“Eu
vos digo: Se a vossa justiça não for maior que a justiça dos mestres da Lei e
dos fariseus, vós não entrareis no Reino dos Céus” (Mt
5, 20).
A justiça é um tema muito caro à Sagrada Escritura. Deus é
Justo e Bom: eis a revelação que esta Escritura nos faz conhecer. Somente Deus
goza plenamente desses adjetivos. E é assim porque o próprio Deus é a plenitude
da justiça e da bondade. Pela fé, o crente participa da bondade e da justiça
divinas. Esta participação torna-o membro do Reino de Deus. Pela graça, Deus
envolve seus filhos e filhas numa comunhão plena, fazendo-os conhecer o sentido
e o alcance do seu amor, da sua bondade e justiça. Esta é a dinâmica da
participação do crente no belíssimo mistério que se revelou na história da
salvação.
Qual o conteúdo da justiça do Reino de Deus? Na vida cotidiana, qual a
repercussão prática da crença nesta justiça? A realidade do mundo atual
carece de mulheres e homens dispostos à prática da justiça do Reino de Deus. Em
primeiro lugar, é preciso considerar que não estamos falando da justiça dos
homens: imperfeita e, muitas vezes, tendenciosa. A justiça divina tem a marca
da perfeição e da misericórdia. Deus não é um Juiz impiedoso, mas um Pai amoroso
e justo, paciente e misericordioso. Sua lei é o amor, e sua justiça consiste na
prática deste amor.
O que a justiça do Reino de Deus fala ao cristão atual? O cristão
atual está rodeado pela tentação do desvio e da descrença. O desespero tem
tomado conta do mundo. Há uma enxurrada diária de más notícias, que vai tirando
a esperança do coração de inúmeras pessoas. O sistema capitalista está cada vez
mais seduzindo e coisificando as pessoas. Poucas conseguem escapar de suas
garras.
A maioria
da humanidade está dominada pelo vírus da sede de poder, prestígio e riqueza. Geralmente,
procuram tudo, menos a justiça do Reino. Apegam-se a tudo, e abandonam o amor. Há
muita morte por sufocamento: as pessoas morrem sufocadas em um estilo desumano
de vida, alicerçado no consumo e no apego a sentimentos ruins, situações
conflituosas e bens materiais supérfluos. No plano das relações interpessoais,
ser justo significa reconhecer o lugar do outro, vendo-o e tratando-o como
amigo e companheiro de caminhada, não como um inimigo a ser eliminado. A justiça
divina nos ensina a superarmos a cultura da eliminação do outro.
O que a justiça do Reino de Deus fala às pessoas enquanto membros do
corpo social? A missão cristã no mundo é essencialmente política. Não falamos
da política partidária, que tem a sua importância quando bem praticada. Mas falamos
da política como participação crítica e pacífica nos rumos da vida social. Tomar
a decisão de não participar da dimensão política da vida em sociedade é uma
decisão que descreve a antipolítica. Portanto, uma escolha que representa
verdadeiro desserviço ao corpo social.
Todo
cidadão é chamado a exercer a sua cidadania, e este exercício passa, necessariamente,
pela participação na vida social. Para sermos cristãos justos na sociedade não
podemos fugir da política. Na verdade, ninguém consegue tal intento. Ao nascermos
numa sociedade pré-estabelecida já nos tornamos sujeitos políticos, agentes
políticos, mulheres e homens da ação política. Em sociedade, esta é a missão do
cristão. Negar-se a esta missão é um pecado gravíssimo. Trata-se de um pecado
muito superior a tantos outros reconhecidos como graves no seio da vida
eclesial.
Por fim,
cabe-nos perguntar: O que a justiça do Reino de Deus, revelada em Jesus de Nazaré, tem a
dizer às Igrejas e/ou denominações religiosas que formam o Cristianismo?
Infelizmente, precisamos reconhecer, com toda a humildade, que nossas Igrejas
estão ocupadas com a própria sobrevivência. Todos os esforços estão concentrados
na obsessiva preocupação pela sobrevivência das instituições religiosas. A todo
custo procura-se salvá-las. Enquanto isso, a mensagem de Jesus fica
marginalizada. O que fizeram com a mensagem de Jesus? Ocultaram-na,
transformando-a noutra coisa. Há pouco anúncio, e muito proselitismo religioso.
Na
Igreja Católica, o Papa Francisco tem apontado para o coração da mensagem de
Jesus: o Reino de Deus. O Papa tem falado do amor, da justiça e da misericórdia
de Deus. É incansável na missão de promover a unidade cristã, respeitando a
pluralidade das expressões religiosas. Tem anunciado a Boa Notícia do Amor. Suas
palavras e gestos falam da bondade de um Pai que abraça a todos, especialmente
os pecadores arrependidos. Mas nesta mesma instituição religiosa, há aqueles
que acham que o Papa, com estas atitudes, que são as mesmas de Jesus de Nazaré,
está cometendo heresias.
Há quem
esteja fazendo uma verdadeira campanha para tentar deslegitimá-lo. Na Europa e
em outros lugares, há até cardeais que tem participado desta campanha
diabólica. Os filhos de Deus promovem a unidade, e os que seguem o diabo
promovem a divisão e a confusão no seio do povo de Deus. Sempre foi assim,
desde os tempos antigos. O diabo é o pai da mentira e da divisão, e todos
aqueles que semeiam mentira e confusão são seus filhos. Este foi o ensinamento
deixado por Jesus segundo o que está escrito no evangelho de João. Na comunidade
eclesial, o cristão é chamado a praticar a justiça do Reino, amando a Deus e ao
próximo, seja este quem for, pois todos, sem exceção, são filhos e filhas de
Deus em Cristo Jesus na força do Espírito Santo.
Tiago
de França
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