segunda-feira, 22 de outubro de 2018

FERNANDO HADDAD E A DEMOCRACIA

       
       Quem viveu a ditadura e escapou da morte nunca pensava que haveria sequer a hipótese daqueles anos de horrores se repetirem no Brasil. Essa quase certeza é a que sai da boca dos que sobreviveram.

        Nasci em 1984 e não me recordo da ditadura, porque um ano após ela chegou ao seu fim, oficialmente. O povo foi às ruas e reconquistou a democracia. Dizer que os militares se cansaram do poder e resolveram devolvê-lo aos civis é uma mentira mal contada. A democracia foi reconquistada à custa de muita perseguição e sangue.

        Como não vivi este período, restou-me ler bastante sobre este tempo vergonhoso da nossa história. Os militares tomaram o poder, prometendo colocar o Brasil em ordem. Diziam também que iriam promover o progresso. Quando isto já não bastava para enganar as pessoas, então inventaram a ameaça do comunismo. Em nome do combate ao comunismo muita gente foi perseguida, presa, torturada e morta. Até hoje há gente desaparecida. Ninguém sabe do paradeiro.

        A ditadura militar, período que vai de 1964 a 1985, representa uma pausa demorada e sangrenta da nossa história. Tudo pode ser devidamente estudado. O material é farto. Os livros de história registram os horrores da ditadura. Somente uma pessoa muito preguiçosa e desinteressada pela história é capaz de negar que a ditadura existiu.

        Nas eleições deste ano, temos um capitão da reserva do exército, que se aventurou no mundo da política nacional. Depois de ter sido praticamente expulso do exército, resolveu ingressar na política. A sua sorte é que encontrou um número significativo de eleitores pouco informados, que caíram na sua lábia. Este capitão virou deputado, e há 28 anos vive à custa do Estado, sem ter feito praticamente nada.

        Sempre foi um político insignificante. Na Câmara dos deputados sempre foi motivo de piada. Nunca liderou nada, nem nunca fez nada sequer pelo seu estado, o Rio de Janeiro. Simpatizante das armas e da bandeira da segurança pública, qualquer pessoa pode pesquisar sobre alguma coisa que ele tenha feito pela segurança pública, e nada encontrará. Literalmente, não fez nada.

        Quando este capitão, mal-educado e de espírito exaltado, percebeu que a maioria dos brasileiros caiu no desespero, então ele entrou em cena. Começou a pensar frases de efeito para impressionar as pessoas. Como a violência é um dos grandes problemas que afligem os brasileiros, então ele resolveu investir em frases de efeito com o tema da violência: “Bandido bom é bandido morto!”, “Lugar de bandido é na cadeia!”, “Vamos meter bala nos vagabundos!”, “O Brasil acima de tudo, Deus acima de todos!” etc.

        Qualquer eleitor poderá perguntar: Qual a proposta do capitão para resolver o problema da violência? Como esta proposta será implementada? A resposta é muito simples: Não há proposta, e não havendo, não se sabe como ele resolveria o problema da violência. Qualquer pessoa de bom senso sabe que não se resolve o problema da violência matando pessoas. Matar pessoas é crime tipificado na lei penal.

        O desespero aliado à ignorância de grande parcela da população são elementos que ajudam o capitão a gozar da simpatia de muitos eleitores. A alienação chegou em um grau tão acentuado, que as pessoas já não querem nem saber se ele tem ou não propostas. Ter projeto claro e bem explicado deixou de ser critério. Portanto, a candidatura do capitão é vazia de ideias e propostas, e repleta de jargões e ameaças.

        As falas e gestos do candidato do PSL são provas cabais de antidemocracia. Ele não aceita o regime democrático, mas quer ser eleito Presidente. Trata-se de uma aberração possível. Pública e explicitamente, o capitão fala que a maioria tem que se sobrepor às minorias, massacrando-as. Ele é contra a regra democrática de que o Brasil deve ser um País de todos. Defensor da ditadura militar, prega o ódio e a perseguição aos fracos e empobrecidos.

        Um Presidente da República é eleito para governar para todos e para o bem-estar de todos. Não seria o caso do capitão, porque os negros, as mulheres, os índios, os homossexuais, os pobres e os demais opositores devem ser perseguidos e excluídos. Esta é a visão do candidato Bolsonaro. Ele sempre maltratou estas pessoas. E o pior é que muitas delas se identificam com ele, e declaram que vão votar novamente nele. Essas pessoas aderiram a uma espécie de suicídio coletivo.

        Outra novidade que apareceu com força nas eleições deste ano, que favorece o capitão, é o apoio maciço de protestantes e católicos que se identificam com o discurso da violência. São pessoas que, ignorando o Evangelho de Jesus, que prega a justiça e a paz, resolveram defender a tortura praticada na ditadura militar, entre outras bandeiras contrárias ao que ensina Jesus, defendidas pelo candidato Bolsonaro. Este se declara cristão, mas os fatos comprovam que ele é cristão só de nome. A sua prática, fundamentada no discurso da eliminação dos outros é totalmente contrária aos ensinamentos bíblicos e cristãos.

        É neste sentido que Fernando Haddad representa a única saída para que a democracia continue sobrevivendo no Brasil. Haddad não é da extrema-esquerda e a sua biografia não consta de participação em circunstâncias gravemente comprometedoras como as que aparecem na biografia sombria do capitão Bolsonaro. Haddad é um democrata, conhecedor da lei e da ciência política; um advogado e professor respeitado, defensor do estado democrático de direito.

        É verdade que o Haddad integra um partido político que cometeu muitos erros. Um partido político muito perseguido pela grande mídia brasileira, por setores importantes do Judiciário e por opositores antidemocráticos. Apesar dos erros do partido, ninguém, em sã consciência, pode negar a valiosa contribuição que os governos petistas deram para o aprimoramento da democracia brasileira, e para a melhoria de vida dos mais pobres do povo brasileiro, de 2003 a 2016.

Quem conhece da lei, principalmente a Lei do Impeachment, também não nega que o PT foi expurgado do poder via golpe parlamentar. Não houve crime de responsabilidade, e desse modo o rito de impeachment, previsto na Constituição de 1988, foi covardemente transformado em golpe parlamentar. Isto está devidamente registrado em nossa história republicana recente, e ninguém mudará isso.

Nesta hora difícil da nossa história, em que as instituições democráticas estão sendo gravemente ameaçadas por uma candidatura que tem o apoio das Forças Armadas, do mercado financeiro e dos grandes empresários do País, todo brasileiro de bom senso precisa agir. Não adianta esperarmos para que o Judiciário, no cumprimento da lei e por meio da investigação rigorosa, tome providências em relação aos abusos que estão sendo cometidos nestas eleições. Não adianta esperar porque não vai ocorrer.

