domingo, 22 de janeiro de 2017

Algumas reflexões sobre a morte do Ministro Teori Zavascki

         Para quem estuda o Direito e conhece um pouco a situação do Poder Judiciário do Brasil, a morte do Ministro Teori Zavascki é motivo de preocupação. Quando soube da sua morte, logo pensei: Teori Zavascki morto em um acidente, durante a análise de centenas de depoimentos de delação premiada, as últimas da Odebrecht? Muito estranho!...

        Seria uma injustiça afirmar que tenha sido algum dos citados nas delações, ou algum dos réus da operação Lava Jato, que teria mandado matar o Ministro. Seria precipitado. Não ouso tal afirmação. Talvez as investigações cheguem a esta hipótese. Digo talvez porque as investigações no Brasil, muitas vezes e propositadamente, não chegam a lugar nenhum. Isto depende de quem é investigado. Todo brasileiro de bom senso sabe que no Brasil é assim.

        Há unanimidade de opinião quanto à atuação do juiz Teori Zavascki: era um magistrado sereno, discreto, justo, corajoso, imparcial, competente e firme. Suas decisões no exercício da magistratura no Supremo Tribunal Federal (STF) eram respeitáveis. Providencialmente, a relatoria dos processos da operação Lava Jato caiu em suas mãos. Os corruptos e corruptores processados na Lava Jato não ousavam influenciá-lo porque não encontravam brecha para isso. Um dos processados, senador Romero Jucá, do PMDB, o chamou de “cara fechado”.

        Um juiz sereno. A serenidade é uma virtude que deveria fazer parte da vida de todos os juízes brasileiros. Um juiz sereno consegue enxergar a realidade com clareza porque sabe permanecer em silêncio diante dela. A serenidade não nos deixa intimidar por nada nem por ninguém, pois é companheira da firmeza, da postura de pessoa que não se deixa enganar por ninguém. Do contrário, uma pessoa agitada não consegue enxergar a riqueza dos detalhes que constituem a realidade. A leitura das decisões do Ministro Teori revela a profundidade da análise de um homem sereno.

        Um juiz discreto. A discrição é outra virtude que integrava a personalidade do Ministro Teori. Diferentemente de muitos de seus colegas na magistratura, não tinha necessidade de chamar a atenção para si. Sabia ser discreto. A sua preocupação era trabalhar o processo. Só falava nos autos. Diante do exibicionismo de alguns juízes, defendia a necessidade do juiz falar nos autos. No âmbito da operação Lava Jato, fez questão de corrigir o exibicionismo do juiz Sérgio Moro, que, desde o início da operação, não se cansa de viajar para os EUA, para falar de si mesmo.

        Um juiz justo. Todo jurisdicionado espera que todo juiz seja justo. Se fizermos uma análise de inúmeras decisões judiciais no Brasil, veremos que a justiça está ausente. A parcialidade de muitos juízes é vergonhosa e assustadora, constituindo uma verdadeira ditadura judicial. Os mais leigos entre os brasileiros conseguem enxergar com clareza a parcialidade de muitos juízes. Infelizmente, assistimos à injustiça sendo cometida por homens que são revestidos para assegurar a justiça. Se o Judiciário comete o crime contra o cidadão, a quem este poderá recorrer?... Após sua morte, o Ministro Teori continua sendo elogiado por ter feito justiça às pessoas.

        Um juiz corajoso. O medo é um mal avassalador. No Judiciário não deveria existir juízes medrosos, que tem medo de aplicar a lei. O Ministro Teori teve a coragem de mandar prender senador, banqueiro e empresário. Quantos juízes no Brasil tem coragem de mandar prender um banqueiro? Quantos juízes no Brasil tem coragem de suspender o mandato de um deputado como Eduardo Cunha? No STF, o Ministro Teori demonstrou a necessidade da coragem para o exercício honrado da magistratura. Nas pequenas e médias cidades do interior do Brasil, inúmeros juízes tem medo de julgar e condenar políticos e empresários que roubam e exploram os pobres do povo. Infelizmente, o que ocorre em inúmeros casos é o réu oferecer almoço e janta ao juiz que julga a sua causa, numa demonstração de apreço e amizade.

