Jesus revelou a verdadeira
imagem de Deus. Aliás, mais que uma imagem, revelou a verdadeira face de Deus. E
o que revelou? Que Deus é amor. O Pai, o Filho e o Espírito Santo formam a
Comunidade do Amor. O amor é como que o conteúdo que dá existência ao mistério
do Deus Uno e Trino.
Deus
não existe fora do amor porque é amor. Ele somente sabe amar e é incapaz de ter
e alimentar ódio de suas criaturas e do homem, criado à sua imagem e
semelhança. No mistério da Trindade todas as coisas são regeneradas e
recriadas. Enquanto amor, Deus recria todas as coisas, impedindo que pereçam.
A revelação bíblica, do Gênesis ao Apocalipse, mostra tudo o
que existe foi criado por amor, pelo amor e para o amor. Portanto, toda a
criação tem a sua origem no amor e terá o seu fim no amor. Sendo amor, Deus
está no começo e no fim; Ele é a fonte da vida, seu sentido e seu fim. Acolher o
mistério da Trindade é reconhecer Deus como infinito amor, doação plena, fonte
da vida, alegria da criação, felicidade sem fim.
Acolher
o mistério da Trindade, o Amor por excelência, também significa experimentar na
vida este mistério de amor. Somente quem ama conhece a Deus. Por isso, para
compreender o mistério da Trindade é preciso amar; amar na verdade e na liberdade,
até às últimas consequências. Não há outro caminho.
O amor revela a dinâmica do mistério da Trindade. Mas como
amar? Há uma forma própria de amor, para se alcançar o conhecimento deste
mistério insondável? A resposta é positiva. É preciso amar como Jesus amou:
na verdade, na liberdade e na opção pelos últimos. É verdade que não há
neste mundo alguém que possa amar tão perfeitamente como Jesus amou. Somos pecadores
e amamos a partir de nossas imperfeições.
Mas é
verdade também que o amor de Deus é mais perfeitamente praticado quando
reconhecemos as nossas imperfeições, pois a graça de Deus se manifesta a partir
de nossas fraquezas. Deus manifesta seu amor quando, humildemente, diante dele,
assumimos a nossa realidade pecadora e clamamos a sua misericórdia.
Amar como Jesus amou é doar-se no serviço ao próximo: os pais
se doam quando assumem com responsabilidade a criação e educação dos filhos; o
professor se doa na difícil arte de lecionar quando desperta a consciência
crítica de seus alunos; o político se doa quando não desvia o dinheiro público,
visando sempre o bem comum; os empregadores se doam quando respeitam seus
empregados, assegurando-lhes e promovendo-lhes os direitos trabalhistas; o
líder religioso se doa quando não usa do ofício religioso para ser servido, mas
empenha-se a dar a própria vida pela vida do rebanho do Senhor; enfim, amar
como Jesus amou é doar-se, é sair de si na direção do outro, é amar a Deus
sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo.
Pessoas egoístas são incapazes de conhecer e experimentar o
mistério da Trindade, portanto, incapazes de amar a Deus e ao próximo. O egoísta
somente enxerga a si mesmo e em tudo busca satisfazer seus próprios interesses.
Não sabe o significado prático da palavra doação. Para ele, doar-se é fazer
papel de tolo. O mundo está cheio de pessoas egoístas, que usam da esperteza
para se aproveitar dos outros.
Com muita
facilidade, os egoístas se deixam corromper porque, em suas vidas, em primeiro
lugar está seu próprio bem e não o bem comum. Enxergam a vida como um campo
vasto de possibilidades para a satisfação de seus objetivos e sonhos pessoais. Não
se importam com o bem comum, pois acreditam que todas as pessoas são “átomos de
egoísmo” e que cada um deve se virar como pode, sem a colaboração dos outros,
fora do espírito da verdadeira fraternidade.
Não se vive o amor, que revela o mistério trinitário, no
isolamento. Neste não há amor. Pessoas isoladas não amam. O verdadeiro amor não
existe em função da própria pessoa. Em outros termos, ninguém nasceu neste mundo
somente para amar a si mesmo. Na verdade, não há amor a si mesmo sem
amor ao próximo. O amor só existe em função do outro.
Amar
é abrir-se ao outro. Quem despreza o próximo jamais pode dizer que ama e
conhece a Deus. Tal declaração seria mentirosa. É neste sentido que o apóstolo
João afirma que todo aquele que diz que ama a Deus e não ama o próximo é
mentiroso (1 Jo 4, 20). Não se ama a Deus odiando o próximo. Quem assim procede
está na mentira, jamais na verdade.
Nas Igrejas cristãs encontramos muita falta de amor: pessoas
sendo desprezadas, humilhadas, excluídas, julgadas e condenadas. Em matéria
religiosa, teologicamente falando, não se pode afirmar que a acolhida do Amor
passa, necessariamente, pelo cumprimento fiel das normas e regras religiosas. Jesus
não pediu a instauração de normas e regras, mas ensinou a amar. A prática
do amor exige, muitas vezes, a desobediência de normas e regras religiosas.
O próprio
Jesus, para amar e ensinar o mandamento do amor, teve que desobedecer a vários
preceitos religiosos do Judaísmo. Um exemplo clássico para ilustrar nossa
meditação: diante da mulher pega em flagrante adultério, a lei mandava apedrejá-la
em praça pública (cf. Jo 8, 1 – 11). E o que fez Jesus? Ensinou que a lei
orientava o oposto do amor. Ensinou a amar aquela mulher porque a sua salvação
estava no amor. O amor restaura o pecador, não as penas da lei.
Neste sentido, o Papa Francisco tem feito um bem enorme à
Igreja e à humanidade, quando exorta às pessoas de fé, bem como aquelas
mulheres e homens de boa vontade que não são católicos nem cristãos, a
acreditarem no amor. Acertadamente, fiel ao Evangelho de Jesus, o Papa tem
chamado a atenção para o valor da vida e do amor. Em seus escritos, discursos e
gestos, tem insistido na necessidade do amor. Torna-se cada vez mais urgente
amar o próximo e a natureza, frutos da generosidade divina.
Quem
ama não faz mal a ninguém porque reconhece que o mal é incompatível com o amor.
Quem ama somente pode fazer o bem. Assim, o amor é a vocação primeira de todo
ser humano. O amor ultrapassa os limites das culturas e religiões. Não há
humanidade sadia sem o amor, não há pessoa humana fora do amor. Desprovida de
amor e desprezando-o, a espécie humana se torna a mais perigosa, com infinito
potencial destruidor da vida no mundo.
Acreditar em Deus é crer no amor. E quem crer no amor vive
segundo o amor. E quem vive segundo o amor conhece a Deus, encontrou a paz e é
feliz. Quem ama experimenta, de fato, a vida. É o amor que nos dá a certeza de
que a passagem neste mundo não é sem sentido. Quem se fecha à possibilidade do
amor, que constitui o sentido da vida, realmente não vive, mas apenas ocupa
lugar no espaço. A vida no mundo depende do amor. Quem não ama já perdeu a vida,
apenas espera a morte fazer desaparecer o corpo.
Quem
ama não morre, mas mergulha no reino da liberdade e da vida sem fim. Quem ama
se torna morada da Trindade e torna-se, com Ela, um só mistério de amor. Não há
palavras para descrever esta comunhão de amor. Quem quiser
conhecer, precisa experimentar. É uma experiência linda de viver!
Tiago de França
Um comentário:
Linda leitura bastante profunda
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