“A
semente que caiu em terra boa é aquele que ouve a palavra e a compreende. Esse produz
fruto. Um dá cem, outro sessenta e outro trinta” (Mt
13, 23).
A parábola do semeador contada por Jesus às margens do
mar da Galiléia (cf. Mt 13, 1 – 23) é uma das mais belas passagens do
evangelho. Merece nossa atenção e meditação porque fala da força transformadora da palavra de Deus. Como o discípulo de Jesus
pode acolher sua palavra? Qual a força desta palavra? Quais as consequências da
acolhida desta palavra? Quais os obstáculos que a palavra encontra na vida
cristã?
Estas
perguntas querem revelar o sentido da parábola. Nossa meditação quer ajudar na
compreensão desta valiosa parábola de Jesus. Como sempre, nossa referência é a experiência
missionária de Jesus. É olhando para ele que compreendemos o sentido de suas
palavras.
O jeito de Jesus
ser missionário incluía as comparações (parábolas). Era seu modo de revelar os
mistérios do Reino de Deus aos pobres. Nas parábolas Jesus se utilizava de uma
linguagem simples e acessível ao povo. No caso da parábola do semeador aparecem
símbolos conhecidos pelo povo simples: sementes, beira do caminho, pássaros,
terreno pedregoso, espinhos, terra boa. São coisas conhecidas pela mulher e
homem do campo. Jesus queria que as pessoas compreendessem
o sentido e o alcance da palavra de Deus em suas vidas; estava ensinando
como esta palavra chega à vida e nesta gera os frutos queridos por Deus, frutos
que permanecem para a vida eterna.
Segundo
a parábola, o semeador sai para semear e as sementes caem em quatro lugares: à
beira do caminho, em terreno pedregoso, no meio dos espinhos e em terra boa. Em
seguida, Jesus explica aos discípulos o significado da parábola, após ter sido
questionado por eles: “Por que falas ao
povo em parábolas?” Portanto, esta é uma parábola de fácil entendimento,
pois o próprio Jesus fala do seu significado. Resta-nos atualizá-la para nossos
dias.
À
beira do caminho
A palavra de que
fala Jesus é a palavra do Reino. Ele não está falando de qualquer palavra, mas
da palavra do Pai, uma palavra que tem a
força de edificar neste mundo o Reino de Deus. Portanto, o crente que
procura ouvir esta palavra deve tomar consciência de que está sendo chamado à
obediência da fé nesta palavra transformadora do Pai. Esta palavra sai da boca
do Pai, não é discurso eclesiástico, mas semente fértil que procura terra boa
para germinar e produzir frutos abundantes.
Quem ouve a palavra e não a compreende corre o risco de perdê-la.
O maligno vem e rouba o que foi semeado no coração. É o que diz Jesus. Há pessoas
que até procuram ouvir a palavra de Jesus nas comunidades cristãs. Muitos leem
a Bíblia com certa constância. Outros, ainda, vivem citando versículos bíblicos
aqui e acolá. Tudo isso passa a impressão de serem bons cristãos, observantes
das letras sagradas.
Na
verdade, porém, tudo não passa de aparência.
A aparente leitura e meditação da palavra de Deus não transforma a vida do
crente, mas o mantém na ilusão. Este crente, que se julga cristão, está à beira
do caminho porque não procura compreender a palavra de Deus. Na verdade, não
quer compreendê-la porque sabe que a
compreensão leva ao compromisso. Comprometer-se com a palavra de Deus
continua sendo algo perigoso e arriscado porque se trata de um compromisso com
a única verdade que liberta integralmente o ser humano neste mundo. A liberdade
cristã acarreta sérias consequências.
Em
terreno pedregoso
Pessoas de
momento, vítimas da perseguição e do sofrimento costumam desistir da palavra de
Deus. É o que afirma Jesus ao falar da semente que caiu em terreno pedroso. A vida
humana acontece no terreno pedroso. São muitas as pedras que aparecem na
caminhada das pessoas. Como lidar com este tipo de terreno mostra não somente a
maturidade da pessoa, mas também o tamanho de sua fé em Jesus. Quando o cristão é inconstante, indeciso,
medroso, quando não confia na bondade e na misericórdia de Deus, facilmente
desiste da palavra e se deixa dominar pela perseguição e pelo sofrimento.
