sábado, 2 de maio de 2009

A incoerência na prática da fé


Depois de ter dado uma palestra para um Grupo de Jovens aqui de Fortaleza, uma jovem enviou-me um questionamento a respeito da incoerência. Partilho com você, caro/a leitor/a, o conteúdo de minha reflexão.

"Prezada jovem,

Recebi tua mensagem e tua partilha fraterna. Fico feliz em saber que pude ajudar vocês a pensarem mais na caminhada de fé na Igreja. Pensar a fé é uma necessidade de todo seguidor e seguidora de Jesus. Quem não pensa sua fé, a tem de forma ingênua e alienável. Temos muitos cristãos alienados em nossos dias. Cristãos fundamentalistas, que são inimigos da paz usando a religião como pretexto. Este é um dos males de nosso século.

Vamos à questão que foi colocada por ti. Vi que o centro de tua partilha foi a questão da incoerência na vivência cristã da fé. A incoerência é um mal horrível na vida de fé de uma pessoa. Afirmar aparentemente uma coisa e viver uma outra realidade é complicado. Jesus chamou isso de hipocrisia religiosa. Os doutores da lei e fariseus tinham este problema e eram muito criticados por Jesus.

Jesus não deixou uma lei para julgar a situação irregular das pessoas. Ele pediu simplesmente para que elas vivessem o amor, porque o amor liberta o ser humano da hipocrisia, da falsidade e da incoerência. Jesus não condenou os incoerentes, porque ele sabia muito bem das limitações inerentes ao ser humano. É verdade que a incoerência precisa ser combatida, mas as pessoas não; ou seja, devemos condenar as atitudes pecaminosas das pessoas e não as pessoas que pecam. Ninguém pode ser excluído do amor de Deus.

Na Igreja, desde o Papa de Roma até o mais infiel dos católicos, a incoerência está presente. Todos temos nossas incoerências. Umas mais graves que outras. Uns pecam mais, outros pecam menos; mas todos pecam. Por um lado isto é bom, porque somente assim, já que não somos puros nem santos, não temos autoridade nem poder de julgar a vida de nosso semelhante. A Igreja não pode expulsar nem condenar seus filhos que, porventura, estejam "desviados" do Evangelho. A missão da Igreja é ser instrumento de salvação, não de condenação. É mais fácil condenar, porque o ser humano é limitado e sempre incorre para o mal (concupiscência).

Aquelas pessoas que estão "desviadas" precisam ser acolhidas e reconduzidas ao bom caminho. A via da misericórdia é a mais acertada tarefa do cristão e da Igreja. Acolher o outro na sua limitação. Quando caímos no erro sempre esperamos que as pessoas nos entendam. Este entendimento e esta acolhida deve ser recíproca entre nós que professamos a fé em Jesus. Jesus veio a este mundo compreender, viver e remir nossa realidade corrompida pelo pecado. Se ele viesse para nos julgar e condenar, Deus não seria misericordioso e estaríamos perdidos!

No caso concreto em que citaste, o jovem parece ter engajamento pastoral e está frequentando a Igreja. Este já é um passo muito positivo, diante da evasão de fiéis a que assistimos diariamente na Igreja. Estar presente já é participar. A presença já evangeliza. Se o jovem está com problemas com sua sexualidade, então precisa ser trabalhado. Se chegarmos para ele e dizermos: "Olha, não venha mais no grupo. Deixe de ser falso. Seja coerente! Só apareça quando se converter!", então estaremos sendo fariseus e hipócritas também. Esta atitude não ajudará o jovem nem resolverá seu problema. Irá deixá-lo revoltado conosco e ele poderá buscar refúgio em uma comunidade onde seja acolhido. Neste caso, se não pudermos ajudar, também não podemos atrapalhar a vida do outro.

Quero finalizar esta reflexão contigo, citando um texto da Escritura: "Sobretudo, conservai vivo o amor mútuo, pois o amor cobre uma multidão de pecados" (1 Pedro 4,9). Se o jovem em questão pratica o amor, a caridade para com o próximo, então ele já tem seus pecados perdoados. É a Palavra que diz. Quem poderia contradizê-la?! Se pecamos contra Deus, peçamos perdão. Se cairmos, levantemo-nos! O itinerário de nossa vida é assim mesmo: caímos e levantamos, levantamos e caímos! E a vida continua...

Espero ter te ajudado a pensar mais profundamente a situação. Que o Espírito te ilumine!

Abraços,

Tiago de França".

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