Neste domingo, a Igreja
católica celebra o dia de São Pedro e São Paulo: dois grandes missionários que
marcaram a história primitiva da Igreja. O testemunho deles, retratado no Novo
Testamento, é admirável. Muito pode ser dito sobre cada um, mas aqui queremos
realçar três características que falam do significado do que denominamos
discípulo missionário de Jesus. Eles são modelos de discípulos missionários, e
a Igreja precisa de mulheres e homens que sejam como eles: despojados e
ousados, doados e fieis até o fim.
Pedro fez parte do
grupo dos Doze, por isso, foi chamado pelo próprio Cristo para segui-lo.
Parecia ser de personalidade forte. Se posicionava com firmeza e ousadia. Era
um homem apaixonado por Jesus. Tinha um grande desejo de segui-lo até o fim e,
se fosse possível, estava disposto até em pegar em armas para demonstrar a sua
coragem. Quando foram prender Jesus, ele cortou uma das orelhas de um dos
soldados. Pedro aparece como uma espécie de coordenador dos Doze. Assim
falamos, porque ele não substituiu Jesus nem o sucedeu. Só Jesus é o Mestre e
Senhor, e não Pedro.
A primeira característica que podemos evidenciar em Pedro
é a sua ousadia. Para o exercício da
atividade apostólica é necessária a ousadia. Esta faz o apóstolo se livrar da
falsa prudência e do medo. Para ir às águas mais profundas é preciso ter
coragem. Aliás, mais que coragem; é preciso ser ousado. Por óbvio que estamos
falando de uma ousadia que empurra o missionário para a frente, impulsionando-o
a abraçar o novo sem medo. Sem ousadia, o discípulo missionário é incapaz de
abraçar o novo que o Espírito faz brotar.
Outra característica forte da personalidade petrina é a
sua paixão por Jesus. Quando lemos
os textos evangélicos percebemos, claramente, a paixão de Pedro por Jesus. Ele
certamente sabia das suas limitações e fraquezas. Mas mesmo assim, fazia
questão de demonstrar a sua proximidade, a sua identificação, o seu desejo de
amá-lo mais que os demais. Ele queria que Jesus soubesse do seu amor. Esta relação
apaixonada com o Mestre o fez trilhar o caminho que o conduziu à coroa do
martírio. Sem esta relação apaixonada por Jesus não é possível se manter de pé
em seu caminho. Um homem apaixonado é capaz de tudo.
Também a fé é
uma qualidade admirável em Pedro. Mas a fé petrina não exclui nem esconde a
fragilidade humana. Pedro negou Jesus três vezes, e o negou publicamente. A
experiência da negação não eliminou a sua fé. Trata-se de um ensinamento claro:
o fato de o discípulo missionário ter fé, não significa que seja perfeito e
imune à possibilidade de pecar. Em Pedro, a fé pressupõe o reconhecimento da
fragilidade e uma profunda disposição para, consciente da condição de pecador,
se colocar no caminho de Jesus. Pedro é a prova de que Jesus não escolheu
santos, mas pecadores chamados à santidade. A consciência do pecado fortalece a
fé em Jesus, e isto é essencial para ser discípulo missionário de Jesus.
Na Igreja católica, os sucessores dos apóstolos são os
bispos; e o bispo de Roma é aquele que exerce a função petrina: responsável
pela promoção da unidade da Igreja e chamado a confirmar os irmãos na fé. O
Papa Francisco, bispo de Roma, tem a plena consciência desta sua missão e,
graças à misericórdia divina, a tem exercido com grande solicitude e caridade
pastoral. Francisco é a expressão petrina na Igreja católica de nossos dias: é
um homem ousado, apaixonado por Jesus e de profunda fé.
Com Pedro, encontramos Paulo, outro grande apóstolo da
Igreja primitiva. Judeu letrado, não integrou o grupo dos Doze apóstolos. Fez a
experiência do encontro com o Cristo ressuscitado, que o chamou à missão
apostólica. Era um grande perseguidor dos cristãos, pois era um fariseu –
cumpridor fiel da Lei. Converteu-se em discípulo missionário de Jesus,
anunciando a Boa Notícia do Reino, fundando e orientando comunidades, e
escrevendo cartas que são a tradução fiel do Evangelho de Jesus.
Também reconhecemos em Paulo inúmeras qualidades que
devem estar presentes na vida de todo cristão. A primeira é a disposição para o anúncio do Evangelho.
Paulo era um homem incansável. Graças a ele, o Evangelho chegou a povos não
judeus. Nada o impedia de anunciar Cristo às pessoas. Combateu o bom combate e
guardou a fé. Enfrentou o frio, a fome, a perseguição, a prisão, os açoites, a
incompreensão, a rejeição e as ameaças de morte. Nada tirava a sua disposição.
O Espírito o conduzia, porque se deixava conduzir. Confiou em Deus e foi fiel
até a morte.
Paulo, homem das letras, estudou as culturas dos povos,
especialmente a cultura dos principais centros urbanos de sua época. Por isso,
é também louvável a sua capacidade de inculturação.
Utilizando-se da linguagem, dos símbolos e das imagens do imaginário cultural
presente nas culturas de sua época, Paulo traduziu a mensagem de Jesus, e esta
mensagem foi se espalhando em todo o mundo conhecido.
Neste
sentido, Paulo ensina que o discípulo missionário de Jesus é alguém que deve
buscar conhecer o contexto cultural, social, econômico e religioso que marca a
vida dos povos. A inculturação do Evangelho é fato importante no processo de
evangelização. Com Paulo, aprendemos a respeitar as culturas das pessoas, e a
identificar nelas os sinais da presença do Reino de Deus. Ele nos ensina que
Deus já está presente na vida dos povos. O que o discípulo missionário faz é
ajudar as pessoas a enxergar esta presença amorosa, que se revelou em Jesus, o
Cristo.
Por
fim, não se pode deixar de reconhecer a fidelidade
de Paulo a Jesus, o Cristo, em quem confiou, e amou até o derramamento de sangue.
Não é fácil ser fiel a Jesus. Esta fidelidade não exclui as quedas e as
desilusões. A fidelidade a Jesus passa pelo caminho estreito e pedregoso,
marcado pelo sofrimento. Não se trata de sofrimento pelo sofrimento: isto é
masoquismo. Estamos falando do sofrimento como consequência da opção por Jesus:
o sofrimento da cruz de Cristo; sofrimento presente no caminho de Jesus. Esta
fidelidade à cruz conduz à participação na glória do Ressuscitado. Para receber
a coroa da glória é preciso experimentar o peso da cruz, e nesta está Jesus
vencedor da morte.
Eis o
grande ensinamento que o testemunho paulino nos oferta: disponibilidade para
partir em missão, capacidade para anunciar Jesus e fidelidade até as últimas
consequências. Este foi o caminho trilhado por Paulo, e que precisa ser
trilhado por todos os batizados, porque na Igreja todo batizado precisa assumir
a dimensão do envio para a missão. Não basta ser batizado, mas é preciso ser
batizado, enviado e, de fato, partir.
Quem
não sai de si para ir aos outros não está disponível e, assim, não anuncia
Jesus nem experimenta a fidelidade a Ele. Quem quiser ser fiel a Jesus precisa
partir em missão, pois a fidelidade é uma experiência do cotidiano, conhecida
por aqueles que colocaram as mãos no arado e já não olham mais para trás.
Tiago
de França