sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Dia Nacional da Consciência Negra


No dia 20 de novembro de cada ano, os brasileiros são convidados a refletir sobre a Consciência Negra. Os negros fazem parte da história e da formação do povo brasileiro. Todo brasileiro é fruto da mistura de brancos, índios e negros. Ninguém escapa disto. O sangue que corre em nossas veias é sangue de branco, de negro e de índio. Somos um povo miscigenado. Somos uma raça misturada. Somos uma diversidade de costumes e culturas. Tudo é muito rico e precisa ser valorizado, pois a miscigenação constitui a nossa identidade cultural.

Houve tempos no Brasil e também no mundo, em que havia duas raças: a do branco e a do negro. A vocação do branco era para ser senhor e a do negro ser escravo. Somente o branco é que podia ser padre, prefeito e doutor. Negro só servia para o serviço braçal, para servir às mesas, para a limpeza da casa e do serviço da cozinha, para cuidar dos animais e para cultivar a terra do patrão. O negro não precisava de documento, pois era vendido como mercadoria no mercado de escravos. O cidadão era o homem e a mulher brancos.

Para amenizar a dor e o sofrimento de sua condição, o negro dançava a capoeira e praticava o candomblé. Na invocação aos espíritos e entidades, procuravam alívio e sentido para a existência. Nas fazendas dos brancos católicos, o padre celebrava a Missa para que os negros pudessem ser dóceis com seu senhor. Não o senhor Deus, mas o senhor de engenho! Todos eram batizados e obrigados a professar a fé católica, mas como não se identificavam com a difícil e complexa doutrina católica, os negros se mantiveram fiéis ao candomblé e às demais práticas religiosas condenadas pela Igreja como “obras das trevas” e “satânicas”.

No século XVII, antes mesmo da princesa Isabel assinar a Lei Áurea, decretando a abolição da escravatura no Brasil, viveu em Alagoas a extraordinária e intrigante figura de Zumbi dos Palmares. Este era líder do Quilombo dos Palmares, comunidade que chegou a reunir mais de trinta mil escravos fugitivos de vários engenhos da região. Tratava-se de uma experiência de liberdade, vivida por homens e mulheres que não suportando mais o regime de escravidão, reuniam-se na vida comunitária formando uma realidade que ameaçou à ordem social vigente e incomodou os senhores de engenho. Aos vinte e cinco anos de idade, Zumbi se tornou líder da Comunidade quilombola e aos quarenta anos foi executado pelo bandeirante Domingos Jorge Velho a mando do Governador da Província de Pernambuco, no dia 20 de novembro de 1695.

Zumbi é símbolo da coragem, da ousadia e da liberdade. É símbolo de resistência na luta contra a escravidão, a discriminação e o preconceito raciais. A liberdade é constitutiva do ser humano e este só se realiza na liberdade. Todo homem e toda mulher deve ser livre. Ninguém deve ser escravo. Todo e qualquer tipo de escravidão contraria e fere a condição humana. É inaceitável o racismo e o preconceito contra toda e qualquer pessoa humana, seja ela branca ou negra. Não somos várias raças de seres humanas, mas somente uma, pois não há várias espécies de seres humanos, mas somos uma única espécie animal-racional. A Constituição do país é clara ao afirmar que todos são iguais perante a lei, apesar da violação dos direitos humanos. A intolerância nas relações sociais entre os seres humanos de diferentes cores e culturas é intolerável. As diferenças que se manifestam na diversidade cultural não podem gerar indiferenças.

A história prova que também a Igreja praticava o racismo e a discriminação contra os negros. Somente após o Concílio Vaticano II é que os negros puderam se tornar clérigos (padres, bispos e cardeais). É verdade que muitas vozes na América Latina levantaram-se contra a escravidão dos negros antes do Vaticano II. Podemos citar o Bispo de Chiapas (México, séc. XVI), o dominicano Bartolomeu de Las Casas. Mas diante da opressão, geralmente, a Igreja a legitimava covardemente por considerar “coisa normal” da época. Depois de muita reflexão, a Igreja optou por denunciar o racismo e se opor veementemente contra o preconceito racial. Há vinte anos foi fundada na Igreja a Pastoral Afro-brasileira, que visa “dar uma organicidade às diferentes iniciativas dos negros católicos que marcam presença na vida e na missão da Igreja” (cf. Site da CNBB, pastoral afro-brasilera). No Governo Lula também foi criada em março de 2003 a Secretaria Especial de Políticas e Promoção da Igualdade Racial, órgão da Presidência da República que coordena políticas afirmativas de proteção aos direitos de indivíduos e de grupos étnicos e raciais afetados por discriminações e outras formas e intolerância, com ênfase na população negra.

A luta dos negros por igualdade de direitos e deveres é uma luta por libertação. O testemunho da Sagrada Escritura mostra claramente que Deus não faz distinção de pessoas. Deus é de toda humanidade, raça de muitas cores e culturas. O autêntico seguidor de Jesus não pode praticar o racismo e/ou a preconceito racial, mas sentir-se e ser igual a todos, e lutar pela igualdade de todos. Os negros são chamados a não se sentirem inferiores aos brancos, pois não deve haver superioridade de cor entre os humanos. Se houvesse no Brasil uma consciência autenticamente formada, não precisaríamos reservar cotas para os negros ingressarem nas universidades, pois o negro não é inferior ao branco em matéria de inteligência e/ou capacidade intelectual. Um exemplo disso é o negro Joaquim Barbosa, Ministro do Supremo Tribunal Federal, mineiro de família pobre, que sempre estudou em escola pública e fez mestrado e doutorado em Direito pela Universidade de Paris, França.

Lutemos para que a justiça prevaleça em nosso país. Que os negros e os demais homens e mulheres de todas as cores e culturas aprendam a viver tolerantemente suas diferenças. Não somos melhores ou piores do que os outros, somos apenas diferentes. Que o amor, que supera toda e qualquer indiferença, nos faça viver unidos na diversidade e nas diferenças.


Tiago de França

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