conforme elas. Não é guardá-las como faziam os fariseus com a
lei dada por Moisés. Os fariseus decoravam e ensinavam aos outros, mas eles
mesmos não observavam. Com o verdadeiro cristão deve ser diferente:
testemunhando a Ressurreição de Jesus por meio de uma vida marcada pela justiça
e pelo amor, o cristão guarda e observa as palavras de Jesus. Em sintonia com a
vida que surge das palavras do Mestre, o discípulo fala, sente, ama e enxerga
como ele. Somente assim temos verdadeiros cristãos, pessoas livres e
autênticas, amorosas e pacíficas, abertas e disponíveis, fieis e alegres,
generosas e mansas, de coração misericordioso.
O cristão é o ramo que é chamado a viver unido ao tronco da
videira que é Jesus. Dele sai a força, a seiva que alimenta e dá vida. Sem Jesus
nada podemos ser nem fazer. Ele deseja permanecer conosco, hoje e sempre. Nossa
sociedade, profundamente doente, perturbada e desorientada, afetada pela
cultura do ódio e da indiferença, precisa, com a máxima urgência, de pessoas
pacíficas e justas. Nesta sociedade, os cristãos tem uma missão importantíssima
a cumprir: enviados por Jesus, são chamados a ser sinais de vida e
ressurreição. Jesus não envia para pregar o ódio em nome de Deus.
O Deus
e Pai de Jesus é Amor, e nele não há ódio nem indiferença. Não podemos aceitar
o discurso de ódio que sai da boca de falsos cristãos, bem como da boca dos
intolerantes não religiosos. O cristianismo não pode se transformar numa
mensagem de ódio, segregação, indiferença, condenação, preconceito e intolerância.
O cristianismo não nasceu com este intuito. O que Jesus ensinou, com o
testemunho da própria vida, foi uma mensagem de verdade e amor, de acolhimento
sincero e pacífico.
O caminho
de Deus é feito de verdade, justiça e amor. Quem não está na verdade, é injusto
e não ama, não conhece a Deus e Deus não permanece nele. Pode até ser muito
religioso ou religiosa, mas se não vive na verdade, se não pratica a justiça e
não ama, é falso e, portanto, mentiroso. No caminho de Deus, itinerário de
salvação, o cristão aprende a amar a todos, sem distinção. Aprende a acolher, a
perdoar, a se conhecer, a se abrir aos outros, enfim, aprende a ser
verdadeiramente humano. Precisamos redescobrir a humanidade de Jesus em nós,
para sermos verdadeiramente divinos nele. Esta é a nossa vocação e missão.
Tiago
de França