“Quem
não é contra nós é a nosso favor” (Mc 9, 40).
Certa vez, os discípulos de Jesus viram um homem expulsando
demônios em seu nome, e ficaram incomodados, pois o homem não fazia parte do
grupo dos Doze. Foram até Jesus para saber se podiam proibi-lo de fazer tal
coisa, mas Jesus os repreendeu (cf. Mc 9, 38 – 43. 45.47 – 48). A proibição foi
proibida. O que se passava pela cabeça dos discípulos?
Havia
uma falsa compreensão da realidade. Na mentalidade deles, o homem não poderia
curar em nome de Jesus porque não era do grupo, não tinha recebido o mandato
missionário. Até hoje é assim: Mulheres e homens não religiosos são ignorados
por não serem religiosos, por não aderirem com fidelidade às prescrições
religiosas. Muitos do que se dizem cristãos continuam ignorando a advertência
de Jesus: “Quem não é contra nós é a
nosso favor”.
À luz do testemunho missionário de Jesus, precisamos
considerar algumas questões que nos parecem importantes, em vista de uma
abertura cada vez maior de nossa visão do evangelho e da pessoa de Jesus. Vamos
pensar nas provocações que seguem.
- Jesus criou um grupo de
seguidores, não é um grupo fechado. Seguimento exige abertura. Em Jesus
não há exclusivismo nem monopólio. Seu evangelho desconhece essas expressões.
Não são expressões cristãs, apesar de constituírem uma realidade dentro do
Cristianismo, marcado por divisões. No grupo de Jesus estavam presentes
mulheres e homens simples, gente do povo. Portanto, não formavam uma elite
religiosa. Esta estava no Templo.
Jesus
não pertencia à casta sacerdotal, nem criou nenhuma espécie de classe
religiosa. Ele não teve como missão a reorganização religiosa do Judaísmo. Deus
não o enviou para isso. O grupo missionário de Jesus era formado de gente
pecadora e pobre, gente despojada e livre, destituída de poder e prestígio,
itinerante. Jesus não é o fundador de uma instituição religiosa que exclui
pessoas, mas, em nome de Deus, inaugurou o Reino, permanentemente aberto a toda
a humanidade.
- A missão de Jesus é experimentada
na clandestinidade. Jesus não reivindicou para si nenhuma função
religiosa. Isso era tão evidente, que seus opositores o consideravam uma pessoa
insignificante: De onde saiu esse homem? Com que autoridade fala e faz tais
coisas? Quem ele pensa que é para perdoar pecados? Não é ele o filho do
carpinteiro José e Maria de Nazaré? Pode sair alguma coisa boa da terra onde
nasceu? Esse homem não passa de um possuído pelo demônio!
Assim
Jesus era visto e considerado pelas autoridades religiosas de sua época. Como
era um homem livre, não se importava com tais declarações, pois estava ocupado
com a missão dada pelo Pai. Por isso, não poderia perder tempo com as picuinhas
dos sacerdotes, mestres da lei e fariseus. Estes estavam preocupados com a
manutenção do poder. Para eles, Jesus era uma ameaça, alguém que deveria ser
eliminado o mais breve possível, pois ensinava em nome de Deus na
clandestinidade, fora dos parâmetros da religião judaica.
- Jesus viveu, morreu e ressuscitou
sem oferecer nenhuma segurança humana aos seus seguidores. Os
discípulos não compreendiam a pobreza e a liberdade de Jesus. Até os dias de
hoje a pobreza e a liberdade de Jesus causam espanto e escândalo. Geralmente,
os cristãos não as aceitam. Isso ocorre porque os seres humanos vivem à procura
de seguranças: Querem uma vida segura e confortável, longe dos riscos e
perigos. Não lhes agrada a imagem da cruz. Esta foi transformada em um símbolo
religioso, foi amenizada.
Muitos
querem seguir Jesus sem carregá-la. Desejam um Cristo todo-poderoso, Deus dos
milagres e prodígios, detentor do poder e da riqueza, troféu dos vencedores
deste mundo! O Cristo dos evangelhos dá lugar ao Cristo da fantasia fértil dos
que procuram por milagres. Jesus nada tem a nos oferecer, a não ser o convite
para o seguimento e a sua presença amorosa, diuturnamente. Uma presença
gratuita, silenciosa, compassiva e escandalosamente frágil: Esta é uma verdade
inaceitável por parte de muitos.
- Quem se recusa a trabalhar pelo
Reino de Deus é contra Jesus. Dentro e fora de nossas Igrejas há os que
não querem trabalhar na vinha do Senhor. Os que assim procedem, alimentam um
Cristianismo sem compromisso efetivo. Recusam-se porque não querem correr
riscos, não querem renunciar aos próprios interesses, são pessoas apegadas,
escravas de si mesmas e das coisas deste mundo. Vivem ocupadas consigo mesmas e
com suas coisas. Sobrevivem egoisticamente nos seus mundos, criados para a
satisfação dos desejos pessoais.
Dentro
das Igrejas, muitas destas pessoas são até piedosas, estão em dia com os
preceitos religiosos, mas permanecem distantes de Jesus, pois com ele não
querem se comprometer. Constituem os “cristãos” que não o aceitam. São os
admiradores e devotos de Jesus. No mundo não religioso, são contra Jesus todos
os poderosos, que vivem explorando as pessoas, causando-lhes sofrimento e
morte. Todos aqueles que se alegram com o sofrimento do próximo são contra
Jesus, fazem as vezes de Satanás, são demônios encarnados.
Por fim, é preciso afirmar, categoricamente, que o
Espírito de Deus está trabalhando dentro e fora das estruturas religiosas
porque foi enviado por Deus a este mundo, para dar prosseguimento à missão de
Jesus. Este Espírito não obedece a ordens humanas, mas é livre e
libertador. Toda pessoa que se deixa iluminar por Ele torna-se seguidor de
Jesus, dentro ou fora das estruturas religiosas. Estas tendem a abafá-lo, mas
não conseguem aprisioná-lo. Desde os tempos antigos até os dias atuais, a
presença divina no mundo permanece livre e misteriosamente libertadora.
Deus
permanece muito além das fronteiras religiosas, pois não se enquadra em
conceitos, esquemas, projetos, projeções; não está para a mera satisfação dos
desejos incontroláveis das pessoas. O Espírito de Deus liberta de toda opressão
religiosa, de todo discurso e ação que oprimem em nome de Deus. Acima das
pretensões religiosas está a voz de Deus: Abre-te ao amor e serás salvo! Converte-te
ao amor e isto te basta! Ilumina o mundo com tua conduta amorosa! Aí
está a salvação para a humanidade em crise. Fora disso, continuaremos como
Caim, andando errantes no meio deste mundo, assinalados pela angústia e pela
desorientação.
Tiago de França
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Perfeito
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