quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Brasil, o maior país católico do mundo?


Nas discussões cotidianas sobre religião sempre aparece a afirmação de que a Igreja Católica é a que tem maior número de fiéis no Brasil e que este é o maior país católico do mundo. No que se refere ao número, podemos até concordar. Agora, afirmar que o Brasil é o maior país católico do mundo é equivocar-se, pois tal afirmação nunca foi verdadeira. Isto se tornou até ideologia para levar as pessoas a se convencerem de que a Igreja é inabalável. Ultimamente, tenho lido alguns autores da Filosofia da Religião e eles são unânimes em afirmar que há anos tal constatação tornou-se equivocada. Antes de qualquer estatística precisa-se averiguar qual o conceito que temos de cristãos católicos.

A tradição cristã ensina que o cristão é aquele que se encontrou com Cristo, conheceu sua pessoa e seu projeto, compreendeu e aderiu à mensagem, colocando-se no caminho de Jesus. A Teologia chama isto de seguimento de Jesus. A Igreja ensina que o católico é aquele que tendo se incorporado a Cristo e à Igreja pelo batismo, participa ativamente da comunidade dando testemunho da fé cristã. Os que estão fora destes conceitos, não são cristãos, nem católicos. Voltando o nosso olhar para a realidade da Igreja no Brasil, a afirmação de que o Brasil é a maior nação católica do mundo cai por terra, pois a grande maioria dos batizados na Igreja não participa da vida eclesial.

O Documento de Aparecida no n. 99, item f aponta para a perda do sentido de transcendência por parte de muitas pessoas, levando-as a abandonar as práticas religiosas. O Papa Bento XVI já bem antes de ser eleito, sempre insistiu de que a culpa está nos vícios da modernidade. Recentemente, tem visto no relativismo o grande mal que afeta os cristãos no seguimento de Jesus. Em contrapartida, alguns teólogos que refletem a questão a partir de outro ponto de vista, crêem que o discurso papal acentua cada vez mais tal evasão de fiéis da Igreja. A realidade mostra muito bem que a Igreja ainda não se acostumou com a idéia de que ela é uma entre outras, daí a dificuldade do diálogo inter-religioso, pois segundo alguns, a tendência é fazer com as pessoas de outras religiões e Igrejas se convertam a nós, marginalizando assim o autêntico sentido do diálogo inter-religioso e intra-religioso.

O certo e real é que a porcentagem dos que professam a fé na comunidade eclesial é mínima, levando em consideração o número de batizados e as estatísticas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e do CERIS (Centro de Estatísticas Religiosas e Investigações Sociais), que apontam para pouco menos de 75% da população brasileira que se declara católica. Para a dinâmica da fé e do Reino de Deus estes números não dizem muita coisa, pois não se mede a participação religiosa na Igreja por meio de números, mas pela da participação ativa na construção do Reino de Deus. O Documento de Aparecida e os discursos de alguns Bispos na mídia mostram claramente que a Igreja não se preparou e não está preparada para lidar com a perda de fiéis, uma que vez que tal fenômeno se mostra complexo e incontrolável.

O pluralismo religioso nos remete a duas expressões que fazem parte das análises do complexo problema da diversidade religiosa hoje: mercado religioso e trânsito religioso. Não é sadia a idéia de incluir o aspecto religioso da vida na dinâmica do mercado, porque este pressupõe compra e venda, oferta e procura, satisfação e insatisfação. A situação é tão drástica que somos obrigados a concordar que o mercado religioso é diversificado e tentador. São várias as ofertas que se apresentam nas prateleiras dos “supermercados da fé”. Podemos encontrar ofertas religiosas nos centros comerciais e cada uma tem seu marketing próprio, pois o espírito competitivo faz parte da lógica mercadológica.

Devido ao excesso de ofertas religiosas, as pessoas ficam cada vez mais confusas e procuram experimentar a todas. As doenças de nosso século levam as pessoas a encararem o sagrado não como uma vivência amorosa com Deus, mas como busca incessante de satisfação das necessidades temporais e espirituais. Todas as ofertas religiosas prometem variadas soluções para os problemas da vida, mas nem todas resolvem. A lei da eficiência é outro valor mercadológico que as ofertas religiosas precisam atender, pois quem for mais eficiente termina por ganhar o fiel para Jesus. A partir daí a relação é clientelista. Certo dia, escutei um padre perguntar a outro coirmão o seguinte: “Padre, me diga, a sua igreja sempre está cheia?” Tal questão revela a preocupação do padre e sua linha de pensamento no exercício de seu ministério. Por isso que quando se fala de tal temática, sabia e profeticamente o teólogo José Comblin costuma ensinar: “preocupa-se com tudo, menos com o testemunho”.

“Se vocês tiverem amor uns para com os outros, todos reconhecerão que vocês são meus discípulos” (Jo 13, 35). Certamente, dar testemunho da Ressurreição de Jesus neste mundo é algo desafiador. Além de nossa natureza frágil e inclinada para o mal, ainda temos que enfrentar o mundo tomado pelo ódio e pelo egoísmo. Seguir Jesus na radicalidade de sua mensagem é a missão da Igreja. O mundo atual exige atitudes concretas de uma Igreja profética. Não devemos empenhar nossas forças e nosso entusiasmo na busca do rebanho “perdido” por meio da eficiência no culto ou reformas doutrinais, mas atendendo ao que nos pede Jesus na citação joanina: Ter amor uns para com os outros. Este é o mandamento de Jesus e que nos fará plenos. É preciso resgatar a identidade cristã original que se revela no amor vivido e anunciado por Jesus.


Tiago de França

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