Quando Jesus partilhou o pão
e o vinho, durante a última ceia com seus discípulos, não havia, de sua parte,
a intenção de criar exclusivismo. Na missa, os católicos escutam o sacerdote
rezar: “Tomai todos e comei... Tomai
todos e bebei...” Na comunidade cristã, a Eucaristia deve ser de todos. Não
deveria ser privilégio de poucos.
Em épocas
passadas, os cristãos católicos entendiam a Eucaristia como banquete para
pessoas santas. Este era o ensinamento que recebiam da Igreja. Quem estivesse
no pecado não poderia comungar. Até hoje, muitos grupos ultraconservadores
tratam a Eucaristia como prêmio para os justos. Mas quem é o justo? Quem é o
santo? Quem é digno do corpo e sangue do Senhor?...
Na mesa eucarística não há lugar para exclusão de pessoas. Para
ser verdadeira ceia do Senhor deve existir lugar para todos, especialmente para
os que mais pecam. Quem mais peca precisa do auxílio da graça divina. É na
Eucaristia que o pecador encontra a graça por excelência, a graça da
reconciliação e a verdadeira vida.
Como
o cristão pode crescer na fé e na virtude separado do corpo e sangue do Senhor?
A quem Jesus deu poder para impedir o acesso à sua mesa? O banquete eucarístico
é um baquete para pecadores. Quem for puro e imaculado não precisa comungar. Quem
é o puro e o imaculado? Quem não é pecador?...
Estas são observações evangélicas para a compreensão
sacramental da Eucaristia. São indagações que honestamente não podemos esconder
nem evitar. Jesus deseja fazer morada, com o Pai e o Espírito, no coração de
todos. Não há fila para privilegiados. Com Jesus não há filas, mas lugar à
mesa, que é circular, que a todos inclui, preferencialmente os aflitos e
sofredores.
Neste
sentido, não adianta enfeitar ruas, praças, avenidas e vielas com belos tapetes
para Jesus eucarístico passar, sendo que, no cotidiano da vida, se julga e condena
as pessoas. Esta seria uma comunhão indigna do corpo e sangue de Jesus. Precisamos
ter em mente que também se comunga Jesus nos outros.
Aqui aparece outra belíssima dimensão que integra a doutrina
católica sobre a Eucaristia. A participação no corpo e sangue de Jesus não é
mero ritualismo, mas compromete quem se achega à mesa sagrada. Sentar-se com
Jesus e os irmãos à mesa significa participar da sua vida. Comungar é entrar em
comunhão plena e eterna com a Trindade. Quem recebe a Eucaristia passa a
conviver com Jesus. Aliás, mais que isso: passa a ser com Jesus.
O Mestre
da vida passa a integrar o ser da pessoa. Trata-se de uma relação integradora e
libertadora. Carregar consigo o Cristo eucarístico requer abertura e
disponibilidade para a missão. Comungar é tornar-se um com a Trindade,
Comunidade de Amor. Esta missão possui raízes no testemunho religioso e
político de Jesus.
É neste sentido que não se pode aceitar que cristãos que
vivem participando do banquete eucarístico tenham atitudes antievangélicas, de
forma consciente e propositada. Trata-se de uma profunda contradição.
Como
pode o cristão viver em comunhão com Jesus enganando, traindo, agredindo e
matando as pessoas? Como posso dizer que estou unido a Jesus, sendo, ao mesmo
tempo, favorável à cultura da eliminação dos outros? Como posso estar
frequentando o banquete eucarístico se me aproveito da crise para tirar
vantagem sobre as pessoas, aproveitando-me da sua inocência e ingenuidade?...
Estas
realidades pecaminosas são inadmissíveis a um cristão. Ou optamos por Jesus e
abandonamos as injustiças, ou optamos pelos deuses que este mundo cria e
recria, e nos tornamos inimigos do Reino de Deus. Estas realidades são
incompatíveis. A Eucaristia exige adesão clara ao projeto de Jesus, que é o
Reino de Deus.
Que a celebração do corpo e o sangue de Jesus nos ensine a
sermos mais irmãos uns dos outros para que o Reino de Deus se torne realidade
entre nós. Sem este desejo pela fraternidade, cada celebração eucarística não
passará de mero ritual, que somente agrada aos olhos e ouvidos, mas que não
alcança o coração.
Tiago de França