Há
quem defenda a tese de que não há nenhuma ligação entre a fé cristã e a
política. Nestas breves linhas, queremos demonstrar o oposto desta tese. Mas
antes, precisamos afirmar que Jesus não foi um político profissional, pois Deus
não o enviou para governar este mundo, nos moldes humanos de governabilidade.
A mensagem
de Jesus tem uma dimensão essencialmente política. Mas de que tipo de política
estamos falando? Os antigos gregos diziam que a política era a arte de
governar, arte de exercer o poder. Todas as sociedades são marcadas pela
política, porque em todas encontrarmos formas diversas do exercício do poder.
Nós, humanos, criamos formas de organização social, e em todas elas temos
política.
Jesus
viveu e pregou a fraternidade: a arte de viver como irmãos. Ao falar do poder
dos que governam, diante da sede de poder dos seus discípulos, que discutiam
entre si para saber quem era o maior, Jesus estabeleceu que aquele que quiser
ser o maior, que seja o servidor de todos (cf. Mc 10, 32-45). Portanto, segundo
a lógica da mensagem de Jesus, aquele que quiser exercer o poder, deve
exercê-lo servindo ao próximo.
Desse
modo, podemos afirmar que a política, numa ótica evangélica, é poder que se
exerce por meio do serviço aos outros. Quem não quer servir, também não deve
exercer o poder; porque o poder que não se manifesta no serviço se transforma
em um poder opressor. Tanto do ponto de vista da mensagem de Jesus quanto do
ponto de vista da teoria do Estado Democrático de Direito, nesta matéria, o
sentido é único: Para ser legítimo, o poder tem que se expressar no serviço à
promoção da dignidade da pessoa humana.
Partindo
deste pressuposto, indaga-se: O que está acontecendo hoje no Brasil? Nas
eleições gerais de 2018, os brasileiros elegeram governadores, deputados,
senadores e o presidente da República. Inúmeros candidatos usaram e abusaram do
nome de Deus para serem eleitos. Muitos se apresentaram como enviados de Deus
para salvar a nação, inclusive o presidente eleito e empossado. Milhões de
católicos e protestantes votaram em Jair Bolsonaro, afirmando ser este um enviado
de Deus, uma espécie de Messias, para salvar o País da "corrupção do
PT", como se a corrupção fosse um fenômeno manifestado somente no Partido
dos Trabalhadores! Até hoje há quem creia nisso!
Durante
a campanha e nos dias da eleição e posse, o nome de Deus foi invocado, com
lágrimas caindo dos olhos. Nunca na história das eleições brasileiras se viu
algo parecido. Para quem ler a Bíblia e sabe interpretá-la, o excesso de
piedade na manifestação externa de uma suposta fé, é algo que gera
desconfiança. Em matéria religiosa, a falsidade costuma se manifestar nos
excessos de piedade. Geralmente, quem muito invoca o nome de Deus, numa espécie
de violação do segundo mandamento da Lei de Deus, são os mais perigosos que
gostam de se aproveitar da religião e da ingenuidade de muitos religiosos, para
alcançar seus objetivos pessoais e grupais.
Nestes
dias, causou revolta em muitas pessoas a falta de respeito por parte do
presidente da República em relação à memória do pai do presidente da Ordem dos
Advogados do Brasil, desaparecido durante a ditadura militar. Os mortos não
podem se defender. Por isso, a sua memória precisa ser respeitada. Quem afirma
ser cristão não pode desrespeitar ninguém, principalmente os mortos. O
desrespeito é uma das marcas de uma sociedade dominada pela banalidade do mal.
Quando o mal é banalizado, a maldade se transforma em algo natural, coisa
comum.
Desrespeitar
a memória dos que morreram, seja quem for, é uma espécie de crueldade, e esta é
frontalmente oposta ao Evangelho de Jesus Cristo. Não existe cristão cruel. Ou
a pessoa segue Jesus, ou se entrega à crueldade. Jesus Cristo foi vítima da
crueldade dos homens, e abominou comportamentos crueis, que provocam sofrimento
nos outros. A pessoa cruel que pronuncia o nome de Jesus, invocando-o, está
faltando, gravemente, com a fé que imagina ter. Quem segue Jesus é chamado a
abraçar a bondade, porque Deus é Bom e cheio de ternura.
Por
fim, é necessário dizer, categoricamente: são mentirosos e, portanto, falsos,
os políticos que se dedicam a praticar o mal, e aparecem em atos religiosos,
afirmando-se cristãos. São falsos, mentirosos e hipócritas. Os políticos que
trabalham contra o bem comum, aprovando e executando projetos e leis que violam
os direitos fundamentais e suas garantias; que abrem as fronteiras do País para
que entrem os exploradores que somente desejam sugar as nossas riquezas; que
incrementam medidas para fortalecer o poder dos fortes sobre os fracos; que não
se preocupam com o rio de sangue que é derramado diuturnamente por causa da
violência; que trabalham para aumentar e manter os seus privilégios em
detrimento dos direitos básicos dos cidadãos; estes políticos são inimigos do
povo e inimigos de Deus. Jamais podem ser chamados de cristãos.
Portanto,
é imprescindível que fiquemos atentos com o que vai acontecer em 2020, ano em
que serão eleitos vereadores e prefeitos. Não é possível que se repita o que
ocorreu com a eleição dos deputados e senadores, governadores e presidente. A
maioria destes não possui compromisso com o bem comum. São falsos cristãos. Se
utilizam do discurso da defesa dos valores éticos, morais e cristãos para
enganar as pessoas, para promover seus próprios interesses, e para esconder a
imoralidade de suas condutas. São lobos revestidos de pele de cordeiro. São
mercenários, que só pensam em ganhar dinheiro a todo custo.
Fé
cristã e política podem andar juntas. Não há contradição entre ambas. A fé
cristã é incompatível com a politicagem, e esta é a prática comum nesta sofrida
república brasileira. Não sejamos politiqueiros, deixando-nos enganar pelos
falsos políticos e falsos cristãos. Essa gente merece o nosso repúdio, não o nosso
apoio. Nem tudo está perdido. A esperança permanece viva. De uma coisa estamos
certos: Os poderosos cairão de seus tronos, e a sua ruína será completa.
Ninguém prospera eternamente, praticando o mal. As pessoas más possuem em si
mesmas o germe da sua própria destruição. É tudo uma questão de tempo. Resistir
é preciso.
Tiago de França