“Assim
está escrito: ‘O Cristo sofrerá e ressuscitará dos mortos ao terceiro dia, e no
seu nome serão anunciados a conversão e o perdão dos pecados a todas as nações,
começando por Jerusalém’. Vós sereis testemunhas de tudo isso” (Lc
24, 46 – 48).
Após a ressurreição, Jesus aparece para seus discípulos,
e mesmo vendo-o, eles ficam assustados, cheios de medo e com dúvidas no coração
(cf. Lc 24, 35 – 48). Jesus deseja-lhes a paz, come peixe assado diante deles,
abre-lhes a inteligência para entenderem as Escrituras, mas mesmo assim eles
permanecem com a sensação de que estão diante de um fantasma. Este é o dilema
de inúmeros seguidores de Jesus: Demoram para realmente crer e confiar nele. Até
que ponto os seguidores de Jesus acreditam e confiam no seu Mestre e Senhor?...
Abstendo-nos de julgarmos a fé alheia, cada cristão é
chamado para pensar a respeito da própria fé em Jesus. Isto significa que
precisamos pensar nas razões que nos levam a acreditar nele. Por
que acreditamos em Jesus? Se não temos nenhuma resposta para esta
pergunta, nossa fé parece estranha. Outra pergunta que merece nossa atenção: Quais
as consequências da nossa fé em Jesus? Se cremos em Jesus e em nossa
vida não se manifestam o amor e a bondade, então nos encontramos numa profunda
contradição.
Por mais fracos e pecadores que sejamos, nossa fé em
Jesus precisa nos transformar em pessoas amorosas e sensíveis ao outro. Sem
amor não há sensibilidade nem encontro com o próximo, e sem isto não há
testemunho. É amando o próximo que o cristão se converte a Jesus, e esta
conversão o transforma numa testemunha dele neste mundo. Este é o caminho de
Jesus e não há outra forma de testemunhá-lo. No amor, o cristão se encontra com
Jesus e conhece o mistério da Trindade, que é Comunidade de amor. Esta
Comunidade se revela a todo aquele que se abre ao amor. Como disse certa vez
Jesus, o Pai, ele e o Espírito fazem morada naqueles que se abrem ao amor.
Não são os discursos inteligentemente elaborados, nem a
aparência de santidade, nem as práticas religiosas, nem o conhecimento
aprofundado das ciências da religião, nem a fidelidade ao culto e aos preceitos
religiosos que transformam o cristão em testemunha da ressurreição de Jesus,
mas somente o amor a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. Por
isso, em nossas Igrejas facilmente encontramos mestres e doutores, versados na
lei de Deus, mas que não se abrem ao amor, desconhecendo, assim, o Deus que
anunciam para os outros. Anunciam com a boca, mas seus corações estão longe de
Deus.
João, na sua 1ª Carta, diz: “Para saber que o conhecemos, vejamos se guardamos os seus mandamentos.
Quem diz: ‘Eu conheço a Deus’, mas não guarda os seus mandamentos, é mentiroso,
e a verdade não está nele. Naquele, porém, que guarda a sua palavra, o amor de
Deus é plenamente realizado” (1 Jo 2, 3 – 5). Eis, portanto, o critério
para conhecer, verdadeiramente, a Deus: guardar a sua palavra. Isto significa
que, para não sermos mentirosos, precisamos guardar a palavra de Jesus, e
guardar significa obedecer. O verdadeiro cristão deve obediência à palavra de
Jesus. Escutá-lo, e com a ajuda do Espírito colocar em prática o mandamento de
Deus: o amor.
Venceremos o ódio e a indiferença, o individualismo e a
violência, a falta de perdão e de cuidado, enfim, todos os males que assolam a
humanidade, quando tomarmos a corajosa decisão de guardarmos a palavra de
Jesus: amar sem medida, até às últimas consequências. É preciso que façamos
como ele fez: amou até o fim, até a morte de cruz. Desistir do amor é suicídio,
é entregar-se às forças da morte, é renunciar ao Reino de Deus. O Espírito do
Senhor, presente em nós e no mundo, quando por nós acolhido, nos torna capazes
do amor, libertando-nos do egoísmo e de tudo aquilo que nos aprisiona. Se
guardarmos a palavra de Jesus, escutando-o com atenção, colocando-nos a seu
serviço, o amor de Deus é plenamente realizado em nós.
Nisto se encerra o mistério pascal de Jesus: que sejamos
suas testemunhas neste mundo, mesmo que custe o derramamento de nosso sangue. Se
nos acovardarmos na omissão, afirmando que somos cristãos, na verdade, não
passamos de mentirosos. Nossa vida cristã não pode se transformar numa mentira.
Não podemos cair na tentação de sermos cristãos de nome e de aparência. Neste
sentido, enquanto membros da grande Assembleia de fieis, exorta-nos o papa
Francisco: “O mundanismo espiritual, que
se esconde por detrás de aparências de religiosidade e até mesmo de amor à
Igreja, é buscar, em vez da glória do Senhor, a glória humana e o bem-estar
pessoal” (Encíclica Evangelii Gaudium,
n. 93).
Cristãos mundanistas são aqueles que não procuram
glorificar a Deus, mas a si mesmos, utilizando-se das aparências de
religiosidade e santidade, assim como de um falso amor à Igreja. No fundo, são
pessoas maliciosas, lobos com pele de cordeiro, que não perdem a primeira
oportunidade que surge para fazer o mal ao próximo.
Somente
o amor é capaz de nos libertar do mundanismo espiritual. Este é empecilho
para testemunharmos Jesus. Nossas Igrejas e toda a humanidade precisam,
urgentemente, de sal e luz, de gosto e claridade. Em outras palavras, de
pessoas abertas e disponíveis, autênticas e acolhedoras, amorosas e
misericordiosas, alegres e dispostas a darem a própria vida na construção do
Reino de Deus. Somente assim, teremos um mundo menos corrompido, mais justo e
fraterno para todos. Esta é nossa vocação e missão.
Tiago de França
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