O bom senso pede, se quisermos preservar a democracia, que se encontra em um estado agonizante, que elejamos Haddad Presidente da República. O PT praticou muitos erros, mas nunca ousou ameaçar o estado democrático de direito. Nunca ameaçou instalar o regime comunista entre nós. Se houvesse esta pretensão, já teria feito desde 2003.

O PT respeita as regras do jogo democrático e a elas se submete. Negar isso é uma covardia. Se permitirmos que Jair Bolsonaro chegue ao poder, aí, sim, teremos que suportar um governo hostil, inimigo dos direitos humanos e do meio ambiente, covardemente agressivo e que tenderá a permanecer por muitos anos.

Eu, com minhas críticas ao PT, me recuso, terminantemente, a me omitir nesta hora, pois sou brasileiro, amo o meu País, e desejo que a liberdade continue sendo a regra de nossa convivência social, apesar de ameaçada por todos os que se colocam nas fileiras do crime. Em nome desta liberdade e do que ainda resta de democracia, caro leitor, eu lhe peço, vote 13.

Se você votar em Jair Bolsonaro, certamente será responsável pelo que ele pretende fazer com o nosso pobre e sofrido povo. Não pense somente em você. Você integra o País. Seja patriota, pense no Brasil. Seja a favor da democracia, e contra as ameaças do faço. Vote 13 para o Brasil continuar trilhando o caminho da esperança.

Ninguém merece a instauração do caos e de uma nova ditadura. Ditadura é a morte da democracia, e Jair Bolsonaro não defende outra coisa senão a violência gratuita contra os fracos e empobrecidos. Isto é sinal evidente de uma ditadura. Nós não temos o direito de nos omitir. Urgentemente, precisamos salvar a democracia em nosso País.

Prof. Tiago de França

sábado, 20 de outubro de 2018

A REDESCOBERTA DA MISSÃO CRISTÃ


“Ide por todo o mundo, proclamai o Evangelho a toda criatura” (Mc 16, 15).

        Neste domingo, 21 de outubro, a Igreja Católica celebra o Dia Mundial das Missões. No Brasil, estamos caminhando para o segundo turno das eleições gerais. Em alguns estados teremos eleição para governador; no país inteiro, milhões de brasileiros irão escolher o futuro presidente da República. Precisamos pensar o tema da missão a partir desta realidade, pois não há missão desvinculada da realidade. Não se fala de questões espirituais, desvinculando-se da dimensão material e humana. A missão ocorre no mundo, e não fora dele.

        Queremos, brevemente, relacionar o tema da missão, fazendo referência à forma como muitos cristãos estão se comportando durante estes dias que antecedem as eleições. Causa-nos espanto e vergonha a forma como muitos “crentes” em Jesus andam se comportando, principalmente nas redes sociais. Diante de comportamentos escandalosos, nos debruçamos sobre possíveis conclusões para a seguinte indagação: Qual, afinal de contas, é a missão do cristão no mundo? Os cristãos se reconhecem, de fato, como discípulos missionários de Jesus? Pensemos estas questões.

        Cremos que precisamos redescobrir a missão do cristão, e esta redescoberta passa, necessariamente, por uma volta ao Evangelho de Jesus. Não há cristão sem Cristo. Não há missão sem comunhão com Cristo. É o Cristo Jesus o centro da missão. É ele o modelo de missionário por excelência. Portanto, a missão é um tema fundamental para compreendermos o papel do cristão na sociedade e nas Igrejas. Qual o sentido da missão? Como ser missionário de Jesus hoje? São questões que nos levam ao coração do Evangelho de Jesus. Precisamos enfrentá-las para nos libertarmos da repetição vergonhosa dos escândalos.

        Voltar ao Evangelho é buscar compreendê-lo. Mas o que significa compreender o Evangelho? Um renomado teólogo da Igreja assim se pronunciou em uma de suas obras: “Compreender o Evangelho é vivê-lo de novo, reinventá-lo a cada situação que surge, recebê-lo como resposta a uma interrogação da vida no presente” (José Comblin, in Evangelizar, editora Paulus, 2010, p. 7). Viver o Evangelho é um desafio possível, que exige renúncia e despojamento. Renúncia a tudo aquilo que é contrário ao amor, à justiça, à liberdade e à comunhão com Deus.

        Pode um cristão viver o Evangelho sendo favorável à tortura e à pena de morte? Pode um cristão viver o Evangelho desejando a morte de seu semelhante? Pode um cristão viver o Evangelho sem o amor a Deus e ao próximo como a si mesmo? De jeito nenhum. Para viver o Evangelho é preciso abrir o coração para Deus, desarmar-se, colocar-se no caminho de Jesus. Sem adesão a Jesus é impossível viver a sua mensagem. Evangelho é Boa Notícia. Então, como podemos viver o Evangelho, se a nossa vida é motivo de escândalo e confusão? Precisamos pensar seriamente estas questões, se não quisermos viver de aparência.

        Reinventar o Evangelho a cada situação que surge não é mudar-lhe o sentido original. E qual é o sentido original da Boa Notícia de Jesus? O amor. Em toda situação é preciso viver o amor. Ser amoroso é a condição fundamental que aponta para a autenticidade da vida cristã. Um cristão que não é amoroso é um mentiroso, é uma lástima. Neste sentido, pode o cristão dizer que tem fé em Jesus e, ao mesmo tempo, odiar o próximo e, assim, reforçar a cultura do ódio e da eliminação dos outros? Claro que não.

        A vida nos questiona e nos coloca diante de desafios aparentemente intransponíveis. Mas o cristão sabe que a resposta para o sentido da sua vida está no Evangelho de Jesus. É neste Evangelho que encontramos a luz que nos ilumina em meio às trevas do mundo. Iluminados pelo Evangelho, os cristãos trilham o caminho da justiça e da paz, tornando-se construtores de uma humanidade nova. Desse modo, perguntamos: a conduta violenta de muitos cristãos é sinal de construção de uma humanidade renovada? Pode a violência ser considerada uma ferramenta que constrói a justiça e a paz? A violência constrói alguma coisa, ou somente conduz à destruição e à morte?

