segunda-feira, 2 de novembro de 2015

A vida na morte

Segundo São Francisco de Assis, a morte é nossa irmã. Não há quem escape dela: ricos e pobres, arrogantes e humildes, ignorantes e sábios, doentes e sãos, ateus e crentes; enfim, todos os seres vivos se encontram com a morte, que os obriga a deixar a existência material. Quer aceitemos, quer não, ela nos vem ao encontro.

Claro que não precisamos viver em função da morte, pensando nela a todo instante, mas nos faz bem vivermos reconciliados com a certeza de sua vinda. Infelizmente, há um número incalculável de pessoas que vivem ameaçados pela morte todos os dias. São os feridos em sua dignidade, padecendo pela falta de alimento, moradia, saúde, trabalho etc. Estas pessoas não tem paz porque a escassez que as ameaça lhe tirou a tranquilidade. Há uma multidão de gente atormentada neste mundo, e no meio dela há muitas pessoas desejando a morte.

            O que dizer para estas pessoas? As filosofias humanas não possuem uma resposta esperançosa. Há quem diga que é normal que uma parcela da humanidade deva viver sofrendo, sendo ameaçada constantemente pela morte. Segundo esta filosofia da morte, a vida não está para todos, mas para uma parcela da humanidade. Quem adere a esta filosofia não enxerga nenhum problema no extermínio de pessoas na África e no Oriente Médio, assim como em todo o mundo. Adolf Hitler continua tendo seus seguidores em todas as partes do mundo.

A cultura que daí surge é a da eliminação do outro. Este, uma vez excluído, tem que morrer. Deficientes, idosos, doentes crônicos, pobres que nada produzem e nada consomem, viciados no álcool e nas drogas, entre outras categorias de pessoas, são consideradas descartáveis e, por isso mesmo, devem ser eliminadas. Os jornais falam das mortes dessas pessoas e há muita gente que não vê problema nisso. Quem não vê problema algum nesse cenário de morte não pode afirmar-se cristão e, se o fizer, mente descaradamente.  

O que Jesus fala para todas as pessoas que vivem sendo constantemente ameaçadas pela morte, em decorrência das inúmeras injustiças que se cometem neste mundo? A Boa Notícia de Jesus, a este respeito, possui duas certezas maravilhosas: a primeira, consiste no fato de que Jesus permanece entre as vítimas das chacinas que se cometem no mundo. Quando os cristãos sofredores enxergam a presença de Jesus, aí já se inicia o processo glorioso da ressurreição da carne e da vida eterna.

O sofrimento e a morte ganham sentido, deixando de ser sinônimo de desgraça. A segunda certeza está intimamente ligada à primeira, que consiste na fidelidade de Deus ao seu povo. Deus é fiel e jamais o abandonará. Esta é a esperança que move a peregrinação dos que creem, dos que se encontram na caminhada rumo à plenitude do Reino de Deus.

Neste sentido, o Dia de Finados não é dia de celebração da morte, pois em Cristo Jesus a morte perdeu o seu poder, marcando apenas uma leve pausa na existência cristã. Na morte, a força de Deus se manifesta e a vida ressurge. Unidos a Jesus na morte, os cristãos participam da ressurreição.

Antes de participar da morte de Cristo, os seguidores de Jesus fazem a mesma opção que ele fez, ou seja, lutam contra as injustiças geradoras de morte no mundo. As lutas pela vida dos injustiçados já é participação na paixão, morte e ressurreição de Jesus. É nesta perspectiva, que a morte dos mártires não é sinal de derrota nem de desgraça, mas de ressurreição. Os cristãos autênticos não tem medo da morte, pois sabem que o Deus e Pai de Jesus é fiel, permanecendo com os seus filhos na morte para dar-lhes a vida.

Por fim, é preciso dizer que a morte nos recorda da transitoriedade de todas as coisas. Ela nos ensina que somos mais felizes quando vivemos despojadamente, sem nos apegarmos a nada nem a ninguém. A morte das mulheres e homens livres é suave e benfazeja. Quando apegados à riqueza, ao poder e ao prestígio, o ser humano sofre desnecessariamente com a morte, pois esta acaba com os apegos.  

Assim, a morte é a palavra final da liberdade. Uma vez morto, o homem nada possui. Em um mundo marcado pelo materialismo e consumismo, a notícia da própria morte causa angústia e medo. Para os que creem em Jesus e vivem conforme seu mandamento, “é morrendo que se vive para a vida eterna”.


Tiago de França

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