terça-feira, 14 de maio de 2019

O direito à educação e os cortes dos recursos educacionais

       Estamos no mês de maio, portanto, com o governo Bolsonaro desde o dia 1º de janeiro, e parece que a educação continua sendo negligenciada no Brasil. Aliás, mais que isso, agora assistimos a uma nova modalidade de trato com a educação pública: o governo federal, além de não valorizá-la como caminho para o verdadeiro progresso do País, resolveu cortar parte significativa dos recursos educacionais.

Não constitui novidade para ninguém a ideia de que sem educação não há povo que progrida. As nações consideradas desenvolvidas investiram e investem pesado na educação, pois sabem que não é possível educação de qualidade sem investimentos.

            Exemplo disso é o que ocorre na Alemanha, que nestes dias anunciou um investimento de 160 bilhões de euros para universidades e pesquisas. No Brasil, ao invés de aumentarem o dinheiro investido, anunciam cortes e mais cortes. Às vésperas dos protestos deste dia 15 de maio, o governo Bolsonaro já mandou seu recado desastroso: outros cortes acontecerão nos próximos dias.

Curiosamente, não se fala dos motivos que legitimam esses cortes. Fala-se de contingenciamento de gastos, bem como ousam afirmar que se gasta muito com educação no Brasil. Parece piada, mas é verdade: o governo Bolsonaro acha que no Brasil se gasta muito dinheiro com educação pública.

            O que está por trás desses cortes? Podemos, em primeiro lugar, lembrar o que o próprio presidente anda dizendo no seu twitter: que aos brasileiros basta saber ler, escrever, contar e ter um curso profissionalizante. Trata-se da fala de alguém que nunca pisou numa universidade. Quem desconhece o universo acadêmico não sabe dos custos da academia. Além de ignorar os custos, não manifesta nenhum interesse em saber, o que é o mais grave.

Também podemos afirmar, sem sombra de dúvidas, que o presidente não enxerga na educação a solução para os graves problemas do país. Ele não consegue conceber a educação como caminho para “o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (Constituição da República de 1988, artigo 205).

            O presidente passou quase 30 anos atuando no poder legislativo e não conhece a importância da educação. Mas o que mais causa indignação nas pessoas de bom senso e boa vontade é saber que milhões de brasileiros sabiam disso, e mesmo assim, o elegeram presidente da República. O presidente foi um candidato que não enganou a ninguém. Todos sabiam da sua ignorância em matéria de educação e conhecimentos básicos fundamentais.  

Todos sabiam da sua falta de atuação parlamentar em matéria de educação. Ele foi taxativo durante a campanha, ao dizer que praticamente não conhecia nada. Mas o povo acreditou nas fake news, e agora está vendo que para governar o País não basta somente a vontade de governar, é preciso ter capacidade, boa vontade política e compromisso com a justiça e a ética no trato com a coisa pública.

            Há um terceiro fator que não pode ser esquecido nesta breve análise da negligência do governo federal quanto à educação: há um nítido projeto de desconstrução das conquistas educacionais alcançadas durante os governos petistas.  

Apesar dos pesares, os governos petistas, de Lula e Dilma, foram os que mais investiram em educação pública: novas universidades e institutos federais criados, mais pessoas pobres ingressando na universidade, novos cursos sendo abertos, maior autonomia na gestão das universidades, mais investimento na pesquisa e extensão, enfim, mais oportunidades para que o brasileiro pudesse se libertar do jugo da ignorância e do fracasso. Os números do período destes governos atestam a veracidade do que estamos falando. Uma simples pesquisa no Google ajuda o leitor a enxergar melhor aquele período.

            A quem interessa a desvalorização da educação pública, bem como o sucateamento das escolas e universidades públicas? A resposta é simples: interessa aos grandes grupos das escolas e universidades privadas, que criaram um mercado gigantesco e promissor, transformação a educação em mera mercadoria.

A educação privada visa o lucro, não se interesse com o exercício da cidadania. Na iniciativa privada, estuda quem tem dinheiro, ou quem recebe uma bolsa de estudos, bolsa que faz a instituição privada de ensino receber abatimento no pagamento dos impostos. Não existe caridade, existe negócio.

A mesma lógica funciona quando a coisa pública é privatizada. Quem defende a privatização da universidade pública, na verdade está defendendo que se pague para estudar. Em um país de 13 milhões de desempregados, onde os brasileiros vão buscar dinheiro para custear escola e universidade particulares para suas crianças, adolescentes e jovens?

A educação é “direito de todos e dever do Estado e da família” (artigo 205 da CR/88). Portanto, o cidadão paga impostos e tem o direito à educação pública de qualidade. O Estado tem o dever, ou seja, a obrigação de ofertar educação pública de qualidade. É o que diz o mandamento constitucional, e tem que ser cumprido na forma da Lei.

São por estes e outros motivos que neste dia 15 de maio, em todos os cantos do País, muitos brasileiros vão às ruas para gritar contra esta grave injustiça que o governo está praticando contra o progresso do País e contra os brasileiros. É inaceitável os cortes de verba pública na educação, bem como o sucateamento que visa a privatização do ensino público no Brasil. Basta e injustiça! Viva a educação!

Tiago de França

quarta-feira, 1 de maio de 2019

Pensar em tempos de obscuridade


          Pensar livremente sempre foi o exercício fundamental dos espíritos evoluídos. A evolução da sociedade e do homem depende da difícil e desafiadora arte de pensar. O que seria da humanidade sem a ousadia de muita gente que se debruçou sobre os próprios pensamentos, provocando descobertas de toda ordem? O ser humano é ontologicamente vocacionado ao pensar, ou seja, não se realiza fora da atividade pensante. Quando entregue à preguiça mental e ao controle sistematizado da mente, o homem e a sociedade ficam como que paralisados, entregues ao arbítrio dos mais espertos.