        Nunca é tarde para tomarmos a decisão que confere um novo sentido à vida: Estamos dispostos a aceitar o Evangelho de Jesus como orientação fundamental da nossa vida? Ou vamos continuar aparentando que somos cristãos? Quem escolhe e acolhe Jesus renuncia à violência que escandaliza e mata. Não é possível crer em Jesus e, ao mesmo tempo, cultivar o ódio e a cultura da morte. O Evangelho de Jesus exige decisão, atitude de vida, coragem para caminhar com ele. Ou estamos com Jesus e promovemos a justiça e a paz, ou nos colocamos contra Jesus e nos colocamos a serviço do reino das trevas.

        A missão do cristão no mundo é viver o Evangelho. É assim que este Evangelho é anunciado: com o testemunho fecundo da vida cristã. Não adianta abrir a boca e levantar os braços para invocar o nome de Jesus, e na vida cotidiana praticar o oposto do que ensina este mesmo Jesus. O mundo não precisa de falsos cristãos que praticam um falso cristianismo. O testemunho de um cristão deve ser sinal de justiça e paz. A vida de quem segue Jesus deve ser sinal de unidade, comunhão, compromisso com a bondade e a liberdade, preenchida do amor que abraça a todos, sem distinção de pessoas.

        Nestes dias, temos observado um gravíssimo testemunho por parte de muitos cristãos nas redes sociais. Pessoas que frequentam as Igrejas, participam do culto, invocando o nome de Deus, mas que nas redes sociais manifestam preferências políticas que são claramente contrárias ao Evangelho de Jesus. Além da manifestação equivocada de um projeto de poder que fere a dignidade de milhões de pessoas, tais pessoas que se dizem cristãs ainda se ocupam com calúnia, difamação e injúria contra o próximo. Tais condutas desagradam a Deus, porque não foi isso que Jesus ensinou e pediu aos seus seguidores.

        Neste sentido, muitos cristãos e líderes religiosos precisam repensar a fé que tem em Jesus. As Igrejas cristãs precisam também repensar o seu trabalho de evangelização. À luz do Evangelho, sabemos que existe a fé e a aparência de fé. O que temos visto e ouvido é muita aparência de fé. Há muita falsidade e dissimulação. A estes, que insistem neste estilo vergonhoso de contratestemunho, diz Jesus: “Nem todo aquele que me diz ‘Senhor, Senhor’ entrará no Reino dos Céus, mas sim aquele que pratica a vontade de meu Pai que está nos céus” (Mt 7, 21).

Praticar a vontade do Pai é viver o Evangelho de Jesus. Não faz a vontade de Deus quem faz opção por um projeto político de poder capaz de gerar a ruína de um país inteiro. Quem faz opção por este tipo de projeto terá que responder, diante de Deus, pelo sofrimento e pelo sangue das vítimas da implementação de tal projeto, caso ele prevaleça graças à cegueira dos que não pensam nos outros, mas somente em si mesmo. Precisamos repensar o sentido de nossa missão no mundo, considerando o Evangelho de Jesus como nosso parâmetro fundamental. Que Deus nos ajude neste propósito.

Tiago de França

sexta-feira, 19 de outubro de 2018

Pesquisas de intenção de votos


Recebi hoje um pequeno vídeo, ensinando como verificar um dado importante dessas pesquisas de intenção de votos, encomendadas pelas grandes corporações da mídia, como as emissoras de TV e grandes jornais do País. O dado importante é: OS LUGARES NOS QUAIS SÃO REALIZADAS.

Gente, é assustador! A manipulação é evidente! E é muito fácil de verificar: Você pega o número de registro da pesquisa e o coloca no link "Consulta às pesquisas registradas" (coloque essa expressão no Google para encontrar o link), no site do TSE. Quando abrir o arquivo, basta clicar em outro arquivo que mostra os lugares (estados, municípios e bairros) onde a pesquisa foi realizada.

Acabei de verificar a pesquisa Ibope do dia 15/10, na qual apareceu Bolsonaro com 59% dos votos, e Haddad com 41%. Sabe o que se verifica no arquivo que mostra os locais nos quais se realizou a pesquisa? Que ela foi realizada justamente nos locais onde Bolsonaro teve mais votos. Desse modo, é claro que ele teria que aparecer com esse percentual. Entenderam? A maioria das cidades é do sudeste e do sul do Brasil, principalmente SP, RJ, ES e PR.

Conclusão: As pesquisas de intenção de votos manipulam a realidade. Esses percentuais não correspondem à realidade. Por isso, caro eleitor, nunca decida o seu voto se baseando nestas pesquisas. Você mesmo pode conferir os locais nos quais elas ocorrem no site do TSE. Vote consciente, e não permita ser enganado por pesquisas.

Tiago de França

quarta-feira, 17 de outubro de 2018

Por que os ricos querem Bolsonaro na Presidência da República?


Sabemos que a desigualdade social é uma das características marcantes do Brasil. Estamos entre os países mais desiguais do mundo. Entre ricos e pobres há um abismo escandaloso. Esta não é uma novidade, pois desde a chegada dos portugueses em terras brasileiras, o País é marcado pela escravidão. Esta explica a desigualdade presente no Brasil.

Hoje, podemos dizer que há quatro classes de pessoas no Brasil: os miseráveis, que vivem abaixo da linha da pobreza; os pobres; a classe média, que pensa ser rica; e os ricos. Miseráveis, pobres e classe média são os que sentem os efeitos da crise econômica que assola o País. Os ricos só conhecem a crise pelas páginas dos jornais. A classe média, em relação aos miseráveis e aos pobres, sente menos a crise, mas não está excluída do número dos que sentem seus efeitos.

A classe média pretende aparecer como os ricos, mas não adianta: o pessoal da classe média não é rico. Há duas características que mostram isso: primeiro, trabalham para viver. Ricos não trabalham, porque são donos dos meios de produção. Assim como os pobres, a classe média trabalha para os ricos. Segundo, porque os membros da classe média constituem o grupo social produtor da cultura, tendo em vista servir melhor os ricos. Os intelectuais, de modo geral, são da classe média. São os produtores das ideologias que legitimam o poder econômico controlado pelos ricos.

Os ricos são os grandes empresários, os banqueiros e todos aqueles que possuem capital suficiente para manipular e controlar o mercado financeiro. Entre os ricos há os super-ricos, que, do ponto de vista financeiro, são as pessoas mais ricas do mundo. No Brasil há alguns que figuram na lista dos mais ricos do mundo. São pessoas metidas no mundo dos negócios, que fazem o dinheiro se multiplicar com muita facilidade. Estes afortunados do capitalismo selvagem estão livres de impostos e, geralmente, não se sujeitam às leis.