O
discípulo de Jesus possui a sua força. Jesus
partilha com seus seguidores a fortaleza do Pastor. O discípulo é aquele
que permanece de pé diante da perseguição e do sofrimento, não se deixando
dominar pela tentação da inconstância e pelo desânimo. O caminho de Jesus é
estreito e longo, e somente pode permanecer nele o discípulo ousado, alimentado
pela perseverança e pela esperança.
No
meio dos espinhos
As preocupações
do mundo e a ilusão da riqueza sufocam a palavra de Deus: eis a afirmação
categórica de Jesus. Inúmeros cristãos se encontram nesta situação. Neles, a
palavra divina não faz nenhum efeito. São cristãos estéreis, que somente
acreditam com a boca e com a inteligência. A fé em Jesus não é somente
expressão vocal e intelectual, mas confiança
e entrega experimentadas no cotidiano da vida.
Vivendo em um mundo marcado pelas inseguranças, as
pessoas se deixam dominar pelas preocupações. Vivem preocupadas com o amanhã
que não existe. As que possuem riquezas não se libertam da preocupação que
norteia suas vidas: não perder as riquezas. Mulheres
e homens de posses não tem descanso nem paz, convivem com o medo de perder
aquilo que julgam possuir. Em suas vidas não há lugar nem para pensar em
Deus.
Quanto
à palavra deste Deus, também não há tempo. O caminho para a paz se encontra
nesta palavra de vida, mas as pessoas preferem as preocupações e a ilusão da
riqueza. Aparentam felicidade, mas estão sendo corroídas por dentro, escondendo
frustrações e depressões profundas. As preocupações e a ilusão da riqueza cegam
muita gente, impedindo-as de serem verdadeiramente felizes. Para as pessoas que
vivem nesta situação, seguir Jesus é um absurdo, algo impensável.
Em
terra boa
Terra
boa é o coração livre para o amor. É o coração das
pessoas simples, humildes e despojadas; do peregrino que permanece acordado, de
pé e disponível; do trabalhador da vinha do Senhor. Neste coração a palavra
cria raízes profundas, germina e frutifica abundantemente. É uma terra boa, fértil, alegre, acolhedora, regada e fecundada pela
água do amor e pelo sol da justiça do Reino.
É
o coração do autêntico cristão: aquele que não somente deseja e tem vontade,
mas sobretudo aquele que se coloca a caminho e persevera até as últimas consequências.
Neste coração a palavra realiza a vontade divina e produz os frutos pretendidos
pelo Pai. Assim, acontece a alegria da ressurreição, a plenitude do Reino, a
salvação.
Por fim, consideremos mais algumas indagações que podem
ajudar o leitor a prosseguir na meditação da parábola do semeador: Eu
creio e aceito a palavra de Deus? Qual o lugar desta palavra na minha vida? Quais
os frutos desta palavra em minha existência? O que na minha vida impede a
palavra frutificar: medo, falta de confiança, preguiça, omissão, desinteresse, indiferença,
covardia? Sou, de fato, cristão, ou o sou somente de nome? Deixo-me conduzir
pela palavra de Deus, ou pelas minhas ambições e interesses? Sou uma pessoa
aberta ao outro, ou em tudo procuro satisfazer-me, egoisticamente? Qual tem
sido a minha colaboração para que exista um Cristianismo mais autêntico e uma
Igreja mais fraterna?
Sem
fugas, sem justificativas infundadas e sem julgamento do outro, com
sinceridade, honestidade e verdade, procuremos responder para nós mesmos estas
indagações. Que o Espírito de Deus nos ajude com sua graça em nossa caminhada em
Jesus rumo ao Pai.
Tiago de França
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