segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

CF 2010 - Economia e vida


“Não podeis servir a Deus e ao dinheiro” (Mt 6, 24c).

A economia faz parte da vida humana. Assim como a política rege as decisões e as relações sociais na sociedade, a economia está voltada para o cuidado com a casa, como indica a origem da própria palavra. Ninguém está excluído da economia, enquanto rede de relações comerciais inserida no mercado e fora dele. A compra e a venda de produtos, mercadorias e serviços fazem parte da construção econômica da vida humana e social.

O tema da CF - Campanha da Fraternidade deste ano é ecumênico, ou seja, ultrapassa as fronteiras religiosas. É uma Campanha que visa refletir sobre a relação entre economia e vida para todas as pessoas, independentemente de suas crenças religiosas, pois a economia constrói e/ou afeta a vida de todos. A CF de 2010 é também uma oportunidade das Igrejas, juntas, repensarem suas práticas religiosas e suas compreensões daquilo que chamamos de economia da salvação.

A Igreja, que tomou a iniciativa de fazer, anualmente, uma Campanha nacional que visa pensar, rezar e buscar soluções para os problemas sociais emergentes do país, procura também, ao mesmo tempo, à luz do Evangelho de Jesus e dos valores autenticamente humanos, reorientar a sua caminhada enquanto instituição incluída no Povo de Deus. A CF é uma oportunidade de as Igrejas se afirmarem, positivamente, diante da sociedade demonstrando que estão preocupadas com a atual situação econômica do país e que estão dispostas a contribuir com a construção de uma economia voltada para a vida.

Anualmente, durante o tempo quaresmal, ocorre a Campanha da Fraternidade. Considero-a uma das atitudes proféticas da Igreja no Brasil. O espírito profético constitui a mensagem cristã anunciada pela Igreja e tal mensagem pressupõe o anúncio da vida e da liberdade do gênero humano. Neste ano, a preocupação da Igreja em comunhão com as demais denominações religiosas volta-se para a economia. Sabemos das distorções e dos crimes contra a dignidade humana cometidos pelo sistema capitalista atual.

É verdade que as Igrejas não são responsáveis diretamente pela economia. Algumas pessoas, equivocadamente, chegam até a se perguntar sobre a intromissão ou envolvimento da Igreja em assuntos não religiosos. O interesse da Igreja na reflexão de temas considerados não religiosos refere-se à defesa e promoção da vida do homem e do mundo. Não basta ficar somente na liturgia que celebra a vida, mas é justo e necessário o mergulho nas questões do homem e do mundo. A Igreja é formada por homens e está situada no mundo, logo precisa está intimamente envolvida com os problemas que os afetam.

O Concílio Vaticano II, que até hoje tenta reorientar as atitudes da Igreja, levando-a a optar radicalmente pelos pobres, nos faz compreender a Igreja como Povo de Deus encarnada na história. Sem esta compreensão, a Igreja não seria Povo de Deus. Se a Igreja se separa ou foge do mundo e de seus dilemas, ao mesmo tempo, ela se exclui do Reino de Deus e isto compromete a sua missão. A vocação da Igreja é para o serviço do mundo. Este não está a serviço da Igreja, mas é destinatário da caridade de Cristo que se manifesta nas ações da Igreja em favor dos cidadãos deste mundo.

Assim sendo, toda corrente espiritual que vise afastar as pessoas do mundo descomprometendo-as, torna-se um mal e uma força do anti-Reino. Tais correntes espiritualistas precisam ser erradicadas da Igreja, pois em nada contribui na edificação do Reino de Deus. Tudo na Igreja deve convergir para o Reino de Deus, do contrário, somos fariseus e hipócritas, amigos das leis e das tradições. A citada economia da salvação está na ação eclesial que se revela no compromisso afetivo e efetivo da Igreja enquanto instrumento de salvação da humanidade.

O lema da CF deste ano chama-nos a atenção para o serviço a Deus. O versículo bíblico apresenta-nos duas alternativas: servir a Deus ou ao dinheiro. O serviço a estes senhores acarreta sérias conseqüências para a vida humana. Quem quiser servir a Deus tem como regra de vida servir aos pobres, os prediletos de Jesus. O serviço a Deus se expressa no serviço ao próximo, preferencialmente os mais sofridos. É um desafio quase que impossível, mas compreende a exigência da mensagem cristã. Quem aceita Jesus como Deus e Senhor é chamado a servi-lo nas pessoas agredidas em sua dignidade. Sem este serviço não há fé, mas suposição e/ou aparência de fé.

O serviço ao dinheiro é algo perigoso, pois compromete a salvação do indivíduo e da humanidade inteira. A atual situação do mundo demonstra muito bem o quanto é perigoso servir ao dinheiro. Quem serve ao dinheiro não respeita, não promove, nem defende a vida, mas a explora infinitamente. O fato de a Conferência de Copenhage (COP – 15), ocorrida no ano passado, não ter tido resultado algum revela que os representantes dos países, principalmente dos industrialmente desenvolvidos estão preocupados com o lucro e a produção desregrada da riqueza em detrimento da saúde do planeta, nossa Casa comum.

Isto tem revelado a necessidade de uma séria conversão de vida. Este é o apelo da CF que se dá no Tempo da Quaresma: o homem precisa se converter e tal conversão passa pela mudança de mentalidade. A mentalidade capitalista é corrupta e destruidora. A ideologia capitalista, mentirosa e manipuladora engana-nos quando nos leva a pensar no progresso que constrói a vida humana. Não devemos ser contra o progresso, afinal de contas, a vida social deve progredir; mas todo progresso vivido na competição que exclui e marginaliza as pessoas não é verdadeiro e deve ser combatido. É verdade que não basta somente criticar e combater, mas apresentar sugestões para a resolução de tais problemas. Tais sugestões também pressupõem sérias cobranças às autoridades públicas também responsáveis pelo encaminhamento de possíveis soluções.

Sirvamos, pois, a Deus e usemos o dinheiro para suprir as nossas necessidades básicas. O dinheiro está para nos servir naquilo que precisamos e não o oposto. A vida se torna mais fácil e mais leve quando nos libertamos das falsas promessas, do falso progresso e da doentia e alienante ideologia capitalista, que tem assassinado a consciência e a vida de muitas pessoas em nosso mundo.


Tiago de França

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