No Brasil, os ricos tem muito interesse na política. Além de exercerem o controle do mercado financeiro, também querem dominar o Estado. Isso explica as grandes somas de dinheiro que investem nas campanhas eleitorais de muitos candidatos. Não são doações, mas empréstimos a serem pagos de alguma forma. Os ricos lutam para eleger o maior número de membros no Legislativo e no Executivo, para que estes mantenham seus privilégios. Dentre os vários privilégios está o não pagamento, ou o pagamento de valor irrisório de tributos, principalmente impostos.

Este é o motivo de o Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF), previsto na Constituição (artigo 153, inciso VII), nunca ter sido regulamentado. Só existe na Constituição, mas na realidade, os afortunados não pagam nenhum imposto sobre suas grandes fortunas. O mesmo ocorre com os dividendos (lucros) das empresas: não há um imposto sobre os lucros empresariais. A carga tributária brasileira está concentrada no consumo e na renda. Os ricos consomem, mas proporcionalmente pagam menos impostos. Eles não são assalariados, então não pagam imposto de renda na condição de empregados.

Isso explica a preferência dos ricos por Bolsonaro. Este candidato pretende continuar livrando os ricos dos impostos que deveriam pagar. A reforma tributária do Paulo Guedes, o guru de Bolsonaro, prevê a manutenção do peso da carga tributária sobre as costas dos pobres e da classe média.

Por isso, todas as pesquisas de intenção de votos mostram que Bolsonaro é o candidato dos ricos, que representa muito bem os interesses dos que tem muito dinheiro, e que desejam ter cada vez mais à custa do suor e lágrimas dos pobres e da classe média.

E você, que acabou de ler este artigo: é pobre, pertence à classe média, ou é membro da classe dos ricos e afortunados? Se você é pobre ou da classe média, por que quer votar em Bolsonaro? Ou você ainda não entendeu que o plano de governo deste candidato não contempla a sua vida? Reflita, e não seja masoquista. Um pouco de amor próprio e ao País faz muito bem.

Você sabia que uma das propostas do Fernando Haddad é taxar os ricos? Ele não tem medo de anunciar isso, pois sabe que o pobre e a classe média estão cansados de pagar impostos. Dê uma lida no plano de governo de Haddad, e compare com o plano do Bolsonaro, principalmente no quesito Imposto de Renda. Eleitor consciente é eleitor bem informado. Informe-se. Não se deixe enganar.

Tiago de França


terça-feira, 16 de outubro de 2018

Por que há protestantes e católicos que votam em Bolsonaro?


Após verificar a última pesquisa Ibope, publicada ontem (15/10), me veio a pergunta que intitula este breve artigo. A pesquisa ouviu 2.506 eleitores de 176 municípios, nos dias 13 e 14 de outubro. Ela indica que 48% dos católicos entrevistados disseram que irão votar em Bolsonaro, enquanto que 66% dos protestantes entrevistados afirmaram que irão votar no mesmo candidato.

Os números revelam que o candidato goza do apreço mais dos protestantes que dos católicos. Considerando os noticiários e o que estamos vendo e ouvindo nas redes sociais, alguns fatores colaboram para estes números. Antes de analisar a contradição fundamental deste eleitorado "cristão", em matéria bíblico-teológica, quero analisar dois fatores.

No meio protestante, o fator recente de maior envergadura é o apoio, publicamente divulgado, de um dos maiores líderes protestantes da atualidade: o bispo e fundador da Igreja Universal do Reino de Deus, Edir Macedo. Esta Igreja tem muitos adeptos no Brasil inteiro. Além disso, o bispo Macedo é dono da TV Record, e a Universal tem um dos maiores jornais impressos em circulação no País, a Folha Universal. Por isso, não estamos falando de um apoio insignificante.

Este apoio não foi meramente uma manifestação da preferência pessoal do bispo Macedo, mas uma adesão clara ao candidato, que poderá contar com o apoio tanto da Igreja quanto da TV Record. O bispo Macedo é líder religioso e homem de negócio. Trata-se de um homem inteligente e influente, que não entraria na seara política à toa e sem propósitos. Estes serão conhecidos com o passar do tempo. Aqui me abstenho de analisá-los. Na vida humana, um dado é evidente: toda opção tem base em interesses. Os humanos são assim.

Outro fator importante a ser considerado é que, no seio das Igrejas cristãs, tanto católica quanto protestantes, a palavra do líder religioso é pouco contestada. De modo geral, as pessoas acreditam naquilo que escutam de seus líderes religiosos. Considerados homens de Deus, geralmente não são questionados. Graças à essa passividade no ouvir, muita gente não percebe que, muitas vezes, muitos líderes se aproveitam da boa-fé e da ingenuidade da maioria dos adeptos das Igrejas para iludir, enganar, desviar e manipular, tanto a realidade do mundo, quanto a mensagem do Evangelho.

Nestes dias, muitos líderes religiosos, de forma clara e explícita, usam da autoridade religiosa que lhes foi conferida, para pedir votos e orientar os fieis no sentido de determinadas candidaturas. Isso sempre existiu, mas neste ano a situação beira ao escândalo. Na Igreja Católica ocorre menos, porque a orientação dos bispos é que os padres, líderes religiosos que lidam mais diretamente com o povo nas comunidades, evitem pedir votos durante as celebrações. Nenhum padre católico está autorizado a usar o altar do Senhor para pedir votos para um determinado candidato. Mas isto tem acontecido, com certa frequência.

O que a Igreja Católica tem orientado é que os católicos evitem votar em candidatos contrários ao regime democrático, aos direitos humanos, bem como em candidatos que contrariam a liberdade religiosa e os valores cristãos fundamentais: o amor, a justiça, a paz, a misericórdia, a tolerância, a ética, a igualdade, a fraternidade etc. Considerando estes valores, os católicos estão sendo chamados a discernir o voto.

Entre os leigos, pessoas que não integram a hierarquia da Igreja (não são diáconos, padres e bispos), é permitida a manifestação pública das preferências políticas. Os leigos devem se meter na política, pois esta "é a forma mais perfeita de caridade" (São Paulo VI, papa).

Fora do campo da teologia cristã, estes são os fatores mais visíveis. Agora vamos analisar a contradição em matéria de fé, na qual estão encerrados os protestantes e católicos que pretendem votar em Bolsonaro. O que diremos, vale tanto para protestante quanto para católico, pois uma é a fé, um só é o batismo, um mesmo é o Senhor de todos, Jesus de Nazaré. Também uma mesma é a Bíblia, livro sagrado do Cristianismo.

Qual o maior mandamento da Lei de Deus? O amor a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. Todo cristão sabe disso. Além de saber, o cristão é chamado a praticar, a viver o amor. O amor não é abstrato, mas real, e é experimentado na relação com os outros.

