sábado, 15 de dezembro de 2018

Para acolher Jesus que vem


“Que devemos fazer?” (Lc 3, 10)

            O profeta João Batista, enviado para preparar o povo para receber o Messias, fala-nos da necessidade da conversão. Em simples palavras, converter-se é mudar de vida: sair da escravidão do pecado para experimentar a liberdade dos filhos e filhas de Deus. É claro que somos pecadores, e Deus conhece a nossa condição de gente fraca e resistente à sua graça. Mas apesar de sermos pecadores, também fomos, em Cristo Jesus, elevados à dignidade de filhos adotivos do Pai. Aqui reside a nossa alegria e salvação.

            Aquele que é enviado por Deus conhece a vontade de Deus. Na caminhada da missão, Deus vai revelando o significado da missão de cada pessoa que é chamada. Assim aconteceu com João, o Batista. Este era um profeta de Deus. E todo profeta fala e age de acordo com a iluminação divina. Deus se serve dos profetas para agir na Igreja e no mundo. Sem os profetas, a Igreja não consegue realizar a sua missão no mundo. Deus vai suscitando profetas e profetisas no meio do seu povo, de acordo com a necessidade e as circunstâncias.

            Antes de Jesus iniciar, publicamente, a sua missão, era necessário que João, filho de Zacarias e Isabel, endireitasse as veredas para o Messias chegar. Segundo João, Jesus é aquele que batiza no Espírito Santo e no fogo (cf. Lc 3, 16). João era um profeta tão reconhecido entre o povo, que muita gente pensava que ele seria o Messias. Mas não se demorou em esclarecer: “Eu vos batizo com água, mas virá aquele que é mais forte do que eu. Eu não sou digno de desamarrar a correia de suas sandálias”. O Messias é Jesus, mais forte do que João.

            Todo profeta continua exercendo esta missão do profeta João: encaminhar o povo para Deus, apontando o caminho da conversão. As multidões perguntavam sobre o que deviam fazer para acolher o Messias, e a resposta do profeta aponta para o núcleo fundamental do caminho que conduz a Deus: o amor. Às multidões, recomendou que se partilhasse o pão e as roupas; aos cobradores de impostos, pediu que não explorassem o povo; aos soldados do império romano, exortou-os a não extorquir os pobres nem mentir nos testemunhos contra eles (cf. Lc 3, 11-13).

            Também hoje, a recomendação permanece a mesma: todos, sem exceção, são chamados a viver o amor, que é solidariedade concreta nas relações entre as pessoas e com a natureza. Em nome de Jesus, precisamos recomendar aos nossos governantes: respeitem os direitos adquiridos a duras penas pelos pobres! Parem de explorar os pobres com altos impostos, e cobrem mais dos ricos! Parem de mentir, com promessas enganosas e discurso anticorrupção vazio! Promovam o bem comum e trabalhem na defesa da terra, nossa mãe! Cessem a política de criminalização e matança dos pobres nas pequenas e grandes cidades! Criem políticas públicas que reduzam a desigualdade social! 

            Estas e outras recomendações devem estar na boca dos profetas. Mas onde estão os profetas? Assistimos a muitas injustiças e pouca profecia. Quem, hoje, está denunciando, em alto e bom som, o que está acontecendo no Brasil? Por acaso não é tempo de profecia? O Espírito Santo permanece conosco. Por que resistimos ao seu apelo? Ou será que tudo está conforme a vontade de Deus?

Por que os bons silenciam, enquanto os maus avançam com seus projetos de morte? Onde estão os discípulos missionários de Jesus? O nosso culto está em sintonia com o que está acontecendo hoje no Brasil e no mundo? O que estamos celebrando em nossas liturgias? Por que tantos que se dizem cristãos compactuam com os projetos de destruição e morte do povo de Deus?... Precisamos, individual e comunitariamente, pensar e meditar estas questões.

O Pai, que nos enviou o Filho, espera que caminhemos com ele. Jesus está presente no mundo. Ele não está sentado, confortavelmente, ao lado de Deus, assistindo, passivamente, as desgraças que acontecem no mundo. Com a celebração do Natal, iremos proclamar que ele é o Emanuel, o Deus que permanece conosco. A nossa fé, que se revela no amor que demonstramos no cotidiano, nos fala desta presença amorosa de Deus.

Para acolher Jesus que vem é necessário este amor que salva. Nada nesta vida salva: dinheiro, poder, prestígio, e tudo o que destas coisas decorrem. Nada disso salva. Nada disso edifica. Enquanto comunidades de crentes em Jesus, precisamos tomar uma atitude urgente: colocarmos o amor no centro de nossa vida, e revermos esse cristianismo que temos. Como pode prosperar diante de Deus um cristianismo sem amor? De que vale dizer que tem fé, mas sem amor a Deus e ao próximo?

A partir daquilo que fazemos, precisamos rever o nosso modo de ser. Nossos gestos revelam o amor de Deus? Amamos mesmo, ou fingimos que amamos? A gente é presença amorosa, ou estamos perdendo tempo em discussões religiosas e teológicas secundárias? Sem o amor, a gente pode até praticar perfeitamente a religião, mas estaremos longe de Deus. Urgentemente, precisamos mais de amor e menos religiosidade sem amor. As duas realidades podem e deveriam caminhar juntas: amor e religião, mas a situação na qual nos encontramos tem demonstrado que tais realidades caminham cada vez mais separadas.

            A prova disso é o que temos visto no Brasil e no mundo: muita indiferença, preconceito, racismo, inúmeros tipos de violência, marginalização social etc. A cultura do ódio cresce cada vez mais: ódio aos pobres; aos gays, travestis, lésbicas e transexuais; ódio aos índios e negros; ódio às pessoas que constituem o que Dom Helder Câmara chamava de “minorias abraâmicas”.

Milhões de brasileiros se declaram católicos e protestantes, mas a violência cresce cada vez mais. Onde está a crença de tantos milhões de pessoas? Como estão sendo evangelizadas? O que estão escutando da boca dos líderes religiosos? Nestes dias, os católicos celebram o Tempo do Advento, tempo de espera e de preparação para a celebração do mistério da encarnação de Jesus, o Filho de Deus. Como cada um está preparando e celebrando estes dias? Que o Espírito de Jesus nos converta, e nos ajude a sermos verdadeiramente amorosos. Fora do amor não existe fé em Jesus nem salvação.

Tiago de França

Nenhum comentário: