sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Uma visita inquietante


No dia 03 de janeiro do corrente ano, juntamente com minha mãe, visitei o túmulo do teólogo belga José Comblin, falecido no dia 27 de março do ano passado. Neste breve texto quero partilhar com o leitor alguns sentimentos que me surgiram durante tal visita, que a denomino visita inquietante. Não quero falar da vida de J. Comblin, mas da visita, partilhando algumas inquietações. Estas se fundamentam em duas palavras que estão inscritas em forma como que de um título aquele que foi um dos maiores teólogos da Igreja. Assim está inscrito no seu túmulo: José Comblin, *22/03/1923 +27/03/2011 Profeta da Liberdade.

Quem o conheceu de perto sabe que, a exemplo do profeta Amós, José Comblin não se autoafirmava profeta. É claro que sua obra teológica e sua vida humilde no meio dos pobres nordestinos testemunham que ele era, de fato, um profeta de Deus. Se tirarmos a palavra liberdade de sua vida e de sua obra, tudo perde seu sentido. Toda a sua profecia estava voltada para a liberdade. Era o teólogo da liberdade. José Comblin entendia o evangelho de Jesus como o Evangelho da liberdade. Se o Evangelho não libertar, então não passa de discurso ideológico escravizador. Ele defendia o anúncio do puro Evangelho de Jesus, sem manipulações que o tornam ineficaz.

José Comblin afirmava que a religião tem o hábito de manipular a Boa Notícia do Reino de Deus. Como isto acontece? Fala-se de tudo, menos do Reino de Deus. Portanto, a ausência deste Reino já é manipulação. Quando o Reino não está no centro da evangelização, evangeliza-se segundo os interesses eclesiásticos e estes são considerados fins em si mesmos. E a liberdade, onde ficou? Não existe. Quando falam da liberdade, na verdade querem escravizar utilizando-se do discurso libertário. São poucos os que conseguem escapar deste tipo de escravidão.

O caminho da liberdade é difícil e arriscado. Há muitas resistências à liberdade. A religião deveria ser espaço privilegiado da liberdade, mas a história mostra o contrário. A história do Cristianismo ao longo dos séculos mostra diversas perseguições e mortes de profetas da liberdade. Eles são a prova de que o Espírito fala às Igrejas, quer escutem, quer não. A palavra profética transforma o Cristianismo numa realidade que é chamada a fazer com que este mundo se torne lugar de vida para todos, e a vida surge na busca incansável da liberdade.

O Espírito suscita o profeta numa hora e num lugar determinado da história. José Comblin cumpriu a sua missão, fica a sua profecia para ser meditada porque é sempre atual. Numa Igreja que muda lentamente, a palavra profética que lhe foi dirigida permanece válida por muito tempo. Seu testemunho de vida edificou a Igreja e ajudou-a no seu processo de conversão. O problema é que o poder, o prestígio e a riqueza, presentes na Igreja, cegam e ensurdecem os que precisam escutar o que o Espírito está falando por meio dos profetas.

Na minha oração pessoal, diante do túmulo de José Comblin, me pus a perguntar: Meu Deus, quando virá outro profeta como este? Por que as pessoas têm tanto medo da liberdade? A partir de meu contexto atual de vida, como ser um profeta da liberdade? Estas e outras questões merecem a nossa atenção. Com a leitura que J. Comblin fez do Evangelho aprendi que a vida não vale a pena fora da luta pela liberdade. Trata-se de uma luta possível para a construção de outro mundo possível. Que o Espírito suscite na Igreja e no mundo outros profetas e profetisas da liberdade, que nos recordem sempre o Reino de Deus.


Tiago de França

domingo, 1 de janeiro de 2012

Uma mensagem aos amigos e amigas


Querido/a irmão/ã em Cristo Jesus,

Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!

Espero que esta carta te encontre bem. Quero iniciar este ano expressando minha alegria em tê-lo/a como amigo/a. Em meio às dificuldades que a vida vai nos apresentando, o cultivo da autêntica amizade é caminho certo para vivermos mais e melhor. A fé cristã nos orienta para a promoção e defesa da vida do mundo e do ser humano e estas passam também pela amizade. Penso ser muito oportuna toda reflexão voltada para o fortalecimento do ser humano diante dos contravalores que dominam cada vez mais as relações interpessoais neste nosso mundo chamado pós-moderno.

Na missa de encerramento do ano letivo do Seminário, no momento de ação de graças fiz questão de chamar a atenção para o valor da amizade na vida dos que se sentem chamados ao serviço da Comunidade. Somos chamados a este serviço. Servir ao próximo não é privilégio de seminarista, padre, freira e dos demais religiosos. O serviço ao próximo é uma exigência evangélica que Jesus dirige a todos os que foram batizados em seu nome.

O grande problema da Igreja é a falta de consciência da maioria de seus membros. Como seria bom se todos meditassem a respeito do compromisso assumido no batismo. O compromisso batismal consiste no seguimento a Jesus de Nazaré, seguimento que se dá quando procuramos viver o mandamento do amor. Viver este mandamento é muito difícil, mas não é impossível. É difícil porque a indiferença e o ódio estão tomando conta do mundo e das pessoas; não é impossível porque o Deus que nos chama a viver o amor nos ajuda com sua graça.

Na amizade se manifesta a graça de Deus. O nosso Deus é, antes de tudo, nosso bom e fiel amigo. Felizes são os que procuram ser amigos de Deus. É através da amizade que vivemos a fraternidade. O mundo atual semeia discórdias, que separam mais as pessoas e as tornam cada vez mais frias e indiferentes. Quem professa a fé em Jesus de Nazaré deve se esforçar para ser sinal de unidade, amizade e, conseqüentemente, de fraternidade no meio do mundo. É inaceitável que o cristão seja um contratestemunho e/ou pedra de escândalo para aqueles que precisam de solidariedade para reerguer-se na vida.

O Senhor nosso Deus nos concede mais um ano para nos exercitarmos no amor ao próximo. Trata-se de um exercício salvífico, que exige abertura e paciência. Abertura para acolher o diferente e o novo. Estes nos questionam e ajudam a fazer uma autorevisão de nosso jeito de ser no mundo. Paciência para esperar pelo outro, no seu ritmo e jeito de ser. O outro tem seu momento, sua hora e suas disposições interiores. Paciência para suportar a verdade de que não podemos mudar o outro. A mudança acontece na amizade e na co-responsabilidade.

O amigo é aquele que é co-responsável pelo outro, que cuida do outro, que participa da vida do outro. Trata-se da espiritualidade do cuidado, tese defendida recentemente pelo teólogo e filósofo Leonardo Boff. O mundo e a Igreja atuais carecem de pessoas que se cuidem, mutuamente; que se ajudem a viver melhor. A qualidade de nossa vida depende, imprescindivelmente, da qualidade de nossas relações interpessoais. Este é o caminho para a paz.

Por isso, neste novo ano vamos fortalecer os laços que nos unem em Cristo Jesus. A vida se tornará cada vez mais fácil se nos esforçarmos por vivermos de acordo com aquilo que Jesus nos ensinou, e ele os ensinou que o caminho para um mundo e uma vida melhores está na prática do amor ao próximo, amor que se manifesta na amizade e na solidariedade. Que o Espírito do Senhor nos ajude neste propósito e nos confirme no caminho de Jesus de Nazaré.

Com meu abraço e meus sinceros votos de um santo e FELIZ ANO NOVO,

Tiago de França
Desde Colônia Leopoldina - AL, 01 de janeiro de 2012 - Dia Mundial da Paz.