Portanto, o racismo, o preconceito e a discriminação, a exclusão, a cultura do ódio, a matança e o fuzilamento de pessoas, a pena de morte, a prisão perpétua, a castração química de pessoas, a escravidão, a tortura, a adesão indiscriminada às armas de fogo, a mentira e a falsidade, o desrespeito às pessoas, a perseguição às minorias da sociedade, a erradicação do ativismo social e outros absurdos que vemos e ouvimos SÃO REALIDADES QUE CONTRARIAM A MENSAGEM DE JESUS CRISTO, O SENHOR.

O verdadeiro cristão, que pratica a sua fé, como membro de qualquer Igreja cristã, ou mesmo não frequentando Igreja nenhuma, mas afirmando-se cristão, não deveria votar em Bolsonaro, porque este candidato defende, publicamente, muitas das questões reprováveis à luz da fé, mencionadas no parágrafo anterior. Basta acessar à Internet, principalmente o YouTube, para ter acesso a vídeos que mostram o próprio candidato defendendo tais coisas. Estas coisas são reprováveis porque contrariam o ensinamento central da fé cristã: o amor a Deus e ao próximo.

É neste sentido, que afirmamos, categoricamente, que quem leva a sério a própria fé em Jesus, no seio da comunidade cristã, não pode votar em um candidato que defende tais bandeiras. Uma coisa é um candidato fazer uma afirmação, e depois voltar atrás, de imediato, pedindo perdão por sua adesão antievangélica a certas bandeiras. Mas não foi isso que ocorreu, nem é o que ocorre.

O candidato defende, por exemplo, que os brasileiros portem armas de fogo para a própria defesa pessoal. No Brasil em que vivemos, e com os brasileiros que temos, isso geraria, claramente, uma guerra civil. Isso contraria a Lei de Deus. Jesus nos pediu para praticarmos o amor e sermos pacíficos. Um cristão resolve seus problemas com diálogo e justiça, buscando a paz e a reconciliação. Se um cristão é contrário ao que ensina Jesus, então é mentiroso e falso cristão.

É verdade que na política não encontramos mulheres e homens perfeitos. Não há homem perfeito em lugar nenhum. Perfeito é Deus, Pai de todos. Mas é verdade que não podemos eleger alguém, que se diz cristão, que cita até versículo bíblico em suas falas, mas que tem pensamentos e conduta contrária a fé que afirma ter. Nas eleições deste ano, Bolsonaro é único candidato a presidente da República que está se aproveitando da ignorância e da ingenuidade de muitos que creem em Deus para ganhar a eleição. Isto é muito grave.

Não se ganha eleição em nome de Deus. Deus não pode ser usado como instrumento político-partidário. Política no regime democrático de direito é para a promoção e defesa do Estado laico, que respeita e promove todas as religiões, num clima de respeito e tolerância. Portanto, caro eleitor, cuidado com as mensagens que você anda recebendo, com deturpações da fé cristã. A Bíblia não foi escrita para enganar as pessoas, nem para causar divisão, conflito e morte, mas para mostrar o caminho da salvação para toda a humanidade.

Tiago de França

segunda-feira, 15 de outubro de 2018

DIA DO PROFESSOR


Sou professor e advogado, e neste dia quero falar da importância da profissão que é mestra de todas as outras. O futuro passa pelo professor. Tive professor de todo tipo: desde os cultos e empenhados até os incultos e preguiçosos. Mas todos eles me ensinaram a ser professor e a ser gente. Minha mãe, professora aposentada, me ensinou a ler, escrever, contar, enxergar e ser gente. Ela é a primeira homenageada.

Os professores que lecionam na educação básica (ensino fundamental e médio) são os que mais sofrem, principalmente os da escola pública. Falta valorização do professor, condições dignas de trabalho, respeito e teto salarial digno. Ultimamente, nossa classe anda aparecendo nos jornais, porque alunos e pais nos espancam. Também prefeitos e governadores mandam a polícia nos espancar. Esta é a nossa situação.

O professor é um ser humano que tem formação e ideologia. Somos formados em diversas áreas do saber e temos nossas tendências ideológicas. Apesar da pluralidade ideológica, todos somos unânimes em vários pontos, dentre eles o fato de que não podemos regredir, mas repensar a educação para que o País mude para melhor. Todo professor é alguém que acredita no ser humano e na possibilidade de um futuro melhor. Não somos tolos, mas esperançosos. A gente critica e contribui para o futuro.

Estamos em ano eleitoral, e o dia 28 do corrente mês será decisivo para nós. Como professor de Filosofia, não me canso de levantar questionamentos e provocações sobre a realidade. Filosofia é isso: apreço pela pergunta, busca incessante pela verdade. Por isso, nesta homenagem, quero compartilhar com você, leitor, algumas perguntas. Vejamos. Não irei respondê-las, mas peço, gentilmente, que você pense sobre elas. Todo mundo que tem cérebro é capaz disso. Pensar costuma fazer bem.

Você sabia que o projeto "Escola sem partido" tem como objetivo controlar o professor em sala de aula, tirando-lhe a liberdade de lecionar? Você sabia que este projeto tem partido, que é a doutrinação ideológica conservadora? Você sabia que o ensino à distância para a educação básica não tem como funcionar? Ou você acha que as crianças podem ficar em casa, vendo vídeo-aula e somente ir à escola fazer provas? E a socialização dessas crianças, como fica? E as crianças muito pobres, que dependem, muitas vezes, da merenda escolar para sobreviver, como ficarão?

E os professores, serão demitidos? O que eles vão fazer da vida? Para que servirão nossas escolas? Você sabia que a educação precisa de investimento pesado, porque é a única saída para o País se libertar da ignorância e trilhar o caminho do desenvolvimento integral? Você sabia que foi pensado um projeto chamado "Brasil sem homofobia", no âmbito do Poder Legislativo, para combater a homofobia nos vários âmbitos da sociedade, especialmente nas escolas? Você sabia que este projeto não é o "kit gay" mencionado, com insistência, pelos homofóbicos? Você sabia que este "kit gay" (expressão concebida pelos homofóbicos) não foi produzido nem distribuído nas escolas?

Você sabia que nós, professores, não praticamos doutrinação ideológica, mas lecionamos nossas disciplinas, seguindo um cronograma devidamente aprovado e sob a orientação do projeto político-pedagógico de cada escola? Você já procurou saber desta tal de doutrinação ideológica na escola onde seus filhos estudam? Ou você é daquele pai ou mãe que acredita em falsas notícias sem conferir a realidade escolar? Você participa e tem interesse em participar da vida escolar de seus filhos? Qual a sua contribuição na construção do projeto político-pedagógico da escola de seus filhos? Você sabe ou já ouviu falar desse projeto?

