Pensar livremente sempre foi o
exercício fundamental dos espíritos evoluídos. A evolução da sociedade e do
homem depende da difícil e desafiadora arte de pensar. O que seria da
humanidade sem a ousadia de muita gente que se debruçou sobre os próprios
pensamentos, provocando descobertas de toda ordem? O ser humano é
ontologicamente vocacionado ao pensar, ou seja, não se realiza fora da
atividade pensante. Quando entregue à preguiça mental e ao controle
sistematizado da mente, o homem e a sociedade ficam como que paralisados,
entregues ao arbítrio dos mais espertos.
A filosofia, a sociologia, a história, a antropologia, a
psicologia, a psicanálise e outras áreas congêneres, criadas pelo esforço
permanente da inteligência humana, sempre foram abordagens incômodas, pois são
contrárias aos interesses daqueles que lucram e se aproveitam da ingenuidade e
cegueira da grande maioria das pessoas que não se ocupam com o pensar. A grande
maioria dos humanos não se ocupa com o pensar, mas assimila os modelos e padrões
estabelecidos pelas grandes corporações financeiras, que ganham muito dinheiro
fabricando coisas e ideias que visam a dominação dos espíritos e dos corpos
humanos.
No mundo capitalista não há espaço para o espírito
crítico. Não interessa ao mercado a multiplicação de pessoas que se dedicam ao
aperfeiçoamento do pensar crítico. Este pensar desmascara os projetos de
dominação. O mercado financeiro visa o lucro, e para que este seja alcançado é
necessário a manipulação da consciência e o uso das forças de homens fracos. O homem
fraco é aquele que não pensa sobre a vida e sobre o que acontece no mundo. É
aquele que vive somente em função da satisfação de suas necessidades básicas. De
fato, há milhões de pessoas que se contentam com o alimento, o vestir, o
calçar, o comer e o lazer. O mercado financeiro precisa de mão de obra
qualificada, e esta mão de obra é constituída por pessoas que são treinadas
para somente produzir e consumir.
Quando o governo federal diz que vai cortar os gastos com
filosofia e sociologia nas universidades, o recado é claro: o governo quer colocar
a educação pública a serviço dos interesses do mercado. De que tipo de gente o
mercado precisa? De pessoas que aprendam a produzir com eficiência e qualidade,
bem como de uma massa numerosa de consumidores inconsequentes. Consumir sem
necessidade é uma espécie de consumo irresponsável. Quem não pensa a realidade
do consumo é usado pelo mercado para a produção dos lucros das grandes empresas
produtoras de descartáveis.
Trazendo a reflexão para o âmbito das relações
interpessoais, ocorre algo semelhante: vivemos numa situação profundamente
marcada pelo esquecimento do outro. Este ganha notoriedade quando tem dinheiro
ou influência, ou ambas as coisas. Há uma grande massa de seres humanos ao
redor do mundo que se encontra na invisibilidade: massa de inúteis e sobrantes,
de pessoas que nem produzem nem consomem. São sem importância e descartadas
pelo sistema. Este é tão perverso que faz as pessoas entenderem que o que
estamos descrevendo não passa de uma ideologia marxista barata.
A expressão “isso é coisa de comunista” tem integrado a
lábia barata e fajuta dos que vivem a serviço da promoção do sistema
capitalista. Para tais pessoas, “bom é o capitalismo, que promove o progresso”.
Tal afirmação parece acertada, mas não resiste a simples indagações: O
capitalismo promove o progresso de quem? No Brasil dos 13 milhões de
desempregados, quem está progredindo? No governo aliançado com as forças do
grande mercado financeiro, quem está ganhando e quem está perdendo? Por acaso,
estas questões são comunistas? Há muita gente poderosa se aproveitando do
discurso anticorrupção e anticomunista. O Brasil é um país no qual a
manipulação da consciência é de fácil execução.
A sistematização do pensamento e da crítica é ferramenta
essencial para a emancipação das pessoas; do contrário, estas continuarão
consumindo as informações cuidadosamente elaboradas com a finalidade de enganar
e camuflar a realidade. Sem a análise da realidade não é possível se libertar
das mentiras bem contadas pelos que operam a dominação social. Os que oprimem
dependem da cegueira da maioria. Sem gente cega não é possível explorar. O prazer
dos poderosos deste mundo é ver as pessoas sendo exploradas; e a exploração é
tão eficiente que a maioria dos explorados, uma vez conformados com a situação,
até se sentem gratos por serem escravos.
Vivemos tempos de obscuridade. Lamentavelmente, em pleno
século XXI. Quando se diz que com a Internet e as redes sociais as pessoas
estão mais atentas ao que está acontecendo, há um profundo engano. É verdade
que a Internet continua sendo uma ferramenta importante para a busca de informações.
Mas quem sabe pesquisar na Internet? Quem a utiliza para a realização
permanente de pesquisas? Quem ensina às pessoas a filtrar as inúmeras
informações fragmentadas? De modo geral, e as eleições gerais de 2018 demonstraram
isso, os brasileiros não utilizam a Internet para pesquisas. A pesquisa não é o
forte da cultura brasileira. A maioria está presente nas redes sociais,
curtindo e compartilhando o que a própria rede vai ofertando, conforme o
interesse dos grandes grupos que faturam muito dinheiro com a propaganda e o
consumo de mentiras e mercadorias.
A obscuridade está alicerçada na irracionalidade. Quem não
pensa vive na obscuridade, ou seja, não conhece as causas dos acontecimentos da
vida. A maioria tem acesso somente às versões predominantes dos acontecimentos.
Os veículos de comunicação fazem seus recortes e oferecem suas versões. As pessoas
simplesmente assimilam e formam a sua visão de mundo a partir disso. Assim, não
há uma visão de mundo propriamente dita, pois não envolve o pensar por si
mesmo. A assimilação e repetição irracional dos fatos não é uma atividade
intelectualmente crítica. Sem análises não há pensamento crítico. Compreender o
que está acontecendo no mundo é essencial para uma vida digna de seres humanos.
Quem não enxerga a realidade é, geralmente, engolido por ela. Pensar é
necessário para a evolução da humanidade. As pessoas hoje precisam compreender
isto, para se libertarem das prisões que as oprimem.
Tiago de França
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