domingo, 30 de dezembro de 2018

O deus dos poderosos


Neste ano, especialmente durante o período eleitoral, assistimos a muitas invocações do nome de Deus. Muitos políticos usaram o nome de Deus e a religião cristã para se beneficiar. Eles sabiam que o brasileiro é, de modo geral, religiosamente conservador, e passaram a defender, verbalmente, os valores da tradição cristã.

Eles sabiam também que este mesmo brasileiro, de tipo conservador, geralmente não faz nenhuma ligação entre fé e vida. Ao mesmo tempo em que defende os valores tradicionais, com ênfase nos valores da família, este tipo de brasileiro viola as leis e os valores que verbalmente defende.

A defesa verbal dos valores tradicionais não é sinônimo de integridade moral. Muitos mentirosos defendem a verdade para esconder suas mentiras; muitos ladrões defendem o combate à corrupção para esconder seus furtos e roubos; muitos adúlteros e estupradores defendem a moral e os bons costumes para esconder adultérios e estupros; entre outros absurdos.

O mesmo ocorre com a invocação do nome de Deus: na maioria dos casos se trata de transgressão do segundo mandamento do Decálogo. Invoca-se o nome de Deus em vão para criar na cabeça das pessoas a imagem de uma religiosidade e piedade aparentes. Deus e religião são duas realidades diferentes. Por isso, é possível que uma pessoa seja religiosa e não creia em Deus. É o que assistimos nestas falsas invocações do nome de Deus.

Um crente fiel não invoca a Deus para enganar as pessoas. Transformar Deus em um instrumento de manipulação é um pecado gravíssimo. Isto não é cristianismo, mas falsa religiosidade. Deus é incompatível com o discurso de ódio e com a proliferação das fake news (notícias falsas) veiculadas nas eleições deste ano.

Quem se utiliza da mentira de forma sistemática para enganar as pessoas e, desse modo, alcançar o poder político, não crê em Deus. Este tipo de prática é incompatível com a fé cristã. Deus não é o responsável pela vitória do presidente eleito do Brasil. Deus não enviou o presidente eleito para governar o Brasil. Isso é falso messianismo e hipocrisia religiosa. Deus não tem parte com a mentira nem com a cultura da eliminação do outro, práticas defendidas nas eleições deste ano.

Deus é Amor e Liberdade. Quem semeia o ódio e a perseguição a pessoas e grupos sociais não tem parte com Deus. O autoritarismo e as promessas de cortes dos direitos fundamentais e garantias dos cidadãos são práticas que não podem ser toleradas nem praticadas por autênticos cristãos.

O cristianismo não nasceu com a pretensão de colaborar com o sistema de opressão dos povos. Quando isto ocorre, estamos diante de um gravíssimo desvio. A mensagem de Jesus está pautada na fraternidade, na solidariedade, na justiça, no amor, na cultura do encontro e da tolerância, na fé e no respeito à diversidade da cultura, das crenças e dos modos de ser. O cristianismo só é verdadeiro somente quando trilha o caminho do amor, da justiça e da liberdade, tal como concebido por Jesus.

Precisamos aprender com o que aconteceu em 2018. O saldo total deste ano jogou o País no precipício. Para não sermos totalmente engolidos pelos males que se avizinham, as pessoas precisam manter viva a esperança ativa, que é aquela que nos coloca no caminho da resistência. Para trilhar este caminho é necessário acreditar na construção de outro mundo possível, e arregaçar as mangas para lutar com ternura, inteligência, estratégia, união e perseverança. Estas são minhas considerações finais para este ano que aos poucos termina.
Tiago de França

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