Você sabia que nós, professores, não damos aula de sexo nas escolas? O seu filho já chegou em casa, reclamando de que algum professor estava dando aula de sexo, seja praticando sexo em sala de aula, ou passando vídeo pornográfico para os alunos? Ou você acha que as aulas de biologia, que falam da reprodução de todas as espécies sexuadas constituem aulas sobre sexo? Se você nunca ouviu falar, por que você acredita na acusação de que nós, professores, ensinamos sexo aos alunos nas escolas? Crer nisso é conduta séria e de boa-fé? Quem espalha esse tipo de mentira para ganhar eleição, age de boa-fé?

Caro leitor, eu teria outras dezenas de perguntas a fazer, mas estas são suficientes para o momento. Ainda há outra indagação fundamental: Que tipo de escola você quer para seus filhos e demais crianças do Brasil? Você já parou para analisar, sem paixões e com muita calma, as propostas dos candidatos a presidente da República, Fernando Haddad e Jair Bolsonaro? Nas perguntas acima você encontra pistas de reflexão. Tente respondê-las. Eleição é coisa séria. O eleito permanecerá, no mínimo, quatro anos no poder. Qual dos dois candidatos fala em INVESTIR DINHEIRO na educação? Nós precisamos de dinheiro na educação, sabia? Qual candidato fala daquilo que é a realidade da educação? E as propostas de ambos, quais delas condizem com a realidade educacional brasileira e, de fato, podem ser implementadas?

Finalizo esta mensagem, expressando, sem medo de ser feliz de novo, a minha preferência política. Sou cidadão e também sou eleitor. É um direito que me cabe. Assim como também é direito seu, caro leitor, discordar e fazer outra opção. Mas antes de você fazer, leia com atenção os argumentos até aqui apresentados. A gente tem que considerar a argumentação, porque a verdade parte de análises. Argumento válido é argumento que tem sentido e lógica, que racionalmente pode ser verificado no mundo real. Os apaixonados de plantão não possuem argumentação, mas, como papagaios, repetem falsas soluções para problemas complexos. E a educação no Brasil é, hoje e sem dúvida alguma, uma realidade complexa que pede socorro.

Irei votar no Professor Fernando Haddad, primeiro porque ele é professor da USP, bacharel em direito, mestre em economia e doutor em filosofia. Portanto, tem gabarito. Como professor, não posso votar em gente despreparada. O Brasil está numa situação muito difícil para colocarmos a direção deste país gigante nas mãos de quem não sabe sequer o básico da educação e de outros assuntos. O adversário do Prof. Haddad não sabe sequer o que é e como se organiza a educação básica no Brasil.

Meu voto no Prof. Haddad também se justifica pelo fato de ele ter sido Ministro da Educação na era Lula, época marcada por grandes investimentos na educação. Basta você pesquisar a quantidade de universidades, institutos federais e escolas públicas criadas naquele período. Além disso, os investimentos foram fecundos em muitos setores da educação. Quem tem o mínimo de informação sabe disso. Por isso, acredito que o nobre colega Professor e Doutor Haddad, conhecedor da realidade educacional e homem experiente, que já mostrou que fez e sabe fazer, é a única oportunidade para continuarmos trilhando o caminho de um País verdadeiramente livre.

Poderia citar outros argumentos válidos, que embasam a minha escolha pelo Prof. Dr. Haddad, mas prefiro ficar por aqui, para não ser exaustivo. Acredito que o País crescerá muito com um professor ocupando a cadeira presidencial. Do contrário, não creio que um capitão da reserva do exército, que não tem formação nem competência, que já deu provas de sua ignorância e do seu temperamento autoritário, tenha algo a fazer de bom pelo progresso da nação. Este capitão não serviu nem para o exército. Foi praticamente expulso. A história dele é conhecida de todos. Como dizem os jornais e analistas nacionais e internacionais, gente que estuda e sabe o que fala: este capitão é um risco à democracia brasileira, democracia jovem e tão golpeada por políticos corruptos e inimigos do povo.

Meu muito obrigado pelas homenagens a nós, professores! Se você quiser completar esta homenagem com uma boa ação, no dia 28, vote 13. Vamos eleger o Professor Haddad. Vamos dar mais uma chance para o Brasil crescer na educação e ser feliz de novo. Se você é pai ou mãe, ou responsável por alguma criança, adolescente ou jovem que precisa estudar em escola e universidade pública de qualidade, vote 13. Ou você tem dinheiro para pagar escola ou universidade privada para seu filho? O capitão pretende privatizar o ensino no Brasil. A universidade pública pode estar com os dias contados. Eu já sou formado, mas, e o seu filho? Como ficará? Pense, eleitor. Repasse essa mensagem aos seus contados.

Nobres colegas, meus parabéns pelo nosso dia! Sejamos valentes, sempre! O futuro depende de nós e de nossos alunos. Viva o professor! Viva a democracia! Professor Haddad Presidente! Vote 13.

Prof. Tiago de França

domingo, 14 de outubro de 2018

São Oscar Romero: profeta do Reino de Deus


“A Igreja, defensora dos direitos de Deus, da Lei de Deus, da dignidade humana das pessoas, não pode ficar calada diante de tanta abominação” (Dom Oscar Romero, em sua homilia, no dia 23 de março de 1980, no dia anterior à sua morte).

        Muito me emociona escrever sobre Dom Oscar Romero. Desde que conheci a sua biografia, sempre que tenho um tempinho, releio suas homilias. Quando os acontecimentos da vida querem me puxar para o desânimo, escuto a sua voz, nos áudios e vídeos disponíveis na Internet. De fato, trata-se de um santo profeta do Reino de Deus. Em breves linhas, de forma incansável e mais uma vez, quero expressar o que significa ser profeta do Reino de Deus.

        Ninguém dá a si mesmo a missão de profeta. Existe o profeta porque Deus chama e envia para um determinado lugar e em um determinado tempo. Em todos os momentos difíceis da história da caminhada do povo, Deus faz surgir mulheres e homens que anunciam a verdade do Evangelho e denunciam as injustiças que assolam o povo. Uma vez escolhido, não adianta fugir. Não adianta fazer como o profeta Jonas, do antigo testamento da Bíblia. No início, Dom Oscar queria fazer como Jonas, mas não teve jeito.