        Um juiz imparcial. A imparcialidade do juiz é um pressuposto processual importantíssimo sem o qual não é possível promover a justiça. Todo cidadão acusado tem direito a ser ouvido por um juiz imparcial. A imparcialidade garante a legalidade do processo, bem como o seu justo resultado. A parcialidade de muitos juízes é tão explícita no Brasil, que as pessoas já não mais se escandalizam. A situação é tão descarada que juízes parciais emitem juízo de valor sobre processos em andamento. Há também aqueles que antecipam a sua decisão antes mesmo do processo ser instaurado.

Contra esta situação não há punição. E todos repetem a velha expressão, marca da sociedade acostumada à impunidade: “Vai ficar por isso mesmo!” As decisões de um juiz revelam a sua imparcialidade. Qualquer pessoa, no uso do bom senso, conhece uma decisão contaminada pela parcialidade. O Ministro Teori ganhou o reconhecimento de todos pela sua imparcialidade, pois aplicava a lei sem se preocupar se estava ou não agradando às pessoas.

Um juiz competente. Um dos grandes dilemas da magistratura brasileira é a incapacidade de muitos juízes. Se fizermos uma leitura de algumas sentenças e acórdãos, veremos o escândalo das decisões. Qualquer leigo logo pergunta: Como foi que esse juiz conseguiu passar no concurso público? Alguns juízes mal dão conta do básico da gramática da língua portuguesa! Boa parcela não sabe escrever uma sentença, delegando esta atividade que lhe é privativa a um estagiário, ou a um assessor. A preguiça e a incompetência tem comprometido seriamente a prestação do serviço jurisdicional.

Neste sentido, juízes preguiçosos e incompetentes tem criticado bastante a ênfase que o Código de Processo Civil (CPC) de 2015 deu à obrigatoriedade da fundamentação das decisões judiciais. Trata-se de uma exigência constitucional reforçada pelo novo CPC. O Ministro Teori era muito respeitado pela excelente qualidade do serviço prestado, dada a sua capacidade no domínio da técnica processual. Suas decisões eram profundas e, portanto, muito bem fundamentadas.

Um juiz firme. A firmeza é a qualidade de quem faz bem feito e não precisa voltar atrás. Não é qualidade dos indecisos, dos frouxos e dos medrosos. Um juiz firme é aquele que possui profunda convicção daquilo que faz, pois sabe o que está fazendo. Não é alguém manipulável. A firmeza faz o juiz manter a sua decisão porque tomada com a devida prudência, análise e clareza. Somente quem tem convicções profundas da missão que exerce é que é firme no exercício de seu ofício. O Ministro Teori tinha convicção de sua missão no Poder Judiciário. Sabia muito bem das repercussões de suas decisões. Conhecia com profundidade a necessidade da justiça em um País marcado pelas injustiças, e usava a firmeza em suas decisões.

Estas qualidades mostram que o Ministro Teori fará falta não somente ao STF, familiares e amigos, mas, sobretudo, à promoção da justiça no Brasil. Permanecerá como exemplo para todos aqueles que já se encontram nos quadros da magistratura, bem como para os que desejam ser juízes. O Ministro Teori não foi um herói nacional. Nisso discordamos da opinião do juiz Sérgio Moro. O Brasil não precisa de heróis, mas de mulheres e homens que desempenhem suas funções sem se deixar corromper, pois a corrupção sistêmica é uma das marcas do nosso País.

Aos estudantes de Direito, que desejam atuar no Poder Judiciário, fica o apelo: O povo precisa de juízes íntegros e aplicados, que promovam a justiça e, consequentemente, o bem comum. Este mesmo povo já está cansado de sofrer com um Judiciário lento e tendencioso, que tende a reforçar o poder dos opressores. A idoneidade precisa prevalecer. Por um Judiciário forte e livre, basta de corrupção! Esta é a nossa esperança.

Tiago de França


Professor, bacharelando em Direito pela Escola Superior Dom Helder Câmara.

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