domingo, 1 de março de 2015

Escutar a palavra de Jesus

“Este é o meu Filho amado. Escutai o que ele diz!” (Mc 9, 7).

            Há inúmeros discursos e documentos que são escutados, lidos e estudados no interior da religião cristã, mas será que os cristãos estão, de fato, escutando a palavra de Jesus? É com esta pergunta que iniciamos nossa breve meditação à luz do evangelho segundo Marcos, cap. 9, vers. 2 – 10. Qual o conteúdo da palavra de Jesus e onde poderemos escutá-la? Para qual direção esta palavra aponta? Por que e como escutá-la? Estas perguntas, durante o itinerário quaresmal, chama-nos a atenção para a substancialidade do nosso seguimento a Jesus. Estamos mesmo seguindo a Jesus, ou estamos adiando este seguimento para um momento improvável de nossa vida? O texto de Marcos traz alguns aspectos importantes que ajudam em nosso discernimento.

“Mestre, é bom ficarmos aqui...”

            Diante do esplendor do Cristo transfigurado, estas foram as palavras do apóstolo Pedro. Eles estavam numa montanha. Na Bíblia, a montanha é o lugar da contemplação e da revelação. A missão do cristão não acontece na montanha, mas na planície. Na montanha se pode descansar, pensar e repensar os passos dados, os acertos e desacertos da caminhada. Pode-se também receber a Iluminação, aquela Luz que vem do alto, que fala de amor e que nos chama a atenção para a necessidade da escuta. Pedro gostou do sossego da montanha e queria ficar por lá mesmo. A tendência humana é esta: fugir do conflito da planície, refugiando-se no lugar da tranquilidade. A paz de Jesus, que o mundo não dar, deve ser conquistada em meio aos conflitos da planície. Quais os conflitos que estamos enfrentando? O que eles indicam? Como estamos lidando com eles? Como estamos superando nossas crises?...

“Ao descerem da montanha...”

            Jesus não os deixou na montanha. O texto fala que na montanha Pedro não sabia o que dizer, “pois estavam todos com medo”. Certamente, eles nada compreenderam daquilo que estava acontecendo. Nem compreenderam quando Jesus pediu segredo a respeito de tudo o que viram acontecer. Até hoje há quem não compreende e se recusa a compreender. Não é todo mundo que deseja descer da montanha. Este ato humano e ao mesmo tempo espiritual é um convite para entrar no caminho estreito e pedregoso de Jesus. É preciso vencer a tentação do medo que paralisa e das falsas seguranças que aprisionam. O poder e o dinheiro fascinam as pessoas, oferecendo-lhes prazer e conforto. São poucas as que conseguem descer da montanha para abraçar os riscos inerentes à missão. O que a maioria procura é “sombra e água fresca!” A linguagem e a realidade da cruz de Cristo lhes causam medo e pavor. A maioria assume a postura de Pedro: não quer caminhar e correr riscos, mas deseja permanecer na segurança da montanha, protegida pelas tendas construídas.

“Escutai o que ele diz!”

            Na Bíblia, escutar é obedecer. No antigo testamento, Abraão foi confirmado e abençoado por Deus porque obedeceu à palavra de Deus (cf. Gn 22, 18). E nós, hoje? O que nos tem confirmado? Nossos diplomas? Os poderes e a sabedoria deste mundo? Nossas carreiras e o prestígio oriundo delas? Nossas ambições desmedidas? Nossos projetos rigorosamente pensados? Nossos esquemas mentais? Nada disso nos justifica diante de Deus. Certamente, precisamos ter o mínimo de planejamento, em vista de uma vida minimamente organizada, mas se nos desvincularmos do projeto de Deus, nossa vida se parece com aquela folha seca, que caindo da árvore é levada pelo vento e ninguém sabe aonde vai parar. Tudo se transforma num vazio desorientador e desolador. Tudo se perde, esvai-se, evapora-se... Inúmeras pessoas já se encontram nesta situação e estão procurando respostas para compreender o que está acontecendo, mas, infelizmente, procuram respostas em lugares, pessoas e circunstâncias incertas. Nestas não há respostas.

            A palavra de Jesus está acima de toda e qualquer palavra humana. Esta é uma convicção profundamente cristã. Ele é a Palavra que permanece no seio da unidade trinitária. O encontro com esta Palavra divina é o tudo na vida do cristão. Ela é a fonte de toda conversão, de toda iluminação, da liberdade e da vida plena. Quem entra em comunhão com esta Palavra, Verbo feito carne no meio do mundo, encontra, definitivamente, o sentido da vida e a verdadeira felicidade. A partir deste encontro acontece a conversão, a mudança radical. Tudo muda, desaparece o vazio, nada falta, tudo é amor, beleza infinita. Trata-se de um mergulho nas profundezas de Deus, um caso eterno de amor. Ele se revela e cessam todas as procuras porque não há mais necessidade de nada. Viver e morrer gozando desta Presença fecunda e operante é a perfeita alegria. É evangelho. É vida plena. É tudo.


Tiago de França

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