        Como um profeta sabe que está sendo chamado e enviado? Ele encontra Deus na realidade do povo. Deus chama o profeta pela boca do povo. O clamor dos injustiçados é a voz divina, chamando o profeta para agir e proclamar a Palavra da salvação. No silêncio orante, Deus está lá, falando ao coração. Este coração fica inquieto, ardente igual aos dos discípulos de Emaús, que caminhavam com Jesus sem o reconhecê-lo. Quando senta à mesa com o povo, o profeta reconhece Jesus. Aí o Reino acontece.

        Dom Oscar, até iniciar os três últimos anos de sua vida, ou seja, até 1977, era um clérigo conservador. Converteu-se tarde. Mas na dinâmica do seguimento de Jesus é assim mesmo. O clérigo não se converte, necessariamente, quando é ordenado. Seria muito bom se assim fosse. Todo cristão, clérigo ou não, converte-se quando se encontra com Jesus, reconhecendo-o e colocando-se no seu caminho. Aí, sim, temos cristão convertido. Até 1977, Dom Oscar era um bispo obediente às prescrições eclesiásticas, um bispo canonicamente exemplar. Nada além disso.

        Desse modo, não basta sermos cristãos canonicamente exemplares, cumpridores das leis e normas. Jesus não nos chamou a isso. Dom Oscar sabia disso. O cristão se torna de fato seguidor de Jesus quando entra no movimento de Jesus. Caminho é movimento, é palavra proclamada, é encontro com Jesus nas pessoas. Quando Dom Oscar deixou o conforto das seguranças da condição de bispo e se deslocou na direção daqueles que viviam sob as ameaças do regime militar, aí a sua vida ganhou sentido. Dom Oscar conheceu Jesus, a verdadeira alegria da vida.

        O que o regime militar fazia com as pessoas? O regime fez em El Salvador, na América Central, o que fez em toda a América Latina: usou a mentira do comunismo para matar os opositores do regime. No Brasil também foi assim: em nome do combate ao comunismo, milhares de pessoas foram perseguidas, torturadas e assassinadas. O combate ao comunismo na América Latina sempre foi uma mentira. Até hoje se utilizam desta mentira para justificar a perseguição e o assassinato de pessoas contrárias a governos opressores e sanguinários. Dom Oscar denunciou esta mentira e proclamou a verdade que desmascarou os crimes praticados pelos militares.

        Fica para a Igreja o testemunho de profeta do Reino de Deus. Hoje, 14 de outubro de 2018, trinta e oito anos depois do martírio de Dom Oscar, brutalmente assassinado enquanto celebrava a Eucaristia, o Papa Francisco o eleva à dignidade de santo da Igreja. Assisti, pela Internet, muito emocionado, à cerimônia de canonização, pois conheço profundamente a história deste mártir. E o meu desejo é que o bom Deus, em sua infinita misericórdia, me conceda, hoje e sempre, bem como a todos os irmãos e irmãs que professam a mesma fé em Jesus, o mesmo Espírito que guiou o profeta Dom Oscar Romero em sua entrega total a Deus. O profeta é um homem entregue nas mãos de Deus.

        Não existe força nem poder que impeça a ação do Espírito na pessoa do profeta. Com humildade e discrição, na oração e nas lutas cotidianas, o profeta vai realizando a vontade de Deus. A alguns está reservada a coroa do martírio, a outros não. Mas isto não depende do profeta. É Deus que tudo permite e direciona, para sua glória.

Ó São Oscar Romero, vós que estais junto a Deus,
neste dia solene de vossa elevação aos altares de nossa Igreja, terrena e celeste,
olhai para o Brasil, vítima das mesmas atrocidades que atingiram o povo de El Salvador.
Ajudai-nos a não esmorecermos na defesa dos mais pobres e no clamor por justiça.
Que nossa fé seja firme e nossa fidelidade seja eterna, assim como é eterno o amor de Deus por cada pessoa que nasce neste mundo e por toda a criação.
Que o mal não tenha a última palavra, e que o Reino de Deus se realize entre nós.
Ó Trindade Santa, escutai a intercessão deste vosso servo em nosso favor.
Assim seja.


Tiago de França

quarta-feira, 10 de outubro de 2018

Resultado do 1º turno das eleições 2018


   
     O resultado do 1º turno das eleições 2018 não trouxe muita novidade. Analisando os números, nomes e partidos, constatamos algumas evidências que nos preocupam, apesar de que o cenário já era esperado. Cresceu o número de políticos conservadores. Esta parece ser uma tendência mundial. Há uma onda conservadora tomando a política. Estes políticos, para se elegerem e reelegerem, usaram das mesmas táticas de sempre: aproveitaram-se do medo e da ignorância da grande maioria da população; exploraram o tema da família, da violência, do combate ao comunismo e à corrupção e da fé religiosa das pessoas.

        Estes foram os temas mais recorrentes. O resultado foi a vitória expressiva de militares e protestantes, especialmente líderes religiosos. Também foram eleitos e reeleitos, inúmeros políticos alinhados com o discurso do ódio às minorias presentes na sociedade brasileira. Nas falas e posturas, durante a campanha eleitoral, eles não tiveram vergonha de expor seus preconceitos e fobias. E foram aplaudidos de pé. O político tradicional quer uma sociedade “ordeira”, no sentido de ordenada, homogênea, uniforme. Fala-se que todo mundo tem que ser cristão, não ao modo do Evangelho, mas ao modo violento do falso cristianismo. Misturou-se política com proselitismo religioso, e esta mistura criou um discurso alicerçado na intolerância.

        Este discurso é formado com frases de efeito, tais como: “Bandido bom é bandido morto!”; “Lugar de bandido é na cadeia!”; “O Brasil acima de tudo, Deus acima de todos!”; “Vamos esmagar os inimigos de Jesus!”; “O Brasil tem que aceitar Jesus!”; “Nossa bandeira não pode ser vermelha!”; “Vamos mudar o Brasil nem que seja na bala” etc. Estas e tantas outras expressões revelam a índole dos inúmeros políticos eleitos. São pessoas eleitas por uma população que foi às urnas e, sem visão nenhuma da realidade (salvo exceções, para fazer justiça), entregou o País nas mãos de gente que tem sede de sangue e desejam que a maioria esmague as minorias, submetendo-as à eterna humilhação.

        Curiosamente, muitos dos políticos eleitos, que adotaram um discurso conservador e de combate à corrupção, são pessoas imorais e corruptas. Muitos deles já são réus em processos judiciais, e envolvidos em escândalos de toda ordem. No Brasil, os políticos zombam da justiça e da ingenuidade do eleitor: Muitos roubaram dinheiro público, mas, durante a campanha, defenderam operações policiais de combate à corrupção. Alguns até se referiram e elogiaram operações como a Lava Jato para falar da sua “predileção” pela justiça e pela honestidade. Vários foram eleitos. Os que não foram, apesar dos muitos votos recebidos, ficaram esperançosos para as próximas eleições. Devido às vagas serem limitadas, muitos corruptos não puderam ocupá-las desta vez.

