segunda-feira, 22 de junho de 2009

Pe. Pedro Opeka, CM - um missionário entre os pobres


Um amigo, Adriano Sousa Santos, padre lazarista da Província de Fortaleza, enviou-me uma entrevista que fez com o lazarista, Pe. Pedro Opeka, missionário em Madagascar (África). Fui autorizado a publicar aqui tal entrevista que vale a pena ler, pois se trata de um testemunho vivo de caridade fraterna com os pobres. As respostas às indagações são oriundas de um padre pobre que vive entre os pobres. É o carisma vicentino sendo vivido na atualidade da Igreja. Boa leitura!

Segue a entrevista.

Pe. Adriano Sousa Santos, C.M
Entrevista Pe. Pedro Opeka,C.M

Uma esperança engajada. Uma fé que transforma. Uma caridade audaciosa. Um padre vicentino que há trinta e seis anos transformou sua convivência junto ao pobre de Madagascar numa certeza: a partir dos pobres a pobreza pode ser vencida.
Não são dez respostas, mas dez dicas de alguém que pelo exemplo, não só fala do lugar do pobre, mas ao coração do pobre e do mundo
:
Pe. Pedro Opeka,C.M


1) O maior desafio para vencer a pobreza?


Acreditar que ela pode ser vencida. Lançar-se no mundo dos pobres, mas acreditando que toda situação injusta pode mudar. Outro passo importante são os gestos concretos no meio dos pobres e com eles agir como seres humanos, como cristãos e vicentinos.

2) A mudança social precisa da mudança de mentalidade?

Sim. A pobreza gera no povo pobre uma mentalidade que o faz viver de forma fatalista. É urgente que essa mudança aconteça mesmo sabendo que isso leva bastante tempo. Ela exige paciência.

3) Qual a consciência pessoal dos pobres quando se sentem decretados a morrer na miséria?

Eles pensam que a pobreza é um destino e a exclusão social ocorre por não terem capacidade de sair da pobreza. Nós vicentinos temos que levar a esperança ao dizer que a pobreza pode ser vencida por eles. É dever nosso descobrir e despertar em sua alma, talentos e potencialidades que Deus ofereceu a cada um deles.

4) Ao comentar sobre a sua experiência junto aos pobres do lixão em Madagascar o senhor falou da auto-estima destruída. O que realmente pode provocar isso e como foi possível mudar essa situação?

A auto-estima do pobre acaba quando ele perde a sua força espiritual. Um povo na miséria ou enfermo fica sem força interior. Sem essa força não há auto-estima. É o espírito que anima a pessoa. Só é possível reverter essa situação através da presença solidária e permanente junto ao pobre. É mais que urgente despertar o seu poder de transformação.

5) Quais os fatores que podem levar a uma transformação que seja de fato estrutural e não apenas emergencial?

A transformação estrutural passa por várias etapas: ajuda humanitária e mudança de sistemas injustos. O mais importante é se concentrar nas formas possíveis de erradicação da pobreza. Qualquer mudança estrutural necessita tempo.


6) Os países desenvolvidos concentram, controlam e gerenciam a riqueza no mundo. A pobreza que se procura vencer é criada por esses países. Ao se falar em mudança sistêmica isso também não deveria afetar a consciência dos países ricos? Como fazer isso?

A pobreza mundial tem suas raízes em mecanismos de ordem econômica, política e social. É difícil para os paises ricos assumirem essa culpa. Entretanto, podemos começar por outro extremo indo ao encontro do pobre e despertá-lo para a solidariedade com os outros pobres. A organização dos pobres é a sua arma política para pressionar os ricos a mudarem suas estruturas.

7) Qualquer transformação por mais localizada que seja tem o poder de mudar o mundo?

Sim. Mesmo sendo localizada, a mudança tem o poder de atravessar fronteiras e mudar o mundo. Toda obra de justiça rapidamente repercute porque muita gente necessita de obras concretas que resultem numa mudança sistêmica. Eu nunca pensei que vivendo no lixão para vencer com o pobre a sua pobreza pudesse alcançar outras regiões do mundo. Já fui recebido pelo papa, pelo presidente da França, pelo príncipe de Mônaco. Ao longo dos meus trinta e seis anos aconteceram coisas impensáveis.

8) Como conseguiu captar sonhos e outras urgências para além da fome e miséria daquele povo?

Todo ser humano acalenta sonhos. Como vicentinos podemos convencer os pobres que o seu sonho pode virar realidade. Aos pobres temos que dizer: nunca deixe de sonhar, nunca deixe de crer, nunca deixe de esperar porque o sonho é possível. É urgente ajudar o pobre a ter confiança nele e acreditar no seu talento sem medo e sem prejuízos. A sociedade é muita dura com o pobre. Não é fácil levantá-lo de sua dor. Com a nossa ajuda, porém, eles realizam seu sonho de mudança.

9) O senhor tem consciência que o seu trabalho junto ao povo do lixão provocou uma mudança sistêmica?

Eu tive essa consciência alguns anos mais tarde. Não se trata de aplicar uma determinada fórmula quando se quer mudar uma realidade, mas em viver e sentir o contexto particular do pobre. Ele sente a sua realidade. Com ele compartilhamos fracassos, dores e provações. A mudança sistêmica é uma ajuda e não o fim. É uma ferramenta que ajuda a analisar a situação injusta sofrida pela pobre. Tal mudança deve ser adaptada a contextos específicos e a cultura de cada povo. A finalidade vai ser sempre resgatar a dignidade e a liberdade do pobre.

10) O documentário produzido pela televisão austríaca e apresentado durante o XI Encontro Nacional da Família Vicentina acerca de seu trabalho junto aos pobres do lixão foi bastante interpelativo. As novas mídias podem ajudar na mudança sistêmica? Sensibilizar é um critério para transformar?

Sim. Temos que saber utilizar os meios de comunicação social. Eles têm muita força para sensibilizar e despertar a consciência de ricos e pobres. Vivemos no mundo da imagem. A imagem deve suscitar sinais de esperança e levar as pessoas a se comprometerem com um mundo justo e fraterno. Uma boa imagem fala por si mesma e estimula a imitação daquele gesto em favor dos mais pobres.

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