quinta-feira, 24 de março de 2016

Dom Oscar Romero, mártir

         
          Era o dia 24 de março de 1980, durante uma celebração eucarística os militares mandam assassiná-lo. O arcebispo de El Salvador, na América Central, estava exercendo a sua profecia: denunciava a ditadura dos militares, que ceifavam a vida dos pobres. Sua profecia era forte: alegria dos pobres. À luz do evangelho de Jesus, dom Oscar Romero pregava com a mesma autoridade de Jesus.  

A rádio católica transmitia suas homilias. Seu conteúdo é admirável: profundamente teológico, alicerçado na palavra de Deus e na genuína tradição de Jesus. Denunciava, com coragem e ousadia profética, as mentiras e a violência do sistema opressor. Chamado pelo papa João Paulo II para recolher-se ao silêncio omisso e pecaminoso, em nome do evangelho desobedeceu. Santa desobediência!

            Dom Oscar Romero estava consciente de sua missão, da sua entrega pelo Reino. Sabia que corria riscos. As ameaças eram constantes e quanto mais se intensificavam, mais ele proclamava o evangelho sobre os telhados de El Salvador. Parte do clero de sua Igreja particular se colocou do lado dos militares covardes e sanguinários. É sempre assim. Na Igreja de Jesus todos os ministros são enviados, mas muitos se recusam a abraçar a missão.

O medo e a covardia dominam muitos. Mesmo ungidos com o óleo santo, fecham-se ao Espírito que clama desde as profundezas das periferias do mundo. E Jesus chamou o arcebispo Oscar Romero para as periferias, para ver de perto as suas feridas nos corpos dilacerados das vítimas. E o pastor fiel do povo de Deus ouviu, se compadeceu e se aproximou para cuidar das feridas abertas com o óleo da misericórdia. Não quis imitar o sacerdote e o levita da parábola do bom samaritano. Quanta santidade!

            Diante da dor dos pobres, que sem força assistem à desmoralização política e ao risco de um golpe à democracia brasileira, perguntamos pelos pastores do povo de Deus. O que estão fazendo? O que estão falando? Como estão se posicionando? De que lado estão?... Há notas tímidas. Apoios diplomáticos. Há uma sensação de que tal situação não é coisa para religião se meter. Para que serve, então, religião? Para a realização ordenada de rituais? Para construir templos religiosos em função da arrecadação financeira?...  

Aloísio Lorscheider, Helder Câmara, Antônio Fragoso, Luciano Mendes, Ivo Lorscheider, Tomás Balduíno, Clemente Isnard... Quanta falta faz à vossa Igreja, meu Deus, estes bispos! Na Contramão do evangelho, desde o santuário da Mãe Aparecida, envergonhando o episcopado brasileiro, eis a fala de um bispo: “Irmãos e irmãs, vamos pisar a cabeça da serpente, daqueles que se autodenominam jararacas!” Posteriormente, no contexto da expressão, descobre-se que o bispo estava se referindo, em plena liturgia, ao ex-Presidente Lula, um dos presidentes da história republicana que mais ajudou na emancipação dos pobres. Quanta hipocrisia religiosa!

            Dom Oscar Romero tornou-se modelo de bispo para a Igreja pós-Vaticano II. Homem aberto à ação de Deus, cumpriu sua missão até as últimas consequências. Abrir-se à ação divina significa doar-se nas grandes causas do Reino de Deus; significa escutar o chamado de Jesus e aderir ao seu caminho: caminho estreito e perigoso; caminho de incompreensões e perseguições, de martírio e de ressurreição. Dom Oscar Romero é uma testemunha fiel do Cristo ressuscitado.

Com o barco em alto mar, não voltou atrás. Seguiu adiante e recebeu a coroa do martírio, participando da morte de Jesus e com Jesus foi ressuscitado. A sua memória permanece viva para sempre. A Igreja na América Latina tem no seu testemunho uma inspiração para continuar nas lutas do povo por libertação. Que a celebração destes dias santos na liturgia da Igreja, possamos aprender com dom Oscar Romero a sermos verdadeiros cristãos, mulheres e homens ressuscitados, anunciadores da Ressurreição de Jesus desde a realidade das vítimas que, diuturnamente, clamam por justiça em todas as partes do mundo.

Tiago de França 

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