        Por outro lado, o povo conseguiu eleger figuras importantes para continuar defendendo seus legítimos interesses. Foi o caso de muitos deputados eleitos, bem como alguns senadores. Trata-se de uma minoria que já estava comprometida com as lutas do povo, nas várias atividades e/ou bandeiras populares: moradia, causas indígenas, educação, saúde, luta pela terra, direitos das mulheres e dos negros, juventude, combate à criminalização dos pobres, comunidade LGBT etc. Também alguns governadores dedicados ao povo foram eleitos e reeleitos, principalmente no Nordeste. Estes personagens mostram que nem tudo está perdido na política. Nos poderes executivo e legislativo temos excelentes pessoas, que cumprem, honradamente, a sua missão na política.

        Para o cargo de Presidente da República, os votos se concentraram em três candidatos: Ciro Gomes, do PDT (12,47%), Fernando Haddad, do PT (29,28%) e Jair Bolsonaro, do PSL (46,03%). Os demais candidatos não tiveram votação expressiva. O povo levou a eleição para o 2º turno, que ocorrerá no dia 28 de outubro. Pela primeira vez na história das eleições brasileiras ocorrem dois fenômenos, que cremos ser necessário considerar. Primeiro, um candidato que, sem apresentar propostas detalhadas e sem participação significativa em debates, ficou em primeiro lugar. Estamos falando de Jair Bolsonaro, filiado a um partido até então considerado “nanico”, que era pouco conhecido pelos brasileiros.

        O candidato foi ganhando notoriedade devido às suas falas polêmicas na Internet. Basta digitar seu nome no YouTube ou no Google, que logo se ver uma enxurrada de falas e posturas polêmicas, pouco civilizadas e dadas a reforçar o discurso de ódio, que separa as pessoas e causa um verdadeiro caos social. Em um País marcado pela ignorância, oriunda da falta de educação de qualidade e de apreço à informação substanciosa e verdadeira, as falas do candidato levaram multidões ao êxtase, verdadeiras alucinações de massa.

Gestos e palavras de ordem, simulando violência, levaram muitas pessoas a crer que o candidato vai mesmo “acabar com todos os bandidos” do Brasil! Estas mesmas pessoas não quiserem e nem querem nem saber como o candidato fará isso, caso eleito, mas somente a promessa lhes causa certo alívio, pois estão mergulhadas no lamaçal da violência, uma constante do cotidiano dos brasileiros. Com propostas simplistas para problemas complexos, o candidato ganhou a simpatia e o voto de milhões de brasileiros. Quanto aos demais problemas, as pessoas nem perceberam que ele não nenhuma apresentou proposta viável. A impressão que há é a de que o único problema que afeta o Brasil é a violência. Mera ilusão.

Integrando, ainda, este primeiro fenômeno, também tivemos as chamadas fake news (notícias falsas), que circularam livremente e de forma mais intensa, na medida em que o dia das eleições foi se aproximando. O WhatsApp se transformou num poderoso veículo de compartilhamento de calúnia, injúria e difamação. A maioria das notícias falsas tinham o objetivo de desconstruir a imagem do candidato do PT à presidência. Portanto, foi a candidatura mais prejudicada. A Justiça Eleitoral, que tinha prometido ser rigorosa na apuração e punição daqueles que espalhassem notícias falsas durante as eleições, não cumpriu com sua promessa. Diante da quantidade de notícias falsas, o que se apurou até agora parece insignificante.

O segundo fenômeno a ser considerado é a ida do candidato do PT ao 2º turno das eleições. O ex-presidente Lula apostou, de última hora, na possibilidade de seu escolhido, Fernando Haddad, ser eleito presidente do Brasil, mesmo sabendo que a mídia e seus adversários na disputa, iriam, como, de fato, exploraram muito bem, o fato de o escolhido ser orientado pelo ex-presidente, desde a prisão, em Curitiba. Político experiente e conhecedor do povo brasileiro, o ex-presidente Lula teve êxito na sua escolha e jogada política, até o momento. Conseguiu, apesar de tudo, levar seu candidato ao 2° turno das eleições. Isso nunca ocorreu na história do Brasil. É importante lembrar ao leitor que este mesmo ex-presidente, com sua força política e carisma peculiar, conseguiu eleger e reeleger a ex-presidenta Dilma Rouseff.

Graças à expressiva votação que teve no Nordeste, Fernando Haddad conseguiu chegar ao 2º turno. A maioria dos nordestinos se mostrou fiel ao ex-presidente Lula, por seus grandes feitos naquela região, quando de sua passagem pela presidência, de 2003 a 2010. A passagem do ex-presidente pela região, antes de sua prisão, reacendeu a esperança do povo. Nestas eleições, o povo depositou a mesma confiança na pessoa de Fernando Haddad. Por este motivo, imediatamente após as eleições, os nordestinos voltaram a ser alvos de ataques preconceituosos nas redes sociais; ataques feitos por pessoas das regiões sul e sudeste, principalmente, que votaram no candidato Jair Bolsonaro.

Agora estamos na marcha para o 2º turno. Até o presente momento, o candidato Jair Bolsonaro se utiliza da mesma tática: tom agressivo, ausência de propostas viáveis, bem como sinaliza que continuará ausente nos debates. Acentua-se cada vez mais certo estranhamento entre ele e seu vice, o general Mourão. Desde o dia da confirmação deste como candidato a vice, os dois andam se desentendendo. Um é mais fechado que o outro. São dois bicudos que defendem ideias extremistas em um País carente de democracia.

A primeira pesquisa de intenção de votos, feita e publicada pelo Datafolha, revela que milhões de brasileiros continuam anestesiados, seduzidos pelas ideias antidemocráticas do capitão de reserva do exército, que assessorado por vários generais do exército, deseja ser presidente do Brasil. Sua candidatura pode ser resumida em três palavras: militarismo, entreguismo e neoliberalismo. Se o povo não abrir os olhos daqui para o dia 28 de outubro, assistiremos, certamente, ao pior retrocesso político da história brasileira. E a partir de janeiro, se o capitão for empossado, assistiremos ao início da morte sistemática e progressiva de nossa jovem e sofrida democracia. A decisão está nas mãos do povo tão iludido e enganado.

Tiago de França