“Que
devemos fazer?” (Lc 3, 10)
O profeta João Batista, enviado para preparar o povo para
receber o Messias, fala-nos da necessidade da conversão. Em simples palavras, converter-se é mudar de vida: sair
da escravidão do pecado para experimentar a liberdade dos filhos e filhas de
Deus. É claro que somos pecadores, e Deus conhece a nossa condição de gente fraca
e resistente à sua graça. Mas apesar de sermos pecadores, também fomos, em
Cristo Jesus, elevados à dignidade de filhos adotivos do Pai. Aqui reside a
nossa alegria e salvação.
Aquele que é enviado por Deus conhece a vontade de Deus. Na
caminhada da missão, Deus vai revelando o significado da missão de cada pessoa
que é chamada. Assim aconteceu com João, o Batista. Este era um profeta de
Deus. E todo profeta fala e age de acordo com a iluminação divina. Deus se
serve dos profetas para agir na Igreja e no mundo. Sem os profetas, a Igreja
não consegue realizar a sua missão no mundo. Deus vai suscitando profetas e
profetisas no meio do seu povo, de acordo com a necessidade e as
circunstâncias.
Antes de Jesus iniciar, publicamente, a sua missão, era
necessário que João, filho de Zacarias e Isabel, endireitasse as veredas para o
Messias chegar. Segundo João, Jesus é aquele que batiza no Espírito Santo e no
fogo (cf. Lc 3, 16). João era um profeta tão reconhecido entre o povo, que
muita gente pensava que ele seria o Messias. Mas não se demorou em esclarecer: “Eu vos batizo com água, mas virá aquele que
é mais forte do que eu. Eu não sou digno de desamarrar a correia de suas
sandálias”. O Messias é Jesus, mais forte do que João.
Todo profeta continua exercendo esta missão do profeta
João: encaminhar o povo para Deus, apontando o caminho da conversão. As multidões
perguntavam sobre o que deviam fazer para acolher o Messias, e a resposta do
profeta aponta para o núcleo fundamental do caminho que conduz a Deus: o amor. Às
multidões, recomendou que se partilhasse o pão e as roupas; aos cobradores de
impostos, pediu que não explorassem o povo; aos soldados do império romano,
exortou-os a não extorquir os pobres nem mentir nos testemunhos contra eles
(cf. Lc 3, 11-13).
Também hoje, a recomendação permanece a mesma: todos, sem
exceção, são chamados a viver o amor, que é solidariedade concreta nas relações
entre as pessoas e com a natureza. Em nome de Jesus, precisamos recomendar aos
nossos governantes: respeitem os direitos adquiridos a duras penas pelos
pobres! Parem de explorar os pobres com altos impostos, e cobrem mais dos
ricos! Parem de mentir, com promessas enganosas e discurso anticorrupção vazio!
Promovam o bem comum e trabalhem na defesa da terra, nossa mãe! Cessem a
política de criminalização e matança dos pobres nas pequenas e grandes cidades!
Criem políticas públicas que reduzam a desigualdade social!
Estas e outras recomendações devem estar na boca dos
profetas. Mas onde estão os profetas? Assistimos a muitas injustiças e pouca
profecia. Quem, hoje, está denunciando, em alto e bom som, o que está
acontecendo no Brasil? Por acaso não é tempo de profecia? O Espírito Santo
permanece conosco. Por que resistimos ao seu apelo? Ou será que tudo está
conforme a vontade de Deus?
Por que
os bons silenciam, enquanto os maus avançam com seus projetos de morte? Onde estão
os discípulos missionários de Jesus? O nosso culto está em sintonia com o que
está acontecendo hoje no Brasil e no mundo? O que estamos celebrando em nossas
liturgias? Por que tantos que se dizem cristãos compactuam com os projetos de
destruição e morte do povo de Deus?... Precisamos, individual e
comunitariamente, pensar e meditar estas questões.
O Pai,
que nos enviou o Filho, espera que caminhemos com ele. Jesus está presente no
mundo. Ele não está sentado, confortavelmente, ao lado de Deus, assistindo,
passivamente, as desgraças que acontecem no mundo. Com a celebração do Natal,
iremos proclamar que ele é o Emanuel, o Deus que permanece conosco. A nossa fé,
que se revela no amor que demonstramos no cotidiano, nos fala desta presença
amorosa de Deus.
Para
acolher Jesus que vem é necessário este amor que salva. Nada nesta vida salva:
dinheiro, poder, prestígio, e tudo o que destas coisas decorrem. Nada disso
salva. Nada disso edifica. Enquanto comunidades de crentes em Jesus, precisamos
tomar uma atitude urgente: colocarmos o amor no centro de nossa vida, e revermos
esse cristianismo que temos. Como pode prosperar diante de Deus um cristianismo
sem amor? De que vale dizer que tem fé, mas sem amor a Deus e ao próximo?
A partir
daquilo que fazemos, precisamos rever o nosso modo de ser. Nossos gestos
revelam o amor de Deus? Amamos mesmo, ou fingimos que amamos? A gente é
presença amorosa, ou estamos perdendo tempo em discussões religiosas e
teológicas secundárias? Sem o amor, a gente pode até praticar perfeitamente a
religião, mas estaremos longe de Deus. Urgentemente, precisamos mais de amor e
menos religiosidade sem amor. As duas realidades podem e deveriam caminhar
juntas: amor e religião, mas a situação na qual nos encontramos tem demonstrado
que tais realidades caminham cada vez mais separadas.
A prova disso é o que temos visto no Brasil e no mundo:
muita indiferença, preconceito, racismo, inúmeros tipos de violência,
marginalização social etc. A cultura do ódio cresce cada vez mais: ódio aos
pobres; aos gays, travestis, lésbicas e transexuais; ódio aos índios e negros;
ódio às pessoas que constituem o que Dom Helder Câmara chamava de “minorias
abraâmicas”.
Milhões
de brasileiros se declaram católicos e protestantes, mas a violência cresce
cada vez mais. Onde está a crença de tantos milhões de pessoas? Como estão
sendo evangelizadas? O que estão escutando da boca dos líderes religiosos? Nestes
dias, os católicos celebram o Tempo do Advento, tempo de espera e de preparação
para a celebração do mistério da encarnação de Jesus, o Filho de Deus. Como cada
um está preparando e celebrando estes dias? Que o Espírito de Jesus nos
converta, e nos ajude a sermos verdadeiramente amorosos. Fora do amor não
existe fé em Jesus nem salvação.
Tiago
de França
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