            A filosofia, a sociologia, a história, a antropologia, a psicologia, a psicanálise e outras áreas congêneres, criadas pelo esforço permanente da inteligência humana, sempre foram abordagens incômodas, pois são contrárias aos interesses daqueles que lucram e se aproveitam da ingenuidade e cegueira da grande maioria das pessoas que não se ocupam com o pensar. A grande maioria dos humanos não se ocupa com o pensar, mas assimila os modelos e padrões estabelecidos pelas grandes corporações financeiras, que ganham muito dinheiro fabricando coisas e ideias que visam a dominação dos espíritos e dos corpos humanos.

            No mundo capitalista não há espaço para o espírito crítico. Não interessa ao mercado a multiplicação de pessoas que se dedicam ao aperfeiçoamento do pensar crítico. Este pensar desmascara os projetos de dominação. O mercado financeiro visa o lucro, e para que este seja alcançado é necessário a manipulação da consciência e o uso das forças de homens fracos. O homem fraco é aquele que não pensa sobre a vida e sobre o que acontece no mundo. É aquele que vive somente em função da satisfação de suas necessidades básicas. De fato, há milhões de pessoas que se contentam com o alimento, o vestir, o calçar, o comer e o lazer. O mercado financeiro precisa de mão de obra qualificada, e esta mão de obra é constituída por pessoas que são treinadas para somente produzir e consumir.

            Quando o governo federal diz que vai cortar os gastos com filosofia e sociologia nas universidades, o recado é claro: o governo quer colocar a educação pública a serviço dos interesses do mercado. De que tipo de gente o mercado precisa? De pessoas que aprendam a produzir com eficiência e qualidade, bem como de uma massa numerosa de consumidores inconsequentes. Consumir sem necessidade é uma espécie de consumo irresponsável. Quem não pensa a realidade do consumo é usado pelo mercado para a produção dos lucros das grandes empresas produtoras de descartáveis.

            Trazendo a reflexão para o âmbito das relações interpessoais, ocorre algo semelhante: vivemos numa situação profundamente marcada pelo esquecimento do outro. Este ganha notoriedade quando tem dinheiro ou influência, ou ambas as coisas. Há uma grande massa de seres humanos ao redor do mundo que se encontra na invisibilidade: massa de inúteis e sobrantes, de pessoas que nem produzem nem consomem. São sem importância e descartadas pelo sistema. Este é tão perverso que faz as pessoas entenderem que o que estamos descrevendo não passa de uma ideologia marxista barata.

            A expressão “isso é coisa de comunista” tem integrado a lábia barata e fajuta dos que vivem a serviço da promoção do sistema capitalista. Para tais pessoas, “bom é o capitalismo, que promove o progresso”. Tal afirmação parece acertada, mas não resiste a simples indagações: O capitalismo promove o progresso de quem? No Brasil dos 13 milhões de desempregados, quem está progredindo? No governo aliançado com as forças do grande mercado financeiro, quem está ganhando e quem está perdendo? Por acaso, estas questões são comunistas? Há muita gente poderosa se aproveitando do discurso anticorrupção e anticomunista. O Brasil é um país no qual a manipulação da consciência é de fácil execução.

            A sistematização do pensamento e da crítica é ferramenta essencial para a emancipação das pessoas; do contrário, estas continuarão consumindo as informações cuidadosamente elaboradas com a finalidade de enganar e camuflar a realidade. Sem a análise da realidade não é possível se libertar das mentiras bem contadas pelos que operam a dominação social. Os que oprimem dependem da cegueira da maioria. Sem gente cega não é possível explorar. O prazer dos poderosos deste mundo é ver as pessoas sendo exploradas; e a exploração é tão eficiente que a maioria dos explorados, uma vez conformados com a situação, até se sentem gratos por serem escravos.

            Vivemos tempos de obscuridade. Lamentavelmente, em pleno século XXI. Quando se diz que com a Internet e as redes sociais as pessoas estão mais atentas ao que está acontecendo, há um profundo engano. É verdade que a Internet continua sendo uma ferramenta importante para a busca de informações. Mas quem sabe pesquisar na Internet? Quem a utiliza para a realização permanente de pesquisas? Quem ensina às pessoas a filtrar as inúmeras informações fragmentadas? De modo geral, e as eleições gerais de 2018 demonstraram isso, os brasileiros não utilizam a Internet para pesquisas. A pesquisa não é o forte da cultura brasileira. A maioria está presente nas redes sociais, curtindo e compartilhando o que a própria rede vai ofertando, conforme o interesse dos grandes grupos que faturam muito dinheiro com a propaganda e o consumo de mentiras e mercadorias.

            A obscuridade está alicerçada na irracionalidade. Quem não pensa vive na obscuridade, ou seja, não conhece as causas dos acontecimentos da vida. A maioria tem acesso somente às versões predominantes dos acontecimentos. Os veículos de comunicação fazem seus recortes e oferecem suas versões. As pessoas simplesmente assimilam e formam a sua visão de mundo a partir disso. Assim, não há uma visão de mundo propriamente dita, pois não envolve o pensar por si mesmo. A assimilação e repetição irracional dos fatos não é uma atividade intelectualmente crítica. Sem análises não há pensamento crítico. Compreender o que está acontecendo no mundo é essencial para uma vida digna de seres humanos. Quem não enxerga a realidade é, geralmente, engolido por ela. Pensar é necessário para a evolução da humanidade. As pessoas hoje precisam compreender isto, para se libertarem das prisões que as oprimem.